A discussão sobre o futuro do dólar voltou ao centro do debate global em 2025 e deve seguir como um dos temas estruturais de 2026. Em entrevista à BM&C News, o professor de Relações Internacionais, Marcus Vinicius de Freitas afirmou que já existe um movimento claro ainda que gradual, de desdolarização da economia global, impulsionado principalmente pela China e por países emergentes.
Segundo o professor, o desempenho do ouro como ativo de proteção em 2025 não foi um fenômeno isolado, mas parte de um reposicionamento estratégico de diversos países diante do cenário geopolítico, da política monetária americana e do uso do dólar como instrumento de poder internacional.
“Existe, sim, um movimento global de desdolarização. Isso é uma realidade paulatina”, afirmou.
Qual seria a alternativa ao dólar?
Marcus Vinicius destacou que a China tem papel central nesse processo. Até alguns anos atrás, o país era o maior detentor de títulos do Tesouro americano, mas vem reduzindo gradualmente essa exposição, ao mesmo tempo em que amplia suas reservas em ouro.
“A China tem paulatinamente se livrado das letras do Tesouro norte-americano e dos dólares”, explicou.
O movimento, segundo ele, não é apenas financeiro, mas estratégico. Pequim busca fortalecer o uso do yuan (renminbi) no comércio internacional, incentivando parceiros a adotarem moedas locais ou a própria moeda chinesa nas transações comerciais.
Dólar enfraquecido? Ouro como âncora de confiança
Um dos pontos centrais levantados pelo professor é a tentativa chinesa de ancorar a credibilidade do yuan no ouro, resgatando um conceito clássico do sistema monetário.
“Os chineses acreditam que o dólar passou a ser uma moeda baseada em fé”, afirmou, ao mencionar a percepção de enfraquecimento da confiança na moeda americana.
Segundo Marcus Vinicius, a China tem adotado duas estratégias complementares: a ampliação da produção doméstica, após a descoberta de uma grande mina de ouro em seu território, e a intensificação das compras internacionais do metal.
O objetivo seria reforçar a confiança no yuan em um contexto em que investidores ainda veem a economia chinesa como excessivamente controlada pelo Estado.
Desdolarização será lenta, mas estrutural
Apesar da mudança de direção, o professor pondera que a transição não será abrupta. O dólar ainda domina o comércio internacional, as reservas globais e os mercados financeiros.
“A desdolarização não será imediata. O mundo ainda utiliza o dólar, e a China ainda tem muitos recursos denominados na moeda americana.”
Ainda assim, ele observa que o processo tende a avançar de forma consistente, especialmente à medida que a China consolida sua posição como principal potência comercial do mundo, sendo hoje parceira número um de mais de 140 países.
Impacto geopolítico e uso do dólar como arma
Outro fator que acelera o debate sobre alternativas ao dólar, segundo Marcus Vinicius, é o uso da moeda americana como ferramenta geopolítica pelos Estados Unidos, por meio de sanções financeiras e restrições comerciais.
“Os Estados Unidos têm utilizado o dólar como uma arma muito importante nas suas relações geopolíticas”, disse.
Esse contexto, aliado ao aumento de tarifas e à dificuldade de acesso ao mercado americano, torna mais complexo para países emergentes obter dólares via exportações, investimentos ou crédito, o que reforça o interesse por alternativas.
O que isso significa para 2026
Na avaliação do professor, o movimento de aumento das reservas em ouro e redução relativa da exposição ao dólar deve continuar em 2026, especialmente em um cenário de ruídos geopolíticos persistentes, fragmentação do comércio global e maior disputa por influência econômica.
Para investidores, o debate vai além do curto prazo e aponta para uma reconfiguração gradual do sistema monetário internacional, com impactos relevantes sobre moedas, commodities e estratégias de proteção patrimonial.

