O cenário de política monetária no Brasil segue marcado pela expectativa de manutenção da taxa de juros em 15% por um período prolongado. De acordo com o economista VanDyck Silveira, entrevistado pela BM&C News, a comunicação do Banco Central deve reforçar o discurso de higher for longer, ou seja, juros altos por mais tempo, diante dos riscos fiscais e externos que pressionam a economia.
“A valorização recente do real foi resultado de fatores externos, como a política de Donald Trump e a alta de algumas commodities, e não de decisões internas“, apontou o economista. Essa condição, classificada por Silveira como “um sonho de uma noite de verão”, não deve se sustentar, projetando-se uma taxa de câmbio próxima de R$ 5,55 a R$ 5,60 nos próximos meses. Esse movimento tende a gerar novo aperto inflacionário.
Quais fatores sustentam juros elevados?
A avaliação é de que a combinação entre desequilíbrio fiscal, demanda aquecida por transferências de renda e pressões cambiais cria um ambiente incompatível com cortes no curto prazo. Além disso, a perspectiva de convergência da inflação para a meta só em 2027 reforça a necessidade de postura firme da autoridade monetária.
“O Banco Central brasileiro tem sido excessivamente gradualista, preferindo ajustes pequenos e previsíveis“, analisou. Ele defende que choques mais duros, como uma elevação abrupta da taxa de 11% para 14% no passado, teriam ajudado a alinhar expectativas mais rapidamente e reduzido a persistência inflacionária.
Impactos externos e commodities
Apesar da desaceleração das exportações brasileiras, a alta nos preços de café, soja e carne bovina ajudou a balança comercial e atraiu dólares ao país. “O Brasil não controla esses movimentos globais e, portanto, não pode contar com eles de forma estrutural“, afirmou Silveira.
Nesse sentido, a volatilidade internacional somada às incertezas da política comercial americana podem acelerar a pressão cambial sobre o real. Com isso, o repasse inflacionário tende a ser inevitável, exigindo ainda mais cautela do Banco Central na condução dos juros.
O que falta para o Brasil criar espaço para cortes de juros?
Para que haja condições de redução da Selic, Silveira aponta dois caminhos principais:
- Corte de gastos públicos: considerado essencial para aliviar pressões fiscais e reduzir expectativas inflacionárias;
- Estímulo ao investimento privado: fundamental para expandir a capacidade produtiva e criar espaço para crescimento sem inflação.
Enquanto essas medidas não forem implementadas, o consumo continuará sustentado artificialmente por transferências, ampliando o risco de estagflação, cenário em que inflação e atividade fraca coexistem.
Estagflação é um risco real?
“O risco de estagflação já aparece no radar. Indicadores como o IBC-Br e a trajetória da inflação sinalizam que o país pode entrar em um ciclo de baixo crescimento combinado com preços em alta“, analisa o economista. Isso torna a política monetária restritiva não apenas necessária, mas inevitável no curto prazo.
Para Silveira, o Banco Central atua como “o adulto na sala”, mantendo juros em patamar elevado mesmo diante da pressão política por cortes. A projeção é de que apenas em 2026 se abra espaço real para flexibilização, caso o governo avance em ajustes estruturais.
O debate sobre os juros no Brasil mostra um dilema clássico entre crescimento e estabilidade. A mensagem central de VanDyck Silveira é clara: sem responsabilidade fiscal e sem estímulo ao capital privado, não haverá condições de reduzir a Selic de forma sustentável.
Até lá, o mercado deve conviver com juros elevados, inflação pressionada por fatores internos e externos e risco crescente de estagnação econômica. A política monetária segue, portanto, no centro das atenções e como principal instrumento de contenção dos desequilíbrios.