A Operação Carbono Oculto, considerada a maior ofensiva já realizada contra o crime organizado no Brasil, revelou um esquema bilionário envolvendo postos de combustíveis, transportadoras, distribuidoras e até mesmo fundos de investimento e fintechs atuando como bancos paralelos. Estima-se que o grupo movimentou cerca de R$ 30 bilhões, blindando recursos ilícitos dentro do mercado financeiro.
Em entrevista ao BM&C Strike, o advogado criminalista e especialista em Direito Penal Econômico, Raphael Blaselbauer, destacou que a operação não apenas atingiu o Primeiro Comando da Capital (PCC), mas também escancarou as fragilidades da fiscalização estatal e os riscos sistêmicos da ausência de regulação adequada em setores financeiros emergentes. Segundo ele, a facção já opera como uma verdadeira corporação transnacional.
Operação Carbono Oculto identificou como o PCC estruturou esquema
Blaselbauer explicou que, ao longo dos anos, o PCC deixou de atuar apenas no comércio de drogas e passou a investir em mecanismos complexos de lavagem de dinheiro. Postos de gasolina, devido ao grande fluxo de caixa e à facilidade de mesclar receitas lícitas e ilícitas, foram apontados como porta de entrada para a movimentação irregular.
Com o tempo, a facção expandiu para fintechs e fundos de investimento, aproveitando-se de lacunas regulatórias. “As fintechs cresceram muito rapidamente desde 2018 e 2019, sem maturação suficiente para que o Banco Central conseguisse regulá-las de forma eficiente”, destacou o advogado.
O que falhou na regulação do sistema financeiro?
De acordo com Blaselbauer, a principal fragilidade esteve na demora do Estado em acompanhar a evolução do mercado digital. Apenas após a operação, a Receita Federal publicou uma instrução normativa equiparando as fintechs às instituições bancárias em termos de fiscalização.
Para ele, a ausência de compliance adequado e a facilidade de abertura de contas digitais criaram um ambiente fértil para que recursos ilícitos fossem pulverizados. “As fintechs precisam adotar códigos de conduta mais rígidos, assim como fundos e gestoras, reforçando o know your client para mitigar riscos”, afirmou.
A política pode atrapalhar a Operação Carbono Oculto?
O especialista também alertou para o risco de que disputas políticas atrapalhem a continuidade das investigações, como ocorreu na Operação Lava Jato. Ele defendeu a independência das instituições, como Ministério Público e Polícia Federal, para evitar o esvaziamento dos processos.
Segundo Blaselbauer, operações dessa magnitude sempre atraem interesses políticos, mas é essencial blindar as investigações de pressões externas. “O Estado falhou sistemicamente, e só uma falha ao longo de anos permite um avanço tão grande do crime organizado”, declarou.
O crime organizado está em outros setores da economia?
O advogado afirmou que a infiltração criminosa vai além do setor de combustíveis e do mercado financeiro, atingindo também a política e a economia real. Ele citou o financiamento de campanhas eleitorais com dinheiro ilícito e a presença de integrantes do crime organizado em prefeituras e no sistema jurídico como exemplos do nível de capilaridade alcançado pelo PCC.
- Combustíveis: postos e distribuidoras usados para mesclar fluxos de caixa;
- Mercado financeiro: fundos de investimento com cotistas únicos e fintechs pouco reguladas;
- Política: financiamento de campanhas e infiltração em cargos eletivos.
É possível frear o avanço do PCC?
Para Blaselbauer, a operação representa um divisor de águas, mas não será suficiente para derrotar o crime organizado. “Ela reduz a velocidade, mas o Estado não tem instrumental para eliminar a facção, que já opera como uma multinacional do crime”, afirmou.
O advogado defendeu investimentos em tecnologia, cooperação internacional e maior estrutura para órgãos de fiscalização. Ele destacou ainda a necessidade de estrangular financeiramente as facções, atacando seus mecanismos de lavagem de dinheiro.
Mesmo diante do pessimismo sobre a capacidade estatal, Blaselbauer acredita que a Operação Carbono Oculto tem importância simbólica e prática: “É uma luz no fim do túnel e mostra ao mundo que o Brasil ainda possui instituições que tentam, apesar das falhas, enfrentar o crime organizado”.
















