A presidente em exercício da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), Agnes da Costa, afirmou que a agência tem atuado com intenso monitoramento técnico e regulatório para lidar com os desafios recentes no setor elétrico, incluindo o aumento da geração de energia em horários de baixa demanda, os cortes em usinas e os impactos crescentes da geração distribuída (GD), especialmente solar.
Em entrevista, Agnes destacou que o fenômeno do excesso de oferta de energia, que tem levado a cortes por parte do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), exige decisões alocativas complexas. “A decisão da Aneel é sempre muito alocativa. É preciso avaliar quem precificou o risco, quem não precificou e se é justo repassar esse custo ao consumidor”, disse.
Segundo ela, é ilusório imaginar que, ao tirar receita do gerador, não haverá impacto ao consumidor. “Alguém vai pagar essa conta. Por isso, a decisão precisa ser tomada com muita responsabilidade.”
Geração distribuída na mira da Aneel
Apesar de a consulta pública aberta pela Aneel ter sido inicialmente focada apenas na geração centralizada, Agnes reconheceu que a geração distribuída também contribui para o excesso de oferta, especialmente em determinadas horas do dia. Esse reconhecimento foi incluído no voto de abertura da agência reguladora.
“O setor evoluiu e o marco legal da geração distribuída também. Agora é preciso analisar se e como a GD pode ser incluída dentro das ações regulatórias”, afirmou.
Ela também ressaltou a necessidade de diferenciar os tipos de GD existentes: “Tem a GD no telhado, residencial, e tem a GD remota, que é quase uma centralização. A lei garante direitos a esses consumidores-geradores, e qualquer tratamento diferenciado exige uma análise jurídica profunda.”
Aneel: riscos operacionais e lições de 2023
Questionada sobre o risco de apagões similares ao registrado na Espanha ou ao evento ocorrido no Nordeste do Brasil em agosto de 2023, Agnes afirmou que o trabalho do ONS é justamente evitar esses colapsos por meio do controle de frequência e tensão no sistema.
“O evento de 2023 serviu como grande aprendizado. Naquele momento, ficou claro que as informações técnicas dos parques geradores estavam desatualizadas, o que dificultava prever como eles reagiriam a oscilações na rede”, explicou.
Desde então, o ONS passou a exigir dados mais atualizados e detalhados dos empreendimentos, permitindo uma operação mais segura. “Hoje, o sistema é robusto e operado com confiabilidade, mas com base em uma realidade nova, que exige adaptações constantes”, afirmou.
Relatório em elaboração e próximos passos da Aneel
Sobre o relatório da Aneel envolvendo a geração distribuída, Agnes afirmou que ainda não há uma previsão exata de publicação. Os dados estão sendo produzidos por diferentes instituições, incluindo o próprio ONS, e a conclusão dependerá de uma análise mais abrangente.
“Temos que olhar para o problema de forma integrada, avaliando os aspectos técnicos, jurídicos e regulatórios. É sobre isso que estamos refletindo neste momento”, disse.
Ela também confirmou que há estudos em andamento sobre o impacto da GD na operação do sistema, e que os dados serão essenciais para que a Aneel defina medidas futuras com base em evidências técnicas.
Ao final da entrevista, Agnes reforçou que o setor elétrico brasileiro é reconhecidamente robusto, mas que a rapidez na transição energética exige prudência nas decisões regulatórias. “O operador prefere cortar a oferta antes de arriscar a estabilidade do sistema. Isso não é sinal de fraqueza, é sinal de compromisso com a confiabilidade.”