A democracia brasileira enfrenta um momento de intensa instabilidade institucional. Essa é a avaliação do cientista político e presidente do Livres, Magno Karl, durante entrevista ao programa BM&C Talks. Ele apontou que o Supremo Tribunal Federal (STF) ultrapassou os limites tradicionais de atuação, assumindo um papel político cada vez mais dominante, diante da fragilidade do Executivo e da incapacidade do Legislativo de resolver seus próprios impasses.
“Quando o Judiciário decide exercer o poder de forma política, organizando o debate público e definindo os rumos das políticas nacionais, temos um desequilíbrio grave entre os três poderes“, alertou Karl. Para ele, esse avanço do STF é consequência da ausência de mecanismos efetivos de controle sobre o Judiciário, um poder que, diferentemente dos demais, não se submete ao escrutínio popular.
O cientista político também comentou a atuação do ministro Alexandre de Moraes no caso do ex-presidente Jair Bolsonaro. Segundo Karl, medidas como a restrição da liberdade de expressão a um réu ainda não condenado representam uma ameaça à ordem democrática. “A suspensão da liberdade de expressão de alguém que sequer foi condenado é algo muito sério, mas no Brasil virou tema politizado, e isso dificulta qualquer reflexão institucional honesta“, afirmou.
Crise institucional e a fragilidade do liberalismo
Magno Karl acredita que, apesar da fragilidade do governo Lula, a oposição está desorganizada e pouco focada em articulação política. Segundo ele, há um vácuo institucional entre as preferências populares por ideias liberais e a capacidade dos partidos de transformá-las em votos.
“Temos uma população que se mostra cada vez mais receptiva a valores como o empreendedorismo e a liberdade individual, mas não há estruturas partidárias sólidas para canalizar isso politicamente“, explicou.
Na visão de Karl, a renovação institucional passa pela periferia, não pelos bairros nobres. Ele afirma que os entregadores, trabalhadores informais e jovens das classes mais baixas têm um entendimento prático sobre esforço individual e desconfiança do Estado, mas essa energia ainda não encontra tradução eleitoral.
A respeito das divisões internas do campo liberal, Karl vê um problema estrutural. “A tradição liberal no Brasil é muito intelectualizada. Falta vivência institucional dentro da política, capacidade de compor e de ceder. Isso nos enfraquece“, comentou.
Segundo ele, partidos como o Novo enfrentam o dilema entre manter a identidade ideológica ou buscar sobrevivência dentro das regras institucionais, como a cláusula de desempenho. “Quem precisa de voto tem que ampliar o discurso e se comunicar com mais eleitores. A lógica institucional não permite margem para purismos.”
Crise institucional também é global
O cientista político destacou que a crise institucional que atinge o liberalismo no Brasil não é isolada. Em países como Alemanha, Reino Unido e França, partidos liberais têm perdido espaço, sendo absorvidos por coalizões maiores, tanto à esquerda quanto à direita, ou simplesmente desaparecendo do cenário legislativo.
“A configuração institucional internacional é desfavorável. Liberais, por serem minoria, vivem à reboque de outras forças. E quando essas forças entram em crise ou se radicalizam, os liberais pagam o preço“, observou Karl.