Pazuello em depoimento à CPI da Covid no Senado, afirmou que após assumir o comando do Ministério da Saúde teve total autonomia para montar sua equipe.
A CPI da Covid ouviu nesta quarta-feira (19) o ex-ministro Eduardo Pazuello, o depoimento é o mais aguardado da comissão. O ex-ministro foi ser questionado sobre colapso no Amazonas, atraso de vacinas e cloroquina.
Em sua fala inicial, o ministro afirmou que a Suprema Corte limitou a ação do governo federal durante a pandemia de Covid-19. Ele também obteve no STF o direito de ficar calado para não se autoincriminar. Mas é obrigado a falar a verdade sobre terceiros, inclusive sobre Bolsonaro.
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“A União disponibiliza recursos para que estados e municípios executem as ações de saúde. A decisão do STF em abril de 2020 limitou ainda mais essas ações […]. O gestor pleno do SUS é o secretário municipal de Saúde”, afirmou.
O general chefiou o Ministério da Saúde entre maio de 2020 e março de 2021, e foi citado por várias testemunhas na CPI.
Pazuello diz que teve 100% de autonomia para montar equipe
O ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello, em depoimento à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid no Senado, afirmou que, após assumir o comando do Ministério da Saúde, com a saída do médico oncologista Nelson Teich do comando da Pasta, ele teve total autonomia para montar sua equipe.
Pazuello também comentou que sua relação com o presidente Jair Bolsonaro era de uma “amizade simples” sem ter proximidade maior com o mandatário, afirmando que sua indicação para atuar na Saúde teria sido feita por um grupo de oficiais generais que trabalham junto ao governo federal.
Sobre as reuniões com o presidente para tratar de assuntos referentes à pasta, Pazuello afirmou que esses aconteciam menos do ele gostaria, dizendo que os encontros aconteciam, em média, uma vez a cada duas semanas. O ex-ministro também afirmou que o presidente nunca lhe deu ordem direta para nada, defendo que o Executivo nunca deu nenhuma ordem com relação ao tratamento precoce contra covid-19.
Com relação às orientações do governo para o combate à pandemia, o general afirmou que era preciso de um dado comparativo para analisar qualquer questão, e com relação a pandemia, como tudo era “inédito”, “não tem nem rápido nem demorado, nem bonito nem feio”, afirmou, falando que foi necessário tempo para construir sua visão sobre a situação do País, e citando o caso de Manaus. Mas o general também afirmou que o planejamento “macro” do ministério estava pronto quando ele chegou a Saúde.
Sobre as contribuições de Bolsonaro com relação ao tema, Pazuello afirmou que as conversas com o presidente eram sempre de “altíssimo nível” para propor soluções. Segundo ele, também o presidente o orientou a não aceitar qualquer orientação que não viesse diretamente dele. “Ninguém vai falar em meu nome”, afirmou Pazuello sobre Bolsonaro.
SUS
Durante o depoimento, Pazuello também tentou contextualizar uma frase em diz dia “não sabia nem o que era SUS” dita por ele assim que assumiu o comando da Saúde, em outubro, após ter administrado a pasta interinamente durante quatro meses. Segundo disse, ele conhecia o Sistema Único de Saúde de forma simples, assim como também não conhecia escolas particulares, devido à sua carreira militar, onde, segundo ele, sempre foi atendido por hospitais militares e estudou em colégios militares. O contexto daquela frase era “que surpresa espetacular”, afirmou.
Pazuello e Aziz trocam farpas
O ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello foi repreendido pelo presidente da CPI, Omar Aziz (PSD-AM), após pedir que os parlamentares não façam perguntas simplórias a ele. Aziz alertou ao ex-ministro que quem decide quais questionamentos serão feitas são os senadores, e não ele.
Pazuello disse também que, apesar da decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o direito ao silêncio para não se autoincriminar, vai responder a todas as perguntas, sem exceção.
Depois dessa troca de farpas, Pazuello voltou a dizer que prefere responder às perguntas de forma contextualizada. No entanto, o ex-ministro tem sido seguidamente cobrado pelo relator da CPI, Renan Calheiros (MDB-AL), a dar respostas mais objetivas aos questionamentos.
‘Em nenhum momento presidente me desautorizou’, afirma Pazuello
Pazuello afirmou que o presidente Jair Bolsonaro nunca lhe orientou a fazer nada diferente da forma como já estava atuando na gestão da Saúde. Pazuello defendeu também que as orientações da Organização Mundial da Saúde (OMS) são apenas posições – e que quem decide a política a ser implantada no País é o Ministério da Saúde. “Somos soberanos”, disse Pazuello nesta quarta-feira, para quem a organização “ia e vinha” em seus posicionamentos.
O ex-ministro da Saúde disse que não havia falta de convergência entre sua postura como titular da Saúde e o presidente Jair Bolsonaro. “As minhas posições não eram contrapostas pelo presidente, nunca foram contrapostas pelo presidente”, disse em resposta aos questionamentos do relator, Renan Calheiros (MDB-AL). Segundo Pazuello, em nenhum momento Bolsonaro o desautorizou ou o orientou a fazer qualquer coisa que já não estava sendo feita pelo ministério.
“Para colocar uma pedra nesse assunto. Presidente falou para mim e vários ministros: assunto de saúde quem trata é o ministro Pazuello. Nenhuma vez fui chamado para ser orientado pelo presidente de forma diferente, por aconselhamentos externos, nunca, nenhuma vez”, respondeu Pazuello ao ser perguntando sobre um possível “aconselhamento paralelo” feito a Bolsonaro em assuntos da pandemia.
O general respondeu ainda que sempre defendeu medidas preventivas para enfrentamento da pandemia, como uso de máscara, limpeza das mãos e “afastamento social necessário”. “Deveríamos fazer medidas de distanciamento sempre que possível”, disse. “Não deixamos de nos pronunciar em todas as entrevistas, coletivas. Não podemos abrir não de medidas preventivas”, afirmou Pazuello, ressaltando também que as medidas restritivas ficavam a cargo de decisão dos Estados e Municípios.
O ex-ministro disse ainda que nunca houve um direcionamento de isolamento uniforme para todo o Brasil – algo que inclusive ele afirmou ser contrário. Em âmbito nacional, o ministério atuava na distribuição de recursos e equipamentos, afirmou.
Cloroquina
Pazuello voltou a defender o uso de fármacos sem a eficácia comprovada para o tratamento da covid-19 para o tratamento precoce da doença, apesar de afirmar que quando chegou à pasta foi necessário fazer uma nota informativa para conter o uso do medicamento na fase final da doença.
Para Pazuello, as questões com relação à cloroquina são “simples”, disse. “O Brasil usa cloroquina há 70 anos. A cloroquina é um antiviral e um anti-inflamatório conhecido pelo Brasil […] Ele tem ações antivirais e anti-inflamatórias, pelo menos é o que me é trazido, eu não sou médico” afirmou, lembrando o uso de medicamentos durante as crises de Zika e Chikungunya no País. O ex-ministro logo foi corrigido pelo senador Otto Alencar (PSD-BA), que afirmou que o medicamento é antiprotozoário – e não antiviral.
O ex-ministro também afirmou que no começo da pandemia, durante a gestão do Henrique Mandetta, o Ministério da Saúde recomendava o uso do fármaco, observando ainda que teriam sido recomendadas doses altas do medicamento no começo da pandemia, e que foi necessário orientar médicos para que o medicamento não fosse utilizado na fase final da doença. “Nós precisávamos fazer alguma coisa, só que eu não podia fazer protocolos, nem deveria, nem nunca fiz”, afirmou, dizendo que poderia fazer uma “orientação” sobre o uso da cloroquina.
Pazuello negou ter conhecimento da tese de “imunidade de rebanho” através da contaminação de pessoas como opção para lidar com a pandemia no País. Segundo o ex-ministro, somente o deputado Osmar Terra (MDB-RS) lhe comentou sobre a ideia, mas sem nenhum tipo de possibilidade de isso ser colocado como um projeto da pasta. O general negou, inclusive, que o presidente Jair Bolsonaro tenha abordado o tema com ele.
‘Depoimento delirante’
“O depoimento de Pazuello na CPI é delirante. Mesmo com as atrocidades da sua gestão, ele relata que sua pasta teve ação irretocável. Os que aguardavam indignados sua oitiva, acompanham estupefatos a atitude cínica do servil operador da exitosa necropolítica de saúde de Bolsonaro”, escreveu a ex-ministra Marina Silva, em seu perfil no Twitter, sobre o depoimento do ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello na comissão.
Pazuello diz que Pfizer não ficou sem resposta e clima esquenta na CPI da Covid
As respostas do ex-ministro da Saúde sobre a negociação do governo brasileiro para a compra de vacinas da Pfizer culminaram em um bate-boca. O clima esquentou após Pazuello afirmar ao relator, Renan Calheiros (MDB-AL), que as propostas da Pfizer nunca teriam ficado sem resposta do Ministério da Saúde.
Segundo Pazuello, foram “inúmeras” vezes que a pasta falou com a farmacêutica. O ex-ministro argumentou que as negociações enfrentaram desafios em razão das cláusulas do contrato e questões logísticas, além do preço.
“Essas discussões nos consumiram em setembro e outubro. De agosto a setembro estávamos discutindo com a Pfizer ininterruptamente”, disse Pazuello. “A resposta à Pfizer é uma negociação. Eu estou falando de dezenas de reuniões e discussões. A resposta sempre foi: ‘sim, queremos comprar’, mas não posso comprar se você não flexibilizar tal medida, se não auxiliar na logística”, afirmou o general na CPI.
O estranhamento com Renan se acirrou diante do questionamento de que o ministério teria deixado a farmacêutica por sete vezes sem resposta. “Não houve decisão de não responder a Pfizer. Presidente era informado o tempo todo sobre as minhas conduções, não só da Pfizer. Foi informado por mim em todo o processo que começou em julho até março, quando contratamos a Pfizer, pessoalmente por mim”, afirmou Pazuello, que foi então perguntado por Renan se a Pfizer estaria mentindo. “Eu respondo por mim”, disse o ex-ministro.
Pazuello disse ainda que as negociações aconteciam em nível administrativo, e que ministros não podem receber empresas para fazer esse tipo de tratativa. “O senhor deveria saber disso”, dirigiu a Renan, o que provocou um repreensão a Pazuello pelos senadores da CPI.
“O senhor está dizendo que eu não respondi, eu respondi centenas de vezes. Respostas foram respondidas inúmeras vezes, queremos comprar a Pfizer, nunca fechamos a porta, o senhor me desculpe, acho que o senhor está conduzindo a conversa”, afirmou o ex-ministro.
“Nos colocaram cinco cláusulas complicadíssimas, ativos brasileiros no exterior, isenção completa da responsabilidade por efeitos colaterais, referência do fórum para Nova York, pagamento adiantado, assinatura do presidente da República em contrato, não existirem multas quanto ao atraso de entrega. Para ouvir isso a primeira vez, eu achei muito estranho”, disse Pazuello, afirmando ainda que a Pfizer cobrava US$ 10 pela dose e as negociações com outras farmacêuticas estavam em US$ 3,75.
O presidente da CPI, Omar Aziz (PSD-AM), então pediu que Pazuello entregue à CPI os documentos das negociações com a farmacêutica, a fim de evitar uma acareação com representantes da empresa. O ex-ministro afirmou que essas comprovações serão apresentadas à comissão.
Bolsonaro e Coronavac
No depoimento à CPI da Covid, Pazuello tentou minimizar o episódio em que o presidente Jair Bolsonaro o desautorizou a comprar a Coronavac, em outubro do ano passado. Na ocasião, o ex-ministro chegou a anunciar o acordo com o Instituto Butantan para a compra de 100 milhões de doses. Pazuello alegou que aquele era um posicionamento “político” de Bolsonaro, direcionado a um “agente político de São Paulo” – o governador João Dória (PSDB) – mas que não houve repercussão prática nas negociações do imunizante com o Butantan.
“Uma postagem na internet não é ordem, ordem é direta, verbal ou por escrito. E não havia compra, só havia termo de intenção e ele foi mantido”, disse. “O presidente não deu ordem para não comprar nada”, afirmou o ex-ministro.
Confrontando pelo relator, Renan Calheiros, sobre o momento em que Bolsonaro o desautorizou publicamente, Pazuello disse que, a ele, nenhuma ordem foi dada. “Ele falou publicamente. Para o ministério ou para mim, nunca”, disse, tentando blindar o presidente no episódio.
“O presidente fala como chefe de Estado, mas também como agente político, se pronuncia como agente político. Quando ele recebe posição de agente político de São Paulo, ele se posiciona como agente político também”, tentou justificar Pazuello, que atribuiu a frase dita sobre Bolsonaro por ele na ocasião, “um manda, outro obedece”, a um “jargão militar”.
Pazuello sobre mortes: nossa resposta para estruturação de leitos não foi rápida
Pazuello atribuiu as mortes por covid-19 no Brasil a “outros fatores” além do alto índice de contaminação, entre eles, a falta de estrutura médica e oferta de leitos. Em depoimento à CPI da Covid no Senado, o ex-ministro afirmou que a capacidade do governo federal de implantar leitos dos SUS “não foi a mais rápida que poderia ser”.
“Pode haver uma curva de contaminação alta e uma curva de óbitos baixa ou pode haver simultâneas. Eu acredito que a curva de óbito tenha a ver com muitas outras estruturas ou muita falta de estrutura”, disse Pazuello ao colegiado. Segundo o general, “a capacidade de tratar as pessoas poderia ter alcançado um outro nível”.
Para a avaliação do ex-ministro, falas negacionistas do presidente Jair Bolsonaro sobre o fim da pandemia e redução da gravidade da doença, são “uma forma de cuidar da parte psicossocial” da população. O general, que mesmo discordando da abordagem de “imunidade de rebanho”, disse que jamais seguiria ordens ou opiniões emanadas pelo presidente nas redes sociais.
O ex-ministro também atribuiu o agravamento da pandemia no País à liberdade médica para sugerir terapias à covid-19 – fator defendido de modo ferrenho pelo presidente Jair Bolsonaro a fim de sugerir o uso de medicamentos sem eficácia comprovada contra a doença. “A soberania médica de tomar posições faz com que não haja um alinhamento claro para o tratamento no nosso país. Existem médicos numa linha e médicos em outras linhas”, afirmou Pazuello.
Apesar da fala, o ex-ministro disse descartar que o uso de medicamentos sem eficácia comprovada para o tratamento da covid seja “um fator decisivo” para o número de óbitos no País. “Eu não sou um médico, mas por tudo que eu ouvi até agora, isso não é um fator decisivo”, disse. Para Pazuello, a falta de uma busca imediata por atendimento quando confirmado o diagnóstico deve ter sido o fator principal para o aumento no número de óbitos por covid no Brasil.
Vice-presidente da CPI pede quebra de sigilo bancário e telefônico de Pazuello
O vice-presidente da CPI da Covid, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), apresentou nesta quarta um requerimento para que os sigilos bancário e telefônico do ex-ministro Eduardo Pazuello sejam quebrados. O senador pediu que sejam compartilhados com a comissão todos os dados fiscais e telemáticos de Pazuello desde 2020.
Como justificativa, Randolfe cita o que chamou de “gravíssima revelação” feita na noite desta terça-feira, 18, pelo Jornal Nacional dando conta de que, durante a gestão do general no Ministério da Saúde, militares escolheram, sem licitação, empresas para reformar prédios antigos no Rio de Janeiro. “E, para isso, usaram a pandemia como justificativa para considerar as obras urgentes”, observou o senador.
Ainda não há data para o pedido ser analisado pelos integrantes da CPI. Há também pedidos de quebra de sigilo telefônico e bancário do vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ) – apontado como integrante de um núcleo de aconselhamento paralelo ao Ministério da Saúde para ações do governo que dizem respeito à pandemia – e de Fabio Wajngarten, ex-secretário de Comunicação, que auxiliou nas negociações para aquisição de vacinas da Pfizer.