Como se sabe, a segurança pública se transformou na maior preocupação dos brasileiros. Segundo pesquisa do Instituto Quaest realizada em outubro, 30% dos entrevistados mencionaram esse tema como sua maior aflição no momento, contra um índice de 17%, verificado um ano atrás. A megaoperação policial deflagrada em comunidades do Rio de Janeiro, na terça-feira passada, colocou o assunto em evidência e provocou discussões intermináveis neste final de semana – temperadas evidentemente pela polarização política.
Uma pesquisa divulgada ontem pelo jornal “O Globo” e também realizada pela Quaest mostra que os filtros ideológicos atuam fortemente para moldar a percepção da sociedade sobre a ação policial ocorrida na última terça-feira. Mesmo assim, parece haver um ponto em comum: a maioria dos entrevistados (64% da amostra, colhida apenas com residentes no estado do Rio de Janeiro) aprova o trabalho realizado nos Complexos do Alemão e da Penha.
Mas quando fazemos cortes nessas pesquisas, percebemos claramente a influência da ideologia nas respostas dos entrevistados. Vamos aos números, começando da esquerda para a direita.
Para os lulistas, apenas 35% aprovam a atuação dos policiais; 59% desaprovam. Na chamada esquerda não lulista, o repúdio é ainda maior: 70% rejeitam a ação e apenas 27% aprovam.
Entre os chamados independentes, 61% apoiam e somente 24% criticam. Mas é neste grupo que o muro está bastante cheio: são dez por cento os entrevistados que nem aprovam ou desaprovam a operação, o maior teor de neutralidade registrado pela pesquisa.
Já na direita, a percepção é ainda mais favorável aos policiais que a dos independentes. No grupo que a Quaest chamou de “direita não bolsonarista”, a aprovação é de 92% (apenas 6% desaprovam); já entre os bolsonaristas, o apoio é de 93% dos pesquisados (3% contra).
Há, no entanto, outro ponto em comum entre todos os grupos e que está acima das ideologias. São 74% os fluminenses que têm medo de uma reação do tráfico (25% não possuem receio). Trata-se de uma preocupação fortíssima entre a população local. É por isso que apenas 35% se sentem mais seguros depois da megaoperação; 52% dos entrevistados, entretanto, têm uma visão diferente e se sentem menos seguros.
A segurança pública, portanto, permanece como um terreno movediço no qual convicções políticas, experiências pessoais e temores coletivos se entrelaçam. A operação no Rio escancarou não apenas a complexidade da atuação policial em áreas dominadas pelo tráfico, mas também a maneira como diferentes grupos interpretam os mesmos fatos sob lentes ideológicas distintas. Ainda que a aprovação ou rejeição da ação varie conforme o espectro político, o medo da retaliação e a sensação de insegurança revelam uma ferida comum. Necessitamos, assim, construir políticas públicas que transcendam divisões e respondam ao que, de fato, inquieta a população. Uma construção que deve ser feita em conjunto, por todas as forças políticas brasileiras, incluindo o governo federal e os governos estaduais hoje comandados pela direita e pelo centro.
Sem essa união, ainda que momentânea, jamais iremos resolver problemas que afligem a sociedade, deixando a população em estado permanente de pânico ou de sobressalto.