O cientista político Luiz Felipe d’Ávila deixou um diagnóstico direto, e incômodo, durante o programa Money Report, da BM&C News, pela primeira vez desde a redemocratização, o maior produtor de instabilidade institucional no Brasil não é o Executivo, nem o Congresso. É o Judiciário.
Para ele, o país entra em 2026 diante de um tabuleiro político imprevisível, instituições fragilizadas, um Congresso dominado por interesses eleitorais imediatos e um vácuo de liderança no Palácio do Planalto. Em meio a essa combinação, o próximo ciclo eleitoral pode ser decisivo para reequilibrar ou aprofundar, a crise de confiança nas regras do jogo democrático.
Judiciário como fonte inédita de instabilidade institucional
D’Ávila foi categórico ao afirmar que “Hoje, o maior fator de instabilidade no país é o Judiciário.”
O diagnóstico mira três fenômenos que, na visão dele, corroem a credibilidade das instituições:
1. Decisões retroativas
O cientista político citou o caso da contribuição sobre o lucro líquido, que, segundo ele, virou exemplo de insegurança jurídica extrema.
Decidir que empresas devem pagar impostos referentes a períodos passados cria um ambiente em que nenhum investidor confia na previsibilidade do Estado.
A mensagem implícita, afirma d’Ávila, é perigosa: “A regra pode mudar depois que o jogo acabou.”
2. Excesso de judicialização
O Brasil lidera rankings globais de judicialização:
- 75% do PIB está, de alguma forma, envolvido em contenciosos tributários ou trabalhistas;
- Empresas atuam em setores estrangulados por litígios constantes;
- O Judiciário substitui o Legislativo em temas sensíveis.
Isso cria uma cultura de conflito permanente, não de solução.
3. STF ultrapassando limites constitucionais
D’Ávila fala em um Supremo que acumula poder e invade competências de outros Poderes, sem mecanismos de freios e contrapesos eficazes.
Segundo ele, não há reforma institucional possível enquanto populistas governarem, porque esses governos tendem a enfraquecer, e não fortalecer, as instituições, já que enxergam os freios constitucionais como obstáculos ao exercício do poder.
Falha do Executivo e ascensão de um Centrão sem direção
Se o Judiciário cria instabilidade, o Executivo cria um vácuo. D’Ávila argumenta que o país vive hoje a ausência de liderança presidencial. Sem coordenação, quem cresce é o Centrão.
E isso traz um efeito direto:
O Centrão faz o jogo que quer
Sem orientação do Executivo, o bloco atua para seus próprios interesses, essencialmente, reeleger deputados e ampliar o acesso a emendas e verbas. Reformas estruturais deixam de existir porque não rendem dividendos eleitorais imediatos.
O Congresso virou freio e também fator de paralisia
D’Ávila reconhece que o Congresso foi responsável por impedir retrocessos:
- evitou mudanças na Lei das Estatais;
- protegeu o marco do saneamento;
- defendeu a independência do Banco Central.
Mas ressalta que, sem liderança, a mesma força que barra retrocessos não consegue empurrar avanços. O país fica parado.
O tabuleiro eleitoral de 2026: um divisor de águas
A eleição presidencial de 2026 é vista por d’Ávila como uma oportunidade, ou risco, de reorganizar o equilíbrio de forças no país.
Tarcísio como possível unificador da direita
Segundo d’Ávila, se Tarcísio de Freitas decidir concorrer, a direita tende a se unir em torno dele. Isso pode reduz fragmentação, cria uma candidatura competitiva desde o início e aumentar a chance de segundo turno contra Lula.
Ele afirma que, nesse cenário, o presidente tende a “derreter mais rápido”, pois a presença de um adversário forte reequilibra o jogo político.
Se Tarcísio não concorrer: estratégia “modelo Chile”
Sem um unificador, a direita teria de adotar outra tática: multiplicar candidaturas para forçar um segundo turno. Um único candidato fraco enfrentando Lula poderia resultar em vitória no primeiro turno, algo que seria visto como risco institucional.
A força invisível: governadores
D’Ávila destaca que o Brasil vive um momento raro: uma das melhores gerações de governadores e prefeitos da história recente. Lideranças técnicas, orientadas por dados e evidências, transformam administrações estaduais em polos de governança moderna.
Para ele, esse grupo será decisivo a partir de 2030 e já começa a influenciar o debate em 2026.
Por que o Brasil não consegue fazer reformas institucionais?
A resposta, na visão de d’Ávila, é simples e dura: porque o país elege populistas.
E governos populistas:
- rejeitam limites;
- não constroem instituições inclusivas;
- tentam concentrar poder;
- preferem benefícios imediatos à estabilidade de longo prazo.
Segundo ele, desde 1985, apenas Fernando Henrique Cardoso e Michel Temer tiveram compromisso real com reformas estruturais:
- FHC com abertura econômica, privatizações, marco regulatório e estabilidade;
- Temer com teto de gastos, reforma trabalhista e início da agenda de responsabilidade fiscal.
A consequência é que, sem líderes com visão de longo prazo, o Brasil vive ciclos curtos de avanço seguidos por retrocessos, os “voos de galinha”,
O impacto econômico da instabilidade institucional
A instabilidade institucional tem correlação direta com:
Investimento menor
Decisões retroativas, interferências judiciais e normas voláteis fazem empresas adiarem investimentos. Nesse ambiente, o capital prefere esperar ou migrar para ativos mais previsíveis.
Risco regulatório e insegurança jurídica
Do setor aéreo ao elétrico, passando por infraestrutura e tributação, a incerteza sobre regras futuras inviabiliza planejamento de longo prazo.
Volatilidade no câmbio e nos ativos
Em períodos eleitorais, a situação piora. Em 2024, por exemplo, o dólar variou de R$ 4,98 a R$ 6,20, uma desvalorização de 27%, uma das maiores do mundo naquele ano.
Segundo d’Ávila, em 2026 a trajetória da economia dependerá mais das sinalizações internas do que de ventos externos.
Conclusão: 2026 será um ponto de inflexão
D’Ávila encerra com uma síntese clara: 2026 pode ser o ano que define se o Brasil retoma uma trajetória de fortalecimento institucional ou mergulha em uma era de instabilidade prolongada.
Tudo dependerá de:
- quem liderará o país;
- qual modelo econômico prevalecer;
- como os Poderes se reposicionarão;
- se haverá reconstrução da confiança nas regras do jogo.
O cientista político afirma que o Brasil tem condições de entrar em um novo ciclo virtuoso, apoiado em governadores qualificados, empresários dispostos a investir e uma sociedade mais informada. Mas, sem resolver a instabilidade institucional, hoje comandada pelo próprio Judiciário, qualquer projeto de país continuará travado.












