Dada por muitos como morta e enterrada, a anistia política ao ex-presidente Jair Bolsonaro ganhou enormes possibilidades de ressuscitar no Congresso. No início do julgamento de Bolsonaro, o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, separou uma parte de seu pronunciamento para falar dos efeitos nefastos de um perdão ao réu – e comparou esse processo ao período histórico que precedeu a Segunda Guerra Mundial.
“A pacificação do país é um desejo de todos nós, mas depende do respeito à Constituição, da aplicação das leis e do fortalecimento das instituições, não havendo possibilidade de se confundir a saudável e necessária pacificação com a covardia do apaziguamento”, disse Moraes. “A democracia brasileira não irá mais suportar a ignóbil política de apaziguamento, cujo fracasso foi amplamente demonstrado na tentativa de acordo do então primeiro-ministro inglês Neville Chamberlain com Adolf Hitler”.
O raciocínio do ministro traz em seu bojo uma elucubração que muitos cultivam: se Winston Churchill estivesse no poder no lugar de Chamberlain, não teria havido o grande conflito internacional.
Mesmo que a história tivesse se desenvolvido dessa forma, porém, é altamente improvável que a Segunda Guerra Mundial pudesse ter sido evitada. Hitler já havia traçado um plano expansionista claro desde os anos 1920, e suas ações — como a anexação da Áustria e dos Sudetos — seguiam uma lógica agressiva e ideológica que não dependia de uma eventual pressão britânica. Além disso, o Reino Unido ainda se recuperava da Primeira Guerra e seus súditos eram tomados pelo espírito pacifista. Churchill, embora mais firme que Chamberlain, teria enfrentado resistência política interna e falta de apoio popular para confrontar a Alemanha antes de 1939.
A guerra também não dependia exclusivamente da liderança dos britânicos. A invasão da Polônia, o pacto de não agressão entre Alemanha e União Soviética e a crença de Hitler de que França e Reino Unido não reagiriam mostram que o embate era inevitável. Churchill só foi aceito como líder quando a guerra já estava em curso. Portanto, sua presença no poder antes de 1939 poderia ter preparado melhor o Reino Unido para o confronto, mas não teria mudado o rumo da história: a guerra teria acontecido de qualquer forma.
Voltando ao ano de 2025, no Brasil, para discutir a anistia a Bolsonaro.
Hugo Motta já admite colocar o projeto em pauta e vemos o governador Tarcísio de Freitas plenamente engajado em fazer o perdão a Bolsonaro sair do papel (mas, por enquanto, Davi Alcolumbre ainda é contrário à ideia). De qualquer forma, os bolsonaristas não devem ficar muito animados. Uma coisa é a anistia, outra é a inelegibilidade. Bolsonaro pode ser perdoado, mas deverá continuar inelegível. Logo, ficará fora das eleições de 2026 e terá de apoiar oficialmente alguém para a disputa.
O Centrão já entrou em campo para aproveitar essa oportunidade e neutralizar as ambições do deputado Eduardo Bolsonaro, que deseja ser candidato no ano que vem ao Planalto. A anistia, neste caso, vai virar moeda de troca e deve ser colocada em compasso de espera para sensibilizar Bolsonaro a apontar oficialmente Tarcísio como seu herdeiro político.
Há, no entanto, um efeito negativo para o perdão a Bolsonaro – o de relativizar, no futuro, a importância de atentados e conspirações contra a democracia. Aquele que não respeitar o resultado de uma eleição e tentar virar a mesa dificilmente vai temer uma punição vinda da Justiça. Mas é assim que funciona o Brasil: com os olhos postos no curto prazo e raramente no futuro.