Uma pesquisa recente do Datafolha mostrou que 78% dos brasileiros acham que o Congresso age mais em benefício próprio do que dos brasileiros. E a percepção popular está correta, embora existam parlamentares que genuinamente coloquem as necessidades da sociedade em primeiro lugar. Recentemente, tivemos um exemplo de como determinados setores do Parlamento agem quando seus interesses são contrariados: a proposta de dar aos congressistas o poder de demitir diretores do Banco Central, hoje protegidos pela autonomia conquistada em 2021.
Um grupo de sete deputados protocolou um pedido de urgência de tramitação para essa proposta. Curiosamente, entre esses sete parlamentares, quatro votaram pela autonomia do BC quatro anos atrás. O que mudou de lá para cá? A venda do Banco Master para o BRB, que estava parada na diretoria do Banco Central, recebendo resistência do próprio presidente da instituição, Gabriel Galípolo. O projeto seria uma forma explícita de pressionar os diretores. Mas o tiro saiu pela culatra. O BC, na noite de quarta-feira, comunicou ao mercado que não autorizaria a venda da instituição financeira ao banco estatal.
Apesar do veto dos diretores do Bacen, o BRB quer continuar discutindo a operação – e, dessa forma, a pressão deste grupo de deputados deverá continuar. O mercado financeiro em peso criticou o projeto, assim como economistas e até veículos de comunicação.
O jornal “O Globo”, por exemplo, escreveu o seguinte em seu editorial de ontem: “É graças aos mandatos fixos, com estabilidade garantida por lei, que os diretores do BC podem tomar decisões sobre juros e temas de natureza regulatória com base técnica, sem estar vulneráveis a pressões políticas ou econômicas. É evidente que, uma vez sujeitos aos humores dos congressistas, esvai-se a confiança necessária para preservar a integridade do sistema financeiro e a estabilidade da moeda”.
A prerrogativa de demitir os profissionais que hoje estão à frente da autarquia seria em nome de um “interesse nacional” – um termo vago, que pode ser traduzido como o bel-prazer dos parlamentares. Digamos que um grupo amplo de deputados resolva que os juros precisam baixar, em um momento em que as análises técnicas sugerem o contrário. Esses congressistas, então, poderiam agir para trocar a diretoria em nome do tal “interesse nacional”, o que seria um perigo para a economia.
Preservar a autonomia do Banco Central é mais do que uma questão técnica — é um pilar da estabilidade democrática. A tentativa de submeter seus diretores ao crivo político, sob o pretexto de um conceito aleatório como o “interesse nacional”, escancara o risco de captura institucional por agendas particulares. Quando decisões econômicas passam a depender do humor de parlamentares, abre-se espaço para populismo, insegurança jurídica e volatilidade monetária.
A sociedade já demonstrou, por meio de pesquisas como a do Datafolha, que reconhece esse padrão de comportamento no Congresso. Cabe agora aos demais poderes, à imprensa e à opinião pública manterem vigilância ativa. Porque, no fim das contas, proteger a autonomia do Banco Central é preservar o bolso, a moeda e o futuro do país.