Os ativos judiciais ganharam atenção em 2025 em meio à combinação de elevado volume de litígios, pressão financeira sobre empresas e avanço da liquidez nesses créditos. O Brasil segue como o país mais litigioso do mundo, com 83,7 milhões de processos em tramitação — na prática, mais de um processo para cada dois habitantes.
No campo tributário, o estoque de créditos federais controversos já supera R$ 5 trilhões, enquanto o passivo judicial acumulado entre Estados e União ultrapassa R$ 2,3 trilhões. Esse cenário cria um ambiente em que disputas judiciais passam a ser tratadas como ativos de grande magnitude econômica.
No setor privado, o avanço das insolvências ampliou ainda mais esse mercado. Em 2024, foram registrados 2.273 pedidos de recuperação judicial, alta de 61,8% em relação ao ano anterior. As projeções indicam que 2025 deve ultrapassar a marca de 3 mil solicitações, refletindo um ambiente de juros elevados por período prolongado e maior seletividade no crédito.
O crescimento da liquidez aproximou o Brasil de práticas observadas em mercados mais desenvolvidos, onde carteiras litigiosas são avaliadas com base em métricas padronizadas de probabilidade de êxito, risco e duração. Ainda assim, o descompasso institucional permanece evidente. A heterogeneidade das decisões judiciais, a baixa previsibilidade dos prazos e a fragmentação documental dificultam a construção de curvas de preço consistentes em um sistema que concentra trilhões de reais em disputas.
Para Matheus Matos, sócio da MA7 Negócios, o país vive uma etapa intermediária entre o aumento do interesse dos investidores e a capacidade limitada de estruturar parâmetros objetivos. “O Brasil acumula um dos maiores volumes de litígios do mundo, mas ainda não consolidou padrões claros de avaliação. A liquidez aumenta, mas a assimetria de informação permanece elevada. Sem padronização mínima de documentação, probabilidade de êxito e qualidade de lastro, o investidor não consegue comparar ativos de forma objetiva. A ideia de uma bolsa é possível, mas depende de previsibilidade e governança que ainda não estão maduras”, afirma.
Em mercados como Estados Unidos e Reino Unido, onde o litigation finance se tornou parte estruturante do sistema de justiça, ativos judiciais são negociados dentro de modelos consolidados, apoiados em métricas uniformes, transparência regulatória e auditorias independentes. No Brasil, o mercado ainda opera em estágio inicial.
A ausência de séries históricas consistentes, a dificuldade de comparar prazos e probabilidades entre tribunais e a falta de parâmetros nacionais de risco impedem a construção de referências claras de precificação. Embora a digitalização tenha acelerado o fluxo de informações, as disparidades de interpretação jurídica continuam afetando a previsibilidade das decisões.
Ao mesmo tempo, a demanda do setor privado por instrumentos alternativos de financiamento se intensificou, impulsionando a expansão de estruturas especializadas e o interesse de investidores institucionais. Ainda assim, permanece em aberto a discussão sobre a capacidade do país de avançar para um mercado mais transparente, organizado e comparável.
O aumento da liquidez e a entrada de estruturas mais sofisticadas alimentam a expectativa de evolução do setor, com critérios de avaliação mais homogêneos e mecanismos de precificação menos dependentes de percepções individuais. Especialistas, no entanto, ressaltam que transparência, padronização e governança seguem como condições essenciais para qualquer avanço institucional.
Para Paulo Vitor Magalhães, Head de Novos Negócios da MA7 Negócios, o momento exige cautela. “A tecnologia resolveu barreiras importantes, mas não substitui a necessidade de segurança jurídica. Um mercado de escala exige confiança, previsibilidade e regras estáveis. Sem isso, a liquidez cresce, mas permanece concentrada em poucos players. Se o Brasil conseguir reduzir assimetrias, consolidar métricas e fortalecer o uso de precedentes, aí sim poderemos falar em algo próximo de uma bolsa”, conclui.

