Michael Burry, o investidor que ganhou fama mundial ao prever o colapso do subprime e inspirar o filme A Grande Aposta, voltou a repetir um movimento que marcou sua carreira: encerrar um fundo logo após ganhos expressivos e crescente desconforto com o mercado.
A SEC confirmou em novembro de 2025 o cancelamento do registro da Scion Asset Management, marcando o fim oficial da gestora fundada por Burry após sua primeira grande tacada. O investidor deve liquidar cerca de US$ 155 milhões em ativos e devolver todo o capital aos cotistas até o fim do ano — decisão que reacende debates sobre seu papel como um dos mais célebres “contrarians” de Wall Street.
Um padrão que se repete
A trajetória de Burry se confunde com sua personalidade. Diagnosticado com síndrome de Asperger e avesso ao contato com investidores, ele abandonou a Scion Capital em 2008 depois de transformar aproximadamente US$ 1 bilhão em mais de US$ 2,69 bilhões para seus clientes.
Entre 2005 e 2007, Burry apostou contra a bolha imobiliária utilizando credit default swaps oferecidos a preços irrisórios por grandes bancos. Suas análises indicavam que a estrutura dos títulos subprime entraria em colapso — uma leitura que poucos fizeram na época.
Quando a crise estourou e o S&P 500 desabou 37%, a Scion Capital subiu 489%, tornando Burry uma lenda. Mas a pressão psicológica o consumiu. Em uma carta célebre, escreveu: “Eu simplesmente não consigo mais fazer isso.” Em junho de 2008, devolveu o dinheiro aos investidores; em outubro, fechou o fundo, ironicamente no auge da turbulência que havia previsto.
Por que Burry está saindo novamente?
A decisão de encerrar a Scion Asset Management em 2025 segue uma lógica semelhante: desalinhamento com o mercado, desgaste emocional e aversão ao ruído especulativo. Segundo documentos enviados à SEC, a gestora está encerrando operações por vontade do próprio Burry, que alega que suas análises “não estão em sincronia com os mercados”.
Nos últimos meses, ele se tornou uma das vozes mais críticas à euforia em torno da inteligência artificial. Em postagens no X, classificou o fenômeno como uma nova bolha de exuberância irracional, frequentemente citando empresas como Nvidia e Palantir — alvos de posições vendidas que ultrapassaram US$ 1,1 bilhão.
Sua percepção é de que as avaliações dispararam para níveis que não refletem fundamentos, ecoando o ceticismo que exibiu na década de 2000 antes da crise imobiliária.
Retorno ao modelo de family office
Assim como fez em 2008, Burry deve agora migrar para um family office, focando exclusivamente na gestão de seu próprio dinheiro. O movimento reforça seu estilo peculiar: lucra pesado quando identifica distorções de mercado, mas recua quando sente que a pressão humana e o comportamento coletivo tornam o ambiente tóxico demais.
Com a saída de Burry, analistas e investidores se perguntam se este é apenas um gesto individual — ou um sinal de alerta sobre o estágio atual dos mercados, especialmente da febre em torno da IA.
Um novo prenúncio?
Michael Burry ganhou o apelido de “Cassandra” — a vidente da mitologia grega que previa tragédias, mas raramente era ouvida. Suas decisões costumam soar como alertas antecipados sobre fragilidades sistêmicas.
Ao encerrar novamente um fundo logo após ganhos relevantes e divergências sobre preços de ativos, ele reforça sua reputação de enxergar crises antes dos demais.
Resta saber se, assim como em 2008, a retirada de Burry marca o início de outra era de questionamento sobre a exuberância dos mercados — ou apenas mais um capítulo na trajetória singular de um dos investidores mais desconfortáveis com o próprio sucesso.
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