O investidor e empresário João Kepler, detalhou no BM&C New Deal a tese que o levou a construir um dos track records mais sólidos do mercado de investimentos alternativos no Brasil. Com mais de 1.700 investimentos em venture capital desde 2015 e 127 saídas, Kepler defende uma abordagem pragmática, centrada em validação de clientes e foco na liquidez. “O segredo é olhar a saída desde a entrada”, resumiu.
Segundo Kepler, a estratégia é baseada em cheques pequenos, ampla diversificação e um funil disciplinado que privilegia negócios B2B com validação inicial, não ideias descoladas do mercado. O resultado é um tempo médio de realização de 3,8 anos por investimento, bem abaixo do horizonte tradicional de 10 anos no venture capital. Além disso, ele afirma manter um índice de perdas (write-off) em torno de 8%, muito inferior às referências de 60% a 70% em estudos internacionais para estágios iniciais.
Validação acima do “pitch”: como Kepler escolhe as empresas
Kepler critica a glamorização do empreendedorismo e a crença de que um bom “pitch” resolve tudo. Para ele, o que separa narrativas de negócios reais é a prova de tração, mesmo que mínima. “Se você tem um cliente, dois clientes, três clientes, você começa a mostrar uma certa validação”. Nesse sentido, a diligência que mais pesa não é apenas a jurídica ou contábil, mas a conversas com usuários, clientes e colaboradores, para entender se o produto resolve uma dor concreta e tem longevidade.
Por outro lado, a Bossa evita modismos e valuations inflados. Kepler contou que não corre atrás de ondas como metaverso ou IA só porque são tendências, preferindo entrar quando há preço e necessidade real de smart money. “Eu não entro em modinha. Preciso de upside. Se o valuation está alto demais, como vou gerar retorno lá na frente?”
Qual é a tese de Kepler para multiplicar capital com risco controlado?
O investidor resume a tese em três pilares: validação, horizonte de saída e disciplina de portfólio. A ideia é entrar cedo, mas já com rotas de liquidez mapeadas (venda estratégica, consolidações, M&A) e com um número elevado de apostas para diluir riscos. “Eu invisto pouco em muitos negócios. Quando uma acerta, paga a carteira; quando duas ou três acertam, o retorno dispara.”
Kepler reforça que capital sozinho não sustenta empresas frágeis. Ele defende a figura do investidor que aporta rede, conhecimento e governança. Seus livros, como Smart Money e O Poder do Equity, foram citados como compilações de aprendizados práticos, com foco em captação e postura do investidor. “Investimento não é sobre dinheiro; é sobre cabeça”, disse, ao relatar que formou a tese após receber um “não” de um fundo e, a partir dali, estudar o mecanismo de venture deals.
O que um empreendedor deve apresentar para atrair investimento?
- Validação mínima: primeiros clientes pagantes, taxa de conversão, NPS ou uso recorrente.
- Problema claro: “Busque pessoas pela dor, não pela sua vontade de vender”.
- Governança básica: organização societária, contratos, contabilidade e compliance em ordem.
- Rota de crescimento: plano operativo do “pouco que já fez” para o próximo estágio.
- Disciplina financeira: separação entre caixa da empresa e despesas pessoais.
Como evitar armadilhas comuns no early stage?
Enquanto isso, Kepler aponta sinais de alerta que exigem “apertar o eject”: empreendedores que drenam caixa com pró-labores descolados da realidade, misturam finanças pessoais e corporativas, ou desviam foco do negócio para palco e vaidade. “Não é botar dinheiro bom em coisa ruim”, resume. A cultura interna também pesa, empresas que prosperam tendem a ter ambiente saudável, propósito claro e orientação ao impacto, fatores que reforçam a resiliência.
Exits, impacto e casos emblemáticos
Entre os casos citados, Kepler destacou o app de tradução de Libras Hand Talk, premiado globalmente, e o Repassa, vendido para a Lojas Renner. Em outro investimento, mencionou múltiplos na casa de 130 vezes o capital investido após quatro a cinco anos. Por isso, recomenda que mesmo empresas que não planejam IPO adotem cedo boas práticas, como governança, auditoria e compliance elevam a confiança do investidor e abrem portas para saídas estratégicas.
IA, modas e preço: João Kepler mostra onde está o verdadeiro valor
Nesse sentido, Kepler vê a inteligência artificial como ferramenta a ser embarcada em qualquer negócio, mas isso não significa pagar caro por projetos sem upside. “Se o valuation já precifica o futuro, não há retorno a capturar.” Em renda variável, ele compara: o desafio de separar medo e ganância é o mesmo; no venture, a bússola é a capacidade da empresa de multiplicar valor de 1 para 10, 20 ou 50 por um caminho factível, seja por receita, base de usuários ou encaixe estratégico para compradores.
Além disso, Kepler recomenda que o empreendedor “tire a ideia do papel” com ferramentas de baixo custo e valide rápido, landing pages, protótipos e pilotos pagos. No relacionamento com investidores, clareza de objetivo é vital: negócios criados “por necessidade” e sem plano de expansão raramente atraem capital. “Se o valoeixo não multiplica, melhor deixar o dinheiro na renda fixa”, provocou.
Por que a diligência com clientes pesa mais, segundo João Kepler?
Por outro lado, a Bossa prioriza ouvir quem usa e quem opera o produto. A diligência jurídica/contábil é necessária, mas pode cegar para a questão central: se a solução resolve uma dor grande o suficiente para sustentar crescimento e atrair compradores. “Converse com clientes e colaboradores: é aí que você descobre a verdade do negócio.”
Em síntese, o método de João Kepler combina validação antecipada, desenho de liquidez e gestão ativa do portfólio. Com tempo médio de 3,8 anos por saída, write-off ao redor de 8% e mais de 127 exits, a tese demonstra que é possível multiplicar capital em investimentos alternativos com processo, critério e foco em resolver dores reais do mercado.