O cenário macroeconômico para 2026 será marcado por juros ainda elevados, incertezas fiscais persistentes e um crescimento cada vez mais condicionado à capacidade do Brasil de reorganizar suas contas públicas e avançar em reformas estruturais. A avaliação é do economista-chefe do BTG Mansueto Almeida, que participou do segundo dia do Profit Summit, evento promovido pela Nelogica, em São Paulo.
Corte da Selic em janeiro de 2026 não elimina juro real elevado
Mansueto afirmou que espera que o Banco Central inicie o ciclo de corte da taxa Selic em janeiro de 2026, mas destacou que isso não representará uma normalização rápida do custo do dinheiro. Mesmo com o início do processo de flexibilização monetária, o Brasil deve continuar entre os países com as maiores taxas de juros reais do mundo.
Parte do mercado fez uma leitura mais hawkish do comunicado da última reunião do Comitê de Política Monetária, Copom, diante do tom cauteloso adotado pelo Banco Central. Ainda assim, Mansueto observou que algumas escolhas de palavras no comunicado permitem uma interpretação de que a autoridade monetária já reconhece melhora relevante nas condições macroeconômicas, o que abre espaço técnico para o início do ciclo de cortes no começo de 2026.
Segundo o economista, o Banco Central vem ajustando a comunicação de forma gradual, reduzindo o grau de rigidez sem assumir compromissos explícitos. “É uma comunicação que mantém cautela, mas já embute uma opção de corte”, avaliou.
A projeção apresentada por Mansueto é de um ciclo de afrouxamento monetário que começaria com a Selic em 15% e terminaria próxima de 12%, ainda um patamar elevado em termos históricos. Atualmente, o juro real supera 10% e, mesmo com os cortes ao longo de 2026, deve permanecer acima de 8%. Isso significa, segundo ele, dois anos consecutivos de juros muito altos, impondo custo relevante à economia, ao crédito e ao investimento produtivo.
Na avaliação de Mansueto, esse nível não é uma escolha discricionária do Banco Central, mas consequência direta da incerteza fiscal. Enquanto o fiscal não estiver equacionado, o custo estrutural do capital no Brasil continuará elevado.
Risco fiscal de 2027 é macroeconômico
Questionado pelo ceo da Nelogica, Marcos Boschetti, que conduziu o painel, sobre a existência de uma “bomba fiscal” contratada para 2027, Mansueto relativizou o termo. Segundo ele, o cenário atual é distinto daquele observado no período que antecedeu a recessão de 2015 e 2016.
Naquele momento, o Brasil enfrentava uma crise setorial profunda, com a Petrobras excessivamente endividada, problemas graves no setor elétrico e deterioração do mercado imobiliário. “Hoje, esses setores estão muito mais organizados e sólidos”, afirmou.
O risco atual, segundo o economista, é essencialmente macrofiscal. Ele destacou que a dívida bruta cresceu cerca de 10 pontos percentuais do PIB em apenas quatro anos, concentrando-se no atual ciclo fiscal, e deve encerrar o período do governo Lula 3 entre 81% e 82% do PIB.
Reforma do gasto é condição para estabilizar dívida e juros
Mansueto afirmou que o ajuste das contas públicas exigirá uma reforma estrutural do lado das despesas, com foco na desaceleração do crescimento do gasto obrigatório. Para ele, não se trata apenas de cortes pontuais, mas de mudar a dinâmica automática de expansão do gasto público.
O economista lembrou que o gasto total do governo gira em torno de R$ 2,4 trilhões, enquanto o investimento público permanece limitado, próximo de R$ 70 bilhões. Grande parte do Orçamento é indexada, o que reduz significativamente a margem de manobra para ajustes via despesas discricionárias.
Revisão dos benefícios sociais é peça-chave para o Brasil crescer
Ao comentar a política social, Mansueto avaliou que a expansão acelerada dos gastos acaba prejudicando justamente a população mais vulnerável. Programas de transferência de renda se tornaram significativamente mais caros, sem garantia proporcional de maior eficiência ou melhor focalização.
O custo do Bolsa Família passou de cerca de R$ 40 bilhões no passado para aproximadamente R$ 160 bilhões, atendendo cerca de 20 milhões de famílias. Para o economista, será necessário rever critérios e redesenhar benefícios sociais, preservando o impacto social, mas garantindo sustentabilidade fiscal.
Segundo ele, a trajetória atual pressiona a dívida pública, mantém os juros elevados e limita o crescimento econômico, com efeitos negativos sobre emprego e renda no médio prazo.
Cenário interno será determinante para o câmbio em 2026
Para 2026, Mansueto afirmou que o comportamento do dólar dependerá menos do cenário externo e mais da condução da política fiscal no Brasil. O diferencial de juros ainda elevado e o ciclo de cortes nos Estados Unidos ajudam a reduzir a volatilidade cambial, mas não são suficientes para garantir um câmbio estruturalmente mais benigno.
Sem uma agenda fiscal clara e crível, o real tende a se desvalorizar. Por outro lado, um governo a partir de 2027 que sinalize compromisso com o controle e a desaceleração do gasto público tende a favorecer maior estabilidade cambial.
Sem dever de casa, o crescimento não vem
Na avaliação de Mansueto, o dever de casa do Brasil é conhecido: apresentar um plano crível de controle do gasto público, reformar regras de despesas obrigatórias, rever critérios de benefícios sociais e avançar em reformas microeconômicas que aumentem a produtividade e a previsibilidade regulatória.
Sem essas mudanças, o crescimento potencial do país seguirá limitado e o custo de capital continuará elevado.
Envelhecimento da população pressiona o crescimento econômico
Por fim, o economista chamou atenção para a transição demográfica como um dos principais desafios do médio e longo prazo. A partir de 2040, a população brasileira deve começar a cair, reduzindo o impulso natural do crescimento econômico.
Com uma força de trabalho menor, o Brasil dependerá cada vez mais de ganhos de produtividade. “O bônus demográfico acabou. Daqui para frente, o país só cresce se conseguir produzir mais e melhor”, afirmou.












