O volume de crédito destinado à indústria de transformação despencou ao longo da última década e acende um alerta sobre investimento e competitividade. De 2012 a 2024, a queda chega a 40%, segundo a Nota Econômica da CNI, com reflexos diretos na capacidade de ampliar a produção e incorporar tecnologia. Além disso, a participação da indústria no total de operações da economia encolheu de 27,2% para 13,7%, o que evidencia uma mudança estrutural na destinação do financiamento.
O movimento não decorre de retração do crédito agregado e sim de sua redistribuição no sistema financeiro. Nesse sentido, as carteiras para pessoas físicas avançaram com vigor enquanto o crédito para empresas ficou praticamente estagnado e o industrial cedeu. Por outro lado, a compressão de linhas de médio e longo prazos limita projetos com maturação mais lenta e dificulta a modernização do chão de fábrica.
Quais setores ganharam espaço e quais perderam?
O redirecionamento do crédito favoreceu o consumo das famílias e alguns ramos específicos da economia. Enquanto isso, a indústria de transformação e segmentos intensivos em capital perderam tração. A leitura dos dados mostra que serviços e administração pública ampliaram a fatia de financiamento ao passo que atividades industriais recuaram em termos reais. Além disso, a maior parcela do crédito passou a se concentrar em prazos curtos, o que reforça o foco em capital de giro.
Veja os outros setores
- Administração pública com alta de 118%;
- Pessoas físicas com avanço de 97%;
- Serviços financeiros com expansão de 49%;
- Agropecuária com crescimento de 38%;
- Eletricidade gás água e utilidades com alta de 20%;
- Outros serviços com aumento de 20%;
- Transporte e armazenagem com elevação de 6%;
- Comércio com crescimento de 3%;
- Total de pessoa jurídica com recuo de 4%;
- Indústria da construção com queda de 29%;
- Indústria extrativa com retração de 38%;
- Indústria de transformação com recuo de 40%;
O presidente da CNI, Ricardo Alban, diz que a retração do crédito à indústria é um sinal preocupante e revela um desequilíbrio estrutural na economia. “O crédito para a indústria tem um efeito multiplicador ímpar sobre os demais setores produtivos e é fundamental para o crescimento consistente do país. O sistema financeiro tem priorizado o consumo em detrimento da produção, comprometendo investimento, inovação e competitividade. Não bastasse isso, as taxas de juros elevadas e a escassez de crédito de longo prazo limitam a modernização do chão de fábrica e ampliam a dependência de importações. É urgente criar condições de financiamento mais adequadas para sustentar o crescimento produtivo do país”, afirma o presidente da CNI, Ricardo Alban.
O crédito de longo prazo está desaparecendo
A estrutura de financiamento ficou mais curta e mais cara para projetos industriais. Além disso, a análise por prazo mostra que o encurtamento é proporcionalmente maior quanto mais longo é o contrato. Enquanto isso, o curto prazo passou a ocupar parcela dominante do total destinado à indústria, o que é incompatível com investimentos em máquinas, P amp D e transição tecnológica.
- Crédito de curto prazo com queda de 33%;
- Crédito de médio prazo com retração de 55%;
- Crédito de longo prazo com redução de 64%
- Fatia do curto prazo na indústria com avanço de 73% em 2012, para 82% em 2024
Nesse sentido, o ambiente de financiamento prioriza liquidez imediata e posterga decisões estruturantes. Por outro lado, empresas que precisam de previsibilidade para investir acabam reduzindo escopo de projetos ou substituindo produção nacional por importações de bens de capital e insumos críticos.
O estudo lembra que até 2014 o crédito à indústria era igual ao de 2012. A partir da crise de 2015-2016, houve forte queda, impulsionada pelo encolhimento do setor e pelos juros elevados. Em 2017, o crédito já havia caído 34% em relação a 2012. Em 2020, durante a pandemia, houve um aumento no crédito de curto prazo à indústria, sustentado por juros baixos e pela necessidade de caixa imediato das empresas diante da paralisação das atividades. Passado esse período, a trajetória de queda foi retomada.
A redução do crédito afeta diretamente a indústria de transformação, mas também impacta toda a economia brasileira. Sem investimento suficiente, a produção não avança no mesmo ritmo do consumo. Isso fragiliza a balança comercial, aumenta a dependência de importações e compromete o crescimento de longo prazo.