A decisão do Tribunal de Comércio dos Estados Unidos que suspendeu temporariamente tarifas impostas durante o governo Trump representa mais do que um revés técnico. Segundo o mestre em economia Roberto Dumas, trata-se de um golpe relevante na retórica do presidente, que utilizava a política tarifária como símbolo de força nas negociações comerciais, especialmente com a China.
Em entrevista à BM&C News, Dumas avaliou que a medida reduz o ímpeto de Donald Trump como negociador e revela a necessidade de uma abordagem mais pragmática e responsável. “Essa ideia de blefar com tarifas de 200% acabou se tornando uma caricatura. O que se espera agora é que adultos voltem à mesa e tratem o comércio internacional com seriedade”, afirmou.
Disputa jurídica será longa, mas afeta discurso de Trump
Apesar da suspensão inicial, Dumas acredita que o processo ainda terá muitos desdobramentos. “Essa disputa vai se arrastar. Enquanto isso, Trump continuará pressionando por tarifas, mas agora com mais cautela”, explicou. Ele ressaltou que, embora a decisão final ainda dependa da Suprema Corte, o desgaste político já está em curso.
A crítica de Dumas se estende à própria forma como Trump articula sua retórica. “Ele fala de emergência nacional, mas o que temos é um desequilíbrio fiscal. Isso não justifica tarifa de 145%. Isso não é mais tarifa, é embargo”, declarou.
Retórica exagerada de Trump prejudica credibilidade dos EUA
Dumas também apontou que a escalada tarifária protagonizada por Trump deteriorou o ambiente de diálogo. “A China já deixou claro que não vai aceitar esse jogo de blefar. Se for para falar em 300%, 400%, não há mais negociação. Isso perde o sentido e a credibilidade”, afirmou Dumas.
Segundo ele, a política de Trump segue o caminho errado ao tentar resolver os déficits externos com barreiras comerciais. “Esse erro já foi cometido nos anos 1930 com o Smoot-Hawley Act. A solução não está nas tarifas, mas no controle dos gastos públicos. Os Estados Unidos gastam demais e acumulam déficits porque insistem nessa lógica.”
Dumas comparou a postura atual com episódios históricos, como os déficits gêmeos da era Reagan e o desequilíbrio nas contas públicas observado em administrações anteriores. “Você corta imposto, aumenta gasto e depois tenta resolver com tarifa. Isso só piora o déficit em conta corrente. É uma identidade macroeconômica básica.”
Para ele, Trump adota um discurso populista que ignora os fundamentos econômicos. “Ele pode ter ganhado bilhões, mas isso não o qualifica como economista. Jogadores de futebol também ganham milhões e não necessariamente sabem administrar uma economia”, ironizou.
Caminho mais sensato exige negociação técnica
Ao final, Dumas reforçou que a suspensão das tarifas deve servir como um alerta. “É hora de abandonar o personagem de reality show e conduzir as relações comerciais com técnica e racionalidade. Senão, os próprios tribunais continuarão minando a credibilidade da política externa americana.”