A Receita Federal, em conjunto com órgãos parceiros, deflagrou nesta quinta-feira(28), a “Operação Carbono Oculto”, considerada a maior ação contra o crime organizado na história do Brasil em termos de cooperação institucional. A investigação mira fraudes sofisticadas em toda a cadeia de combustíveis, desde a importação e produção até a comercialização e ocultação de recursos ilícitos.
O esquema envolve sonegação fiscal, adulteração de combustíveis, lavagem de dinheiro e blindagem patrimonial. Além disso, as autoridades identificaram a participação de empresas de fachada, fintechs e fundos de investimento, utilizados como instrumentos para dificultar a rastreabilidade dos recursos e proteger o patrimônio dos criminosos.
Como a operação contra o crime organizado foi estruturada?
Estão sendo cumpridos 350 mandados de busca e apreensão em oito estados: São Paulo, Espírito Santo, Paraná, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás, Rio de Janeiro e Santa Catarina. Além disso, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) solicitou o bloqueio judicial de mais de R$ 1 bilhão em bens dos investigados, incluindo imóveis, veículos e participações societárias.
Participam da operação cerca de 350 servidores da Receita Federal, Polícia Federal, Ministério Público Federal, Ministério Público de São Paulo (por meio do Gaeco), Polícias Civil e Militar, ANP, Sefaz/SP e PGE/SP. Essa atuação coordenada evidencia a complexidade do esquema, que envolvia múltiplos elos e níveis hierárquicos, desde formuladoras e distribuidoras até fundos de investimento.
Quais fraudes foram identificadas na cadeia de combustíveis?
As investigações revelaram práticas criminosas em diferentes fases do setor:
- Importação de nafta, diesel e hidrocarbonetos, utilizando empresas de fachada entre 2020 e 2024, somando mais de R$ 10 bilhões em combustíveis;
- Formuladoras e distribuidoras que sonegavam tributos e adulteravam produtos, impactando consumidores e arrecadação;
- Postos de combustíveis que movimentavam R$ 52 bilhões em dinheiro de forma irregular, com recolhimento de tributos muito abaixo do esperado;
- Postos que receberam mais de R$ 2 bilhões em notas fiscais simuladas, sem movimentação efetiva, para ocultar transferências ilícitas.
Como funcionava a lavagem de dinheiro do crime organizado?

A lavagem de dinheiro ocorria em múltiplas camadas. Os recursos obtidos de forma ilícita eram inseridos no sistema financeiro através de fintechs, que atuavam como “bancos paralelos” da organização criminosa. Entre 2020 e 2024, uma única fintech movimentou R$ 46 bilhões, incluindo 10,9 mil depósitos em espécie entre 2022 e 2023, totalizando R$ 61 milhões.
Além disso, essas fintechs permitiam:
- Transferência de dinheiro entre postos, distribuidoras e fundos de investimento sem segregação de contas;
- Pagamentos a colaboradores, fornecedores e despesas pessoais dos líderes do esquema;
- Ocultação das transações, dificultando o rastreamento por órgãos de fiscalização.
O que significa ocultação e como ela era aplicada?
Ocultação refere-se à prática de esconder a origem ilícita dos recursos. Nesse esquema, a organização utilizava:
- Empresas de fachada e contas-bolsão em bancos comerciais, concentrando recursos de múltiplos clientes;
- Operações com notas fiscais frias e movimentações inexistentes em postos de combustíveis;
- Fundos de investimento multilayer, com patrimônio estimado em R$ 30 bilhões, usados para reinvestir e mascarar a origem dos valores.
Essas camadas de ocultação dificultavam a identificação do beneficiário final e protegiam os criminosos da atuação direta da fiscalização.

Como funcionava a blindagem patrimonial?
Blindagem patrimonial consiste em proteger os bens contra apreensões judiciais. No caso da operação, os criminosos utilizaram:
- Fundos fechados com único cotista, geralmente outro fundo da organização;
- Investimentos em imóveis, fazendas, terminais portuários, usinas de álcool e veículos;
- Estruturas jurídicas complexas que dificultavam a rastreabilidade dos ativos.
Entre os bens identificados estão 1.600 caminhões, seis fazendas avaliadas em R$ 31 milhões e uma residência em Trancoso/BA adquirida por R$ 13 milhões. Esses fundos e propriedades criavam um mercado de blindagem que dava aparência de legalidade aos recursos ilícitos.
Qual o impacto da operação na economia e na sociedade?
Além de responsabilizar os envolvidos, a operação busca fortalecer o mercado, proteger a arrecadação fiscal e garantir a segurança do consumidor final. As medidas desarticulam o núcleo financeiro do crime organizado, mostrando que práticas complexas de lavagem, ocultação e blindagem patrimonial podem ser combatidas com inteligência fiscal e coordenação institucional.
Enquanto isso, os bloqueios de bens e a responsabilização judicial enviam um sinal claro: irregularidades sofisticadas não ficarão impunes. A expectativa é que a ação gere mudanças estruturais na fiscalização do setor e coíba práticas semelhantes, promovendo um ambiente econômico mais transparente e seguro.