Em um cenário de tensões geopolíticas e disputas comerciais crescentes, especialistas se reuniram no Painel BM&C para analisar como a nova ordem global afeta economias emergentes, especialmente a brasileira. O debate contou com a participação de Roberto Dumas, mestre em economia, Marcus Vinícius de Freitas, professor de relações internacionais e Luiz Fernando Roxo, economista.
O ponto de partida foi a percepção de que, embora as grandes potências aparentem jogar o mesmo jogo, cada uma segue suas próprias regras. Nesse contexto, o crescimento desacelerado da China, o endividamento dos Estados Unidos e o marasmo econômico da Europa serviram de pano de fundo para discutir estratégias e riscos, com o Brasil figurando como ator vulnerável e, muitas vezes, reativo diante dos acontecimentos.
Trump está ganhando este jogo das tensões geopolíticas?
Questionado sobre quem estaria vencendo no atual tabuleiro das tensões geopolíticas, Luiz Fernando Roxo foi direto. “Donald Trump está ganhando”. Para ele, o republicano cumpriu o que prometeu, usando tarifas como arma econômica. Já Roberto Dumas ponderou que “achar que tarifas são o caminho para corrigir déficits externos é um erro estratégico”, defendendo que o ajuste exige aumento de poupança e austeridade.
Marcus Vinícius discordou completamente, afirmando que Trump “desconstruiu em pouco tempo uma ordem internacional de comércio que beneficiava os próprios Estados Unidos” e que sua estratégia se baseia em blefes e pressão, o que pode gerar riscos duradouros para a estabilidade global.
- Roxo afirma que Trump está ganhando;
- Dumas alerta que a solução para déficit não é impor tarifas, requer poupança e austeridade;
- Marcus Vinícius vê riscos estratégicos na política comercial de Trump
Qual o papel da China nesse cenário?
As divergências sobre a China foram marcantes no painel. Marcus Vinícius destacou que o país investe com visão de longo prazo, sendo um dos maiores defensores do multilateralismo. “Mais de 50% das pesquisas em inteligência artificial já são conduzidas na China”, afirmou, lembrando que Pequim não pretende perder a liderança na quarta revolução industrial.
Dumas, no entanto, ressaltou práticas chinesas que distorcem a concorrência, como repressão financeira, câmbio administrado e subsídios estratégicos. Ambos concordaram que entender a estrutura política e econômica chinesa é essencial para avaliar seus movimentos.
Brasil entre tensões geopolíticas: qual estratégia seguir?
O comércio agrícola foi outro ponto de atenção. Dumas lembrou que, no primeiro mandato de Trump, a China reduziu compras dos EUA e aumentou as do Brasil, especialmente de soja. Porém, novas negociações entre Washington e Pequim podem reduzir essa vantagem brasileira. “Quanto mais demoramos para fechar acordos, mais as oportunidades desaparecem”, alertou.
- China e EUA podem “leiloar” o Brasil em disputas comerciais
- Brasil vende commodities de baixa margem para a China e produtos de maior valor agregado para os EUA
- Estados Unidos são o maior investidor estrangeiro no Brasil
A disputa tecnológica muda as regras do jogo?
O painel também tratou da guerra tecnológica, citando restrições chinesas à compra de chips e a atuação de empresas como a Nvidia. Marcus Vinícius destacou que “a China forma um milhão de engenheiros por ano” e já inclui inteligência artificial no ensino infantil. Roxo alertou para riscos de segurança, defendendo que consumidores verifiquem a procedência tecnológica dos produtos que compram.
Dumas fez um alerta adicional: setores como carne bovina e café podem enfrentar barreiras semelhantes às tecnológicas se o Brasil não ampliar sua base de clientes. “Não podemos depender de um único país para nossas exportações”, reforçou.
Questão ideológica ou pragmatismo comercial?
A postura do Brasil no BRICS também entrou em pauta. Dumas criticou a politização de fóruns econômicos e elogiou a postura pragmática de China e Rússia na diversificação de reservas internacionais. “Não precisa anunciar que vai abandonar o dólar, basta diversificar”, afirmou. Marcus Vinícius defendeu que o país deve “pegar a pasta e viajar” para ampliar mercados e reduzir vulnerabilidades.
Nas considerações finais, Roxo destacou que investidores precisam entender como as tensões geopolíticas influenciam portfólios, defendendo o aprendizado constante. Dumas valorizou a pluralidade de opiniões e Marcus Vinícius reforçou que “o BRICS não é ideológico, é comércio. Está na hora de o Brasil vender sua imagem e não ficar à mercê das decisões alheias”.