A primeira sexta-feira do mês, tradicionalmente marcada pela divulgação do payroll, foi diferente desta vez. O relatório de emprego dos Estados Unidos, considerado a principal referência sobre a situação do mercado de trabalho e também principal ponto observado pelo Fed, não foi publicado em função do prolongamento do shutdown do governo. A paralisação das agências federais amplia a incerteza sobre os rumos da economia americana e coloca o Federal Reserve em uma posição delicada.
Além do impacto imediato, a suspensão da coleta e da divulgação de dados compromete a avaliação da política monetária. Sem informações oficiais, aumenta o risco de decisões baseadas em relatórios parciais e indicadores privados, que não possuem a mesma abrangência. Esse cenário ocorre em meio a aproximação da próxima reunião do Fed, marcada para 28 e 29 de outubro, quando o debate sobre cortes de juros deve se intensificar.
Por que a ausência do payroll preocupa tanto?
O payroll é essencial porque mede a criação de vagas de trabalho, a taxa de desemprego e a evolução dos salários. Esses dados são fundamentais para calibrar a leitura do consumo e da inflação, elementos centrais na tomada de decisão da política de juros nos EUA. Sem essa referência, cresce a incerteza sobre o grau de desaquecimento do mercado de trabalho.
A economista Andressa Durão, do ASA, destacou que a expectativa já era de que o Bureau of Labor Statistics não conseguisse publicar o relatório. Segundo ela, o problema não se limita ao payroll, mas pode afetar também outros dados. “Se o shutdown se prolongar, o atraso pode comprometer também a divulgação do CPI e afetar a coleta das pesquisas de outubro, reduzindo a qualidade dos dados”. Nesse sentido, a ausência de informações confiáveis pode distorcer a leitura do ciclo econômico e ampliar a volatilidade nos mercados.
O especialista em análise macro Fabio Fares destacou que a falta de informações deixa o mercado “como um piloto de avião que precisa pousar na neblina sem instrumentos”. Nesse contexto, a autoridade monetária pode ter que decidir entre cortes de 25 ou até 50 pontos-base na taxa de juros sem clareza sobre o desempenho real da economia.
Quais os riscos para o Federal Reserve?
O Fed enfrenta um impasse. De um lado, parte dos dirigentes considera que o mercado de trabalho perdeu fôlego e defende cortes de juros mais rápidos. De outro, há quem acredite que a inflação segue pressionada, exigindo prudência. A falta do payroll aprofunda essa divisão, pois elimina a principal evidência objetiva para sustentar cada uma dessas teses.
Com isso, a autoridade monetária pode se apoiar em dados alternativos, como relatórios privados de emprego ou pesquisas conduzidas por entidades setoriais. No entanto, especialistas alertam que esses números não têm a mesma precisão e abrangência dos dados oficiais, o que pode aumentar o risco de diagnósticos equivocados.
O que os investidores devem acompanhar?
Sem o payroll, o mercado financeiro opera em um terreno mais instável. A ausência do relatório não apenas adia a leitura sobre setembro, mas também pode comprometer a qualidade dos dados de outubro. Isso significa que até o fim do mês, os investidores terão de lidar com informações parciais e discursos dos dirigentes do Fed como guias principais.
A ausência do payroll reforça como fatores políticos podem influenciar diretamente a economia global. Enquanto não houver consenso em Washington, a incerteza persiste e os mercados permanecem atentos aos próximos sinais do Federal Reserve.