A Section 899, dispositivo incluído no orçamento dos Estados Unidos aprovado pela Câmara dos Deputados, pode abrir uma nova frente de disputa fiscal internacional. Conhecida como “Revenge Tax”, a proposta autoriza a tributação de rendimentos de estrangeiros nos EUA e pode afetar diretamente os investimentos mercado americano, além das reservas internacionais do Banco Central. O texto faz parte do pacote fiscal batizado de “One Big Beautiful Bill Act”, que agora tramita no Senado com expectativa de aprovação até 4 de julho.
A medida marca o fim de uma isenção histórica sobre aplicações em renda fixa nos EUA — regra que está em vigor desde o governo Ronald Reagan. Com isso, remessas de lucros, rendimentos e investimentos estrangeiros podem ser tributadas a uma alíquota de 3,5%, atingindo governos, empresas e pessoas físicas.
No Brasil, os impactos podem ser significativos, já que a medida atinge diretamente os títulos públicos americanos comprados pelo Banco Central como parte das reservas internacionais. Também afeta investidores individuais que aplicam em renda fixa nos Estados Unidos.
Tributação retaliatória: o que diz a Section 899
O foco do novo imposto está na chamada Section 899, que dá respaldo legal para que os EUA passem a tributar países que adotaram medidas consideradas discriminatórias contra empresas americanas. A justificativa é retaliar governos que cobram impostos sobre o faturamento das Big Techs — como Google, Amazon, Apple, Meta e Microsoft — em seus territórios.
Essas medidas, conhecidas como Digital Service Taxes (DST), foram implementadas em várias nações europeias e fazem parte de um esforço global coordenado pela OCDE para equilibrar a tributação no setor digital. Os EUA, porém, veem essas iniciativas como ataques às suas empresas e agora reagem com o novo mecanismo tributário.
Mercado financeiro reage com preocupação à Section 899
Nos bastidores, grandes bancos americanos já se mobilizam para tentar derrubar ou ao menos ajustar a Section 899. Para o especialista em análise macro Fábio Fares, a chamada Section 899 é mais um episódio da velha disputa por soberania fiscal entre grandes potências. “Os Estados Unidos estão usando a ameaça tributária como forma de coagir países a recuarem na taxação de suas Big Techs. É um protecionismo disfarçado de defesa da justiça tributária. Mas, ao criar esse precedente, os EUA também arriscam romper pontes com aliados e fragmentar mercados de capitais que hoje favorecem sua liderança global”, avalia Fares.
Para ele, se o projeto for implementado nos moldes atuais, poderá desencadear uma guerra tributária com efeitos colaterais significativos – incluindo realocação de sedes corporativas, fuga de fundos soberanos europeus e enfraquecimento do dólar. “É um movimento de força que pode sair caro. Para o investidor atento, esse cenário abre uma janela de oportunidade em ativos europeus que tendem a ser penalizados pelo medo, mas não pelos fundamentos.”