Quatro reflexões podem ser feitas sobre a confusão que se seguiu à prisão de quatro militares e um agente da Polícia Federal, acusados de orquestrar um plano para assassinar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o vice Geraldo Alckmin e o ministro do Supremo Tribunal Federal, Alexandre de Moraes. O plano, liderado pelo general reformado Mário Fernandes (imagem), não foi executado pela falta de adesão das Forças Armadas e os cinco conspiradores ficaram a ver navios.
A primeira reflexão que se deve fazer é sobre o papel do ex-presidente Jair Bolsonaro na trama. Ele seria o principal beneficiado pela trama e seu candidato a vice, Braga Netto, foi o anfitrião de um encontro dos conspiradores – e, por isso, estaria por dentro do que o general Fernandes estava orquestrando.
Mas uma parte importante do complô seria a assinatura, por parte de Bolsonaro, de um decreto que desse condições para que as Forças Armadas interferissem na ordem democrática e não permitissem a posse de Lula. Existem suspeitas de que o ex-mandatário sabia das articulações. Porém, ele não assinou a chamada minuta do golpe – e isso foi uma grande derrota para o complô para assassinar o presidente eleito, além de Alckmin e de Moraes.
A segunda reflexão que precisamos fazer é derivada da primeira. Aparentemente, o plano não estava restrito aos cinco presos. Pelas mensagens do ajudante de ordens de Bolsonaro, Mauro Cid, há mais envolvidos na trama.
“Boa tarde, General! Só para atualizar o senhor que vem acontecendo é o seguinte. O presidente tem recebido várias pressões para tomar uma medida mais, mais pesada onde ele vai, obviamente, utilizando as forças, né? Mas ele sabe, ele ainda continua com aquela ideia que ele saiu da última reunião, mas a pressão que ele recebe é de todo mundo. Ele está … É cara do agro. São alguns deputados, né? É né … Então é a pressão que ele tem recebido é muito grande”, escreveu Cid a Fernandes.
Ou seja, havia, segundo o tenente-coronel, um grupo abrangente de pessoas, do universo político ou não, que pressionava Bolsonaro para jogar fora das quatro linhas da Constituição – e isso o ex-presidente não fez.
Temos também que pensar sobre o que disse o senador Flavio Bolsonaro logo após a operação da PF, dizendo que pensar em matar não é crime. De fato, muitos juristas dizem que o ato preparatório para a realização de um crime não é passível de punição aqui no Brasil. Mas a discussão talvez transcenda a lei: um grupo planejou a morte de um presidente, um vice e de um ministro do STF, mas desistiram na última hora. Eles não merecem nenhuma punição?
O senador Bolsonaro sabe que esse tipo de ato é errado. Tanto é que fez um projeto de lei para punir qualquer ação neste sentido. Usar o fato de que a legislação ainda não foi aprovada não seria forçar a barra para livrar a cara dos envolvidos? Lembrando que o general preso foi secretário executivo da Secretaria Geral da Presidência da República na gestão de Jair Bolsonaro.
Por fim, precisamos refletir sobre as verdadeiras razões pelas quais o grupo liderado por Fernandes quis acabar com a vida de três autoridades. A primeira é inequívoca: uma rejeição tão forte ao esquerdismo que motivou o planejamento do assassinato de três seres humanos. Mas esses golpistas falavam em patriotismo ao justificar suas intenções extremistas.
Alguns militares, especialmente aqueles que defendem o legalismo, discordam. Eles acham que os quatro integrantes das Forças Armadas envolvidas no complô não queriam perder o acesso ao poder e as benesses obtidas por cargos de chefia. Um deles chegou a dizer o seguinte, em um grupo de WhastApp: “É difícil encontrar patriotismo pro bono”.
Aluizio Falcão Filho foi diretor de redação da revista Época e diretor editorial da Editora Globo, com passagens por veículos como Veja, Gazeta Mercantil, Forbes e a vice-presidência no Brasil da agência de publicidade Grey Worldwide
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