Um Estado pesado, um orçamento apontado como otimista e uma dívida pública que segue em trajetória ascendente foram os pontos de partida do Painel BM&C, apresentado por Paula Moraes e os comentários de Bruno Musa, Roberto Dumas e Celson Plácido. Ao avaliar o cenário fiscal e a dinâmica de juros, os convidados destacaram que o foco do mercado tem migrado do resultado primário para a relação dívida/PIB. Nesse sentido, o debate trouxe números, diagnósticos e implicações práticas para investimento, câmbio e crescimento no Brasil.
Além disso, os especialistas questionaram a consistência das premissas orçamentárias para 2026 diante de um ambiente de câmbio pressionado, consumo mais fraco e Formação Bruta de Capital Fixo em queda. Por outro lado, reconheceram que a bolsa tem andado em meio à expectativa de mudança adiante, mas alertaram que a confiança do setor produtivo segue baixa. Enquanto isso, o pano de fundo fiscal e a política monetária desarmonizada mantêm a curva de juros elevada e o prêmio de risco sensível a choques.
Orçamento do Brasil: peça técnica ou narrativa política?
Na avaliação de Bruno Musa, a divergência entre o superávit proposto e as projeções independentes sinaliza um orçamento de ficção. “Mesmo com exceção dos precatórios, o resultado primário embutido já indicaria déficit, e que o mercado passou a observar principalmente a trajetória da dívida“, lembrou. “Os números falam por si”, disse, ao citar estimativas alternativas com déficits maiores e despesas parafiscais fora do orçamento que elevam a dívida.
Roberto Dumas reforçou a preocupação com a dinâmica da dívida ao lembrar a identidade conhecida: custo real de carregamento menos crescimento menos superávit primário. Para ele, com dívida próxima de 80% do PIB, o problema central é de credibilidade fiscal e não de taxa de juros em si. “A taxa de juro é o termômetro, não o vilão”, afirmou, destacando que a precificação de longo prazo reflete a percepção sobre o gasto público e a qualidade do ajuste.
Juros altos por mais tempo: qual o custo para quem investe no Brasil?
Celson Plácido trouxe a ótica do empresário: com retorno de negócio estimado em 4% a 5% ao ano e aplicação financeira nominal em torno de 15%, o incentivo ao investimento produtivo fica comprometido. Nesse sentido, a taxa de juros real elevada e persistente desloca o capital para renda fixa, reduz apetite por risco e exige retornos muito superiores para justificar projetos. A consequência é menos FBCF, menos produtividade e crescimento potencial travado.
Além disso, os convidados apontaram uma fricção estrutural: políticas de crédito subsidiado em grande escala ampliam a potência inflacionária e pressionam a política monetária, exigindo juros mais altos para todo o restante da economia. Por outro lado, a manutenção de subsídios e desonerações fragmentadas enfraquece o resultado fiscal e retroalimenta o círculo de juros altos e investimento fraco.
Por que a bolsa subiu se o fiscal preocupa?
O painel observou que, apesar do quadro interno desafiador, a bolsa tem respondido a fatores externos, à perspectiva de cortes de juros nos EUA e à leitura de que 2026 pode abrir espaço para uma agenda mais reformista. Enquanto isso, o câmbio permanece mais comportado do que a inércia fiscal sugeriria, em parte explicado por variáveis globais e fluxos pontuais. Ainda assim, os analistas foram claros: em um cenário doméstico melhor, o real poderia estar mais valorizado.
Ao analisar o tarifário norte-americano e a confiança das indústrias exportadoras, Celson Plácido ressaltou que o primeiro efeito é de incerteza, com ajustes abruptos de embarques e margens, e que respostas paliativas via subsídios costumam distorcer preços e adiar reformas. Nesse sentido, a perda de previsibilidade derruba a confiança e congela decisões de investimento, sobretudo em cadeias com logística complexa e prazos longos.
Mercado é vilão ou vítima? Segurança pública e governança regulatória em pauta
Parte importante do debate girou em torno da narrativa que associa “mercado” a problemas criminais. Os participantes defenderam separar instrumentos de intermediação financeira de atos ilícitos, reforçando que lavagem de dinheiro deve ser combatida com governança, supervisão e eficiência do Estado. “Não é o carro que atropela, é a pessoa”, sintetizou Dumas, para ilustrar que o instrumento não deve ser confundido com o ilícito praticado por agentes específicos.
Para além do curto prazo, os convidados convergiram na necessidade de uma âncora fiscal crível, menos crédito subsidiado, melhor alocação do gasto e foco em produtividade e educação. Por outro lado, destacaram que a população começa a internalizar os custos de políticas expansionistas e subsídios setoriais, o que pode abrir espaço político para reformas. Enquanto isso, 2026 tende a ser longo, com a dívida exigindo respostas antes que o espaço orçamentário se reduza ainda mais.
Quais são os sinais de alerta e as prioridades?
- Trajetória da dívida/PIB: foco do mercado, com sensibilidade a crescimento e juros reais.
- Confiança e FBCF: queda na Formação Bruta de Capital Fixo e confiança baixa travam o ciclo de investimento.
- Curva de juros: prêmio elevado reflete fiscal fragilizado e custo de capital alto.
- Governança e fiscalização: combate a ilícitos com supervisão efetiva, sem demonizar o sistema financeiro.
- Produtividade e educação: agenda de longo prazo para elevar crescimento potencial no Brasil.
Em síntese, o Painel BM&C indica que a saída passa por um pacote coerente: recompor credibilidade fiscal, alinhar a política monetária a um ambiente de menor subsídio e maior previsibilidade, e destravar investimento com segurança jurídica e produtividade. Nesse sentido, reduzir a incerteza e reforçar a âncora fiscal são pré-condições para encurtar a duração dos juros altos, reequilibrar a curva e reabrir espaço para o capital produtivo no Brasil.
















