O programa Money Report, exibido na BM&C News, discutiu os desafios e oportunidades das empresas familiares em um ambiente de transformação tecnológica, mudanças demográficas e aumento da longevidade. Mediado por Aluizio Falcão, o debate reuniu Paulo Braga Filho, CEO da DAXX; Joseph Meyer Nigri, fundador da Naara Longevity Residences; e Conrado Comolatti Ruivo, CEO do Grupo Comolatti.
Ao longo da conversa, sucessão em empresas familiares, novos modelos de negócio para a terceira idade e o uso intensivo de dados e inteligência artificial apareceram como temas centrais para garantir competitividade e perpetuação dos negócios.
Sucessão e controle nas empresas familiares
Conrado Ruivo relatou o processo de transição de comando no Grupo Comolatti, empresa familiar fundada por seu avô, Evaristo, e que hoje atua em autopeças, food service, concessionárias e o tradicional restaurante Terraço Itália, em São Paulo.
Depois de mais de 20 anos na operação sob o comando do tio, Sérgio, Conrado recebeu o convite para assumir a liderança, com uma condição clara: não apenas comandar, mas também comprar parte das ações.
Segundo ele, a decisão foi rápida, mas exigiu reflexão em família. “É o que a gente sabe fazer. A gente tem uma história muito bacana. Eu por mim continuo investindo no nosso setor, que é o que a gente conhece”, contou. A saída encontrada foi um arranjo em que ele assumiu o controle, mantendo o tio como sócio relevante e conselheiro ativo.
Conrado destacou que a convivência entre gerações segue positiva e funcional: ter um ex-presidente experiente ao lado ajuda na tomada de decisões estratégicas e preserva a cultura da empresa familiar.
Sair da empresa familiar, ganhar maturidade e voltar
A trajetória de Paulo Braga Filho também ilustra um movimento comum em empresas familiares: a saída temporária para buscar experiência no mercado e o retorno em posição de maior autonomia.
Ele contou que deixou o ambiente familiar para crescer como executivo, melhorar renda e testar suas competências em outros mercados. “A família te dá segurança, mas no meu caso me limitava crescimento”, explicou. Após cerca de 10 a 12 anos em grandes empresas, voltou para o grupo com outra visão de gestão e mais maturidade.
De volta aos negócios da família, Paulo disse ter encontrado algo que faltava no mundo corporativo tradicional: liberdade para empreender. A partir daí, ajudou a criar três novas empresas em cerca de dez anos, ampliando o alcance do grupo.
Ao falar da DAXX, focada em mídia e tecnologia, ele ressaltou uma agenda intensa de ultrapersonalização e uso de dados para atender melhor cada cliente, um movimento que aproxima empresas familiares de práticas típicas de grandes grupos de tecnologia.
Longevidade cria novos mercados e pressiona modelos tradicionais
Joseph Meyer Nigri, que teve a carreira construída na tradicional Tecnisa, contou como decidiu deixar a empresa familiar para apostar em um nicho pouco explorado no Brasil: residências voltadas à longevidade.
Ele disse que há mais de dez anos estuda o aumento da expectativa de vida e o impacto do envelhecimento da população. Ao comparar o Brasil com mercados como Estados Unidos, Europa e Japão, identificou uma lacuna: enquanto lá existem grandes empresas listadas em bolsa focadas na terceira idade, em São Paulo praticamente não havia empreendimentos desenhados para esse público.
A inquietação ganhou contorno pessoal quando ele percebeu a realidade de idosos da própria família: morando sozinhos em apartamentos grandes, caros, de difícil manutenção e com rotina marcada por inatividade e solidão. Daí nasceu a Naara Longevity Residences, um condomínio residencial pensado para pessoas 75+ que precisam de estrutura adequada, serviços de saúde, atividades físicas e estímulo cognitivo, sem o caráter de “asilo” ou instituição fechada.
Joseph detalhou que o foco inicial está nas classes A e B da cidade de São Paulo e que o mercado endereçável é significativo: apenas no município, ele estima dezenas de milhares de pessoas a partir de 75 anos nesse perfil de renda, com crescimento anual da base de idosos. Segundo ele, mesmo uma pequena fatia desse universo pode sustentar dezenas de empreendimentos nos próximos 10 a 15 anos.
Silver economy, família e redes de apoio
O debate também tratou de como as transformações familiares impactam negócios ligados à terceira idade. Joseph citou o crescimento do chamado “silver divorce”, o divórcio após os 50 anos e lembrou que muitas pessoas chegam aos 70 ou 80 anos morando sozinhas, seja por viuvez ou separação.
Ele relatou o caso de uma amiga que precisa cuidar simultaneamente da casa do pai e da mãe, ambos idosos e divorciados, sem conseguir dar conta da própria rotina. Nesse contexto, empreendimentos estruturados para idosos tendem a aliviar a pressão sobre as famílias, oferecendo segurança, serviços, socialização e programação de atividades, como passeios culturais, aulas e cursos em parceria com universidades.
A visão de envelhecimento também foi tratada sob a ótica de valores. Joseph destacou a influência da religião e da tradição judaica no respeito à velhice e na ideia de que o idoso é portador de experiência e sabedoria, algo que, segundo ele, ainda precisa ser mais valorizado em uma sociedade orientada pela juventude.
Dados, IA e personalização em massa
Paulo Braga trouxe para a conversa a dimensão tecnológica, cada vez mais central na estratégia das empresas familiares que buscam se modernizar. Na DAXX, o foco é “ultrapersonalização em larga escala”: usar dados e inteligência artificial para que cada cliente receba mensagens, ofertas e atendimento de forma individualizada, mas em um ambiente com dezenas de milhares de contatos ativos.
Ele citou o uso intensivo de CRM, jornadas personalizadas em WhatsApp e automação de comunicação, com regras claras para a IA decidir quando deve apenas responder de forma objetiva e quando pode “raciocinar” com base em dados disponíveis. O objetivo é aumentar a eficiência comercial sem desgastar o cliente com excesso de mensagens.
Já no grupo de autopeças, Conrado explicou que também há um esforço para integrar bases de dados de diferentes empresas do grupo em um único CRM, permitindo entender o relacionamento com cada cliente e evitar sobreposição de ofertas. A agenda, segundo ele, passa pela construção de um portal B2B com “cara diferente” para cada perfil de comprador e pelo uso de assistentes inteligentes em canais como o WhatsApp para garantir atendimento contínuo.
Longevidade, propósito e tecnologia no dia a dia
Durante o programa, a discussão sobre longevidade saiu do plano dos negócios e entrou na esfera pessoal. Os convidados falaram sobre rotina de exercícios, sono, alimentação e uso de tecnologia para monitorar a saúde.
Paulo contou que usa o anel Oura para acompanhar sono, recuperação e estresse, e que registra treinos e dados há anos. O dispositivo consegue identificar, por exemplo, alterações fisiológicas depois de um jantar com vinho, sinalizando impacto no descanso do corpo. Para ele, mais do que “viver muitos anos”, a preocupação está em estar bem hoje, ter energia para subir escadas, acompanhar as filhas nas atividades e manter qualidade de vida.
A inteligência artificial apareceu tanto como ferramenta de produtividade e análise de dados quanto como vetor de transformação social. Joseph mencionou o potencial de carros autônomos reduzirem drasticamente acidentes de trânsito, com reflexos diretos sobre mortalidade de jovens e até sobre a pirâmide demográfica.
Ao final, o programa conectou os pontos entre empresas familiares, longevidade e tecnologia: grupos que nasceram de iniciativas empreendedoras de pais e avós agora lidam com novos mercados, como a moradia para idosos e novas ferramentas, como IA e dados em larga escala, para seguir relevantes em um mundo em rápida mudança.
Para o público de empresários e gestores, a mensagem central foi clara: as empresas familiares que conseguirem combinar sucessão bem planejada, visão de longo prazo e abertura à inovação terão mais chances de atravessar gerações mantendo valor e protagonismo.














