O Brasil está entre os países que mais produzem artigos científicos no mundo, mas continua incapaz de transformar esse conhecimento em riqueza e inovação. Em entrevista ao BM&C Strike, com Paula Moraes, o economista-chefe da MB Associados, Sérgio Vale, resumiu o problema de forma direta.
“O Brasil produz pesquisa, mas não produz velocidade. E sem velocidade, muitas pesquisas morrem antes de virarem inovação“, explicou.
Ele destacou que o país conseguiu criar ecossistemas de excelência, como Embrapa e Embraer, graças a políticas consistentes e universidades fortes, mas que essa trajetória não se repetiu na maior parte da economia.
“Esses polos deram certo porque tiveram base tecnológica, universidade e políticas públicas bem estruturadas. No resto, ficamos estacionados”, destaca Vale.
Lentidão do Estado trava a inovação no Brasil
Um dos entraves mais graves, segundo Vale, é a lentidão do Estado. O Brasil leva uma década para analisar uma patente, enquanto outros países resolvem em dois ou três anos. Ele citou casos de pesquisas que perderam valor econômico porque o tempo de proteção não compensou o investimento. Isso afeta também empresas estrangeiras.
“Não é só a ciência brasileira que trava. Até empresas globais, com capital e tecnologia prontos, ficam presas na mesma lentidão institucional”, pontua.
Para ele, órgãos como INPI, Anvisa e Ibama deveriam ter status de instituições de Estado, com autonomia técnica, proteção contra ciclos políticos e investimento contínuo em pessoal e tecnologia.
Protecionismo também entra na conta
Outro obstáculo é o protecionismo histórico. Enquanto países como Coreia do Sul, Taiwan e Polônia se abriram comercialmente e ganharam produtividade pela competição, o Brasil permaneceu fechado. Ele lembrou que a indústria brasileira, ao se proteger demais, deixou de competir e inovar na intensidade necessária. Como resultado, o país não participa das cadeias globais de alta tecnologia.
“Quando pensamos em semicondutores, inteligência artificial, cadeias de valor sofisticadas, o Brasil está mais atrás ainda”, afirmou.
Hoje, os setores que mais crescem são ligados a commodities, não porque inovaram pouco, mas porque foram os únicos expostos à modernização ao longo das décadas.
Como destravar a inovação no Brasil
Para mudar esse cenário, Vale defende uma política pública que deixe de escolher setores e empresas “vencedoras” e aposte em um modelo horizontal. Para ele, o Estado deve fortalecer universidades, pesquisa básica, agências de fomento e integração entre academia e setor privado e não fazer políticas personalizadas para grupos específicos. Ele cita a Fapesp como referência.
“É um órgão de excelência, com funding estável e avaliação séria. Falta ao país replicar esse modelo. A crise fiscal penaliza justamente as áreas que deveriam impulsionar o futuro. É o tipo de corte menos inteligente que um país pode fazer.”, avaliou.
No encerramento da entrevista, Vale foi categórico ao avaliar o risco de o Brasil continuar refém da própria lentidão institucional.
“Inovação depende de previsibilidade, velocidade e ambiente regulatório. Se o país não recuperar isso, vai perder não só o futuro, mas o presente.”, destaca.
Para ele, o país tem potencial, energia limpa, agro competitivo, mercado interno grande, mas desperdiça oportunidades por falta de coordenação e visão de longo prazo.
“A gente faz pesquisa, mas não transforma em produtividade. Sem isso, não há crescimento possível.”, conclui.













