O avanço do PL da dosimetria no plenário da Câmara se tornou o novo epicentro da crise política em Brasília. A proposta, defendida pelo presidente da Casa, Hugo Motta, surge como alternativa à anistia ampla, mas, na prática, abre espaço para reduzir de forma significativa as penas aplicadas aos condenados pelos ataques de 8 de janeiro — incluindo a sentença de Jair Bolsonaro, hoje fixada em mais de 27 anos de prisão. Além disso, sua inclusão na pauta ocorre simultaneamente a manobras regimentais e articulações que envolveram a retirada à força do deputado Glauber Braga da Mesa Diretora.
O texto, relatado por Paulinho da Força, propõe uma revisão técnica da dosimetria das penas, alterando critérios que impactam diretamente condenações por crimes como golpe de Estado e abolição violenta do Estado Democrático de Direito. Nesse sentido, defensores afirmam que o objetivo é “pacificar o país”, enquanto críticos enxergam o projeto como uma anistia disfarçada, capaz de desmontar o esforço institucional de responsabilização pelos atos antidemocráticos.
O que está por trás da pauta do PL da dosimetria?
O presidente da Câmara decidiu pautar a votação após semanas de negociações intensas com o centrão e com aliados de Bolsonaro. A ofensiva política ganhou força depois de declarações de familiares do ex-presidente sugerindo que sua pré-candidatura “tem preço” — elemento interpretado como sinal de que facilidades jurídicas, como a redução de penas, seriam parte das barganhas em curso. Por outro lado, a oposição acusa a Mesa Diretora de acelerar o processo por conveniência eleitoral e de usar votações paralelas, como a cassação de Glauber Braga, como instrumento de pressão.
O interesse imediato em aprovar o PL está conectado a uma promessa de solução “menos traumática” do que a anistia total. Contudo, a votação ocorre em ambiente acirrado, no qual resistências internas, medidas de obstrução e clima de desconfiança entre os blocos parlamentares tornam cada sessão um espaço de disputa aberta.
Qual é o impacto direto do projeto?
A proposta permitiria reduzir drasticamente a pena de Bolsonaro — de 27 anos para pouco mais de dois — ao revisar agravantes e redefinir o cálculo da pena-base. Além disso, o PL traria efeito cascata para centenas de réus já condenados, alterando o entendimento de crimes considerados particularmente graves contra o Estado Democrático de Direito.
Por outro lado, juristas e setores políticos críticos alertam que a mudança fragilizaria o sistema de responsabilização construído após o 8 de janeiro, além de intensificar a tensão entre Congresso e Supremo Tribunal Federal. Nesse cenário, eventuais questionamentos de constitucionalidade são considerados prováveis.
A retirada de Glauber Braga se conecta ao avanço do PL?
Sim. O episódio em que Glauber Braga foi removido à força da Mesa Diretora passou a ser interpretado pela oposição como movimento tático para destravar a pauta. O deputado do PSOL era uma das vozes mais firmes contra o PL e vinha adotando estratégias de obstrução. Sua saída compulsória, no dia anterior à votação, alimentou a leitura de que a cassação e o PL estariam interligados numa engrenagem política maior.
Enquanto isso, aliados de Motta afirmam que a remoção se deu por quebra de decoro e por tentativa de tumultuar os trabalhos, e não por alinhamento ao projeto da dosimetria. A controvérsia, entretanto, reforça o clima de instabilidade que cerca a pauta.
O que esperar daqui para frente?
Se aprovado, o PL da dosimetria deve reconfigurar o debate jurídico e político sobre o 8 de janeiro, reduzindo penas, alterando regimes de cumprimento e reacendendo disputas com o Judiciário. Por outro lado, sua rejeição fortaleceria o entendimento do STF sobre a gravidade dos atos e limitaria articulações eleitorais que dependem de flexibilização de sentenças.
A sessão desta semana tende a ser decisiva — não apenas para condenados específicos, mas para o futuro da relação entre Poderes, para a memória institucional sobre o 8 de janeiro e para a disputa política que se intensifica rumo ao próximo ciclo eleitoral.

