Daniel Vorcaro dormiu ontem com o banco Master vendido ao grupo Fictor e com a sensação de que tinha resolvido o maior de seus problemas. Acordou com a instituição liquidada extrajudicialmente e um mandado de prisão com seu nome impresso no papel. O motivo oficial para a prisão e a intervenção do Banco Central teria sido uma venda de títulos sem lastro ao Banco Regional de Brasília, que já havia tentado adquirir o banco de Vorcaro há alguns meses.
A razão pela qual o Master foi liquidado, no entanto, é apenas protocolar. Há pelo menos dois anos se comenta no mercado financeiro que Vorcaro estava em dificuldades e tinha emitido mais CDBs que sua capacidade de resgatar os títulos. O que mantinha a instituição funcionando era a emissão e venda de novos papéis, como se fosse uma bicicleta pedalando para ficar em pé. Além disso, outras irregularidades eram investigadas pelo BC e pela Comissão de Valores Mobiliários.
Vorcaro, evidentemente, é o principal responsável pela situação que levou o banco à liquidação. Mas há outro responsável pela agonia do Master: o próprio BC. Quando a crise envolvendo a emissão de CDBs começou, o presidente do Banco Central ainda era Roberto Campos Neto, hoje no Nubank e uma espécie de monstro sagrado do mercado financeiro. Embora tenha muitas qualidades, Campos Neto falhou ao não agir de forma enérgica quando os problemas com o Master tiveram início.
Campos Neto saiu do BC e Gabriel Galípolo entrou em seu lugar. A pressão contra o Master dentro do Bacen ficou maior, mas foi contida por um lobby orquestrado pelo próprio Vorcaro no Congresso e junto a personalidades ligadas ao governo federal e ao cenário político de forma geral.
Em setembro, por exemplo, a Câmara dos Deputados articulou propostas para limitar a autonomia do Banco Central, permitindo inclusive que o Congresso pudesse demitir o presidente e diretores da instituição por maioria absoluta, caso considerasse que a condução da autoridade monetária fosse “incompatível com os interesses nacionais”.
Ocorre que o BC é independente. E resistiu ao lobby parlamentar: não autorizou a venda ao BRB e passou a monitorar a situação de Vorcaro em tempo real. Foi assim que todas as suas operações foram investigadas e uma irregularidade ligada à venda de títulos ao BRB foi detectada.
Ou seja, o BC tardou, mas não falhou.
Neste episódio, a autoridade monetária protegeu o sistema financeiro de um colapso maior, mas deixou que a crise se arrastasse até o limite da insolvência. A demora em agir custou caro ao mercado e aos investidores, mas a decisão final de liquidar o Master e responsabilizar Vorcaro mostra que, apesar das pressões políticas e dos erros de condução, o Banco Central reafirmou sua autonomia e encerrou um ciclo que ele próprio havia permitido se prolongar.
















