Os processos jurídicos que cercaram o escândalo do Mensalão e a Operação Lava Jato, de certa forma, moldaram o nosso presente. Teses de caráter duvidoso, como a do “domínio do fato”, usada em 2012, ou práticas como a do “lawfare”, amplamente utilizada pelo hoje senador Sergio Moro, continuam em alta na atualidade.
Vamos deixar de lado, por um instante, se o ex-presidente Jair Bolsonaro é culpado ou não de tentativa de golpe de Estado. O seu julgamento expõe uma tendência preocupante – a de transformar o processo penal em palco de narrativas políticas. A antecipação de culpa, amplificada por manchetes e declarações públicas, compromete não apenas o direito à presunção de inocência, mas a própria credibilidade das instituições que deveriam zelar pela imparcialidade.
A Constituição é clara: ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória. No entanto, quando o réu é um ex-presidente polarizador, esse princípio parece se dissolver diante da pressão de parte da opinião pública e da conveniência de determinados políticos. No final das contas, a impressão que se tem no imaginário popular é a de que o julgamento, antes de ser técnico, já foi decidido antes mesmo de começar.
Voltando no tempo: a primeira condenação do hoje presidente Luiz Inácio Lula da Silva, aquela do Triplex, era bastante frágil do ponto de vista jurídico. Mas muitos daqueles que condenam o tratamento dispensado a Bolsonaro em 2025, aplaudiram a decisão de Moro em 2018, a de Lula colocar atrás das grades com o uso de argumentos legais questionáveis.
Não se trata de defender Bolsonaro, portanto, mas de defender um processo correto. A Justiça não pode se deixar contaminar por disputas ideológicas, nem se prestar ao papel de instrumento de vingança institucional.
A provável condenação do ex-presidente no STF pode motivar juízes, nas demais instâncias, a dar declarações que penalizam os réus antes do final do processo. Quando o Judiciário se afasta da neutralidade, abre-se espaço para o lawfare: o uso estratégico da lei para eliminar adversários, mascarando perseguição sob o manto da legalidade. Se tal expediente for utilizado a torto e a direito daqui para frente, a sociedade pode sofrer muito. Hoje, representantes da direita são perseguidos. Mas, no futuro, os alvos podem ser os representantes da esquerda. Tudo vai depender da motivação dos magistrados, não importando necessariamente a matiz ideológica dos acusados.
O Brasil está assistindo esse filme desde a época de Getúlio Vargas. E toda vez que a Justiça se curva à lógica do espetáculo, quem perde é a democracia.