Por Fábio Neto*
A Black Friday, que anualmente acende o farol do consumo em novembro, deixou de ser apenas a busca por super-descontos e campanhas midiáticas. O que muitos ainda não perceberam é que o tabuleiro dos negócios mudou radicalmente. Gigantes chineses como Temu, Shein, Shopee, Kwai e TikTok Shop reescreveram o manual e estão ditando as novas regras para as marcas que querem sobreviver e vencer neste novo cenário.
No meu livro, recém-lançado, “O Novo Radar dos Negócios”, argumento que o Brasil está sob nova direção. Não porque o consumidor mudou, mas porque mudou o jogo de modelos de negócio. E na Black Friday, essa transformação se torna visível.
Observo que o sucesso explosivo dessas plataformas revela um conjunto de estratégias que as empresas locais precisam, urgentemente, absorver. Destaco algumas:
1. Preço extremo e eliminação de intermediários
A estratégia de preço ultra-baixo, baseada em escalas, cadeias enxutas e o modelo Factory-to-Consumer (F2C), funciona como um poderoso chamariz. A Temu, por exemplo, demonstrou isso com um crescimento explosivo em downloads e usuários ativos mensais no Brasil, durante a última Black Friday local. Faço essa associação no livro, eliminar intermediários significa liberar margem para ofertas mais agressivas.
2. Atenção e experiência social com gamificação
A Black Friday se transformou em um “arcade de compras”. As plataformas chinesas misturam lives, vídeo shopping, interação social e mecânicas de jogo. Para as marcas, não basta apenas “cortar preço”, é preciso engajar o cliente em 360°, com fluidez entre entretenimento, descoberta e compra. Exploro essa ideia sob o pilar de Atenção e Experiência Social: a atenção virou moeda estratégica e a Black Friday é seu laboratório.
3. Logística global e adaptação local
As plataformas não fazem apenas promoções, elas as sustentam em logística global eficiente e forte presença digital. Apesar de serem globais, elas localizam suas operações, adaptando idiomas, canais e logística ao contexto brasileiro, chegando a ter CNPJs e atendimento local para ganhar credibilidade. Sua marca no Brasil precisa alinhar cadeia, suporte, dados e execução, pois o cliente fará a comparação com o padrão chinês.
4. Foco na aquisição de novos usuários (e não apenas no faturamento)
Para muitas dessas plataformas, a data é focada na expansão de base de usuários, não apenas na venda imediata de margem. Empresas como a Temu chegam a “queimar” caixa para atrair volume, com uma aposta em conversão de longo prazo. Para as empresas brasileiras, percebo que o insight é vital: a Black Friday não deve ser só sobre faturamento alto, mas sobre ganhar novos clientes, ativar usuários e gerar retenção depois.
5. Jornada contínua vs. evento Isolado
Para o novo jogo, a Black Friday é apenas parte de um ciclo contínuo de promoções, dados, personalização e relacionamento. O contraste com o varejo tradicional, que a trata como um pico isolado, reduz a relevância do evento. No livro, enfatizo que o mundo está sob nova direção e isso significa: não é mais sobre esperar o evento certo, é sobre manter cadência, fluidez e conexão permanente com o cliente.
O que fazer agora?
Para o executivo brasileiro, ignorar essa transformação significa perder participação de mercado, não só durante a semana da Black Friday, mas no ciclo seguinte. Clientes que experimentam fluidez, preço e entrega rápida, tendem a migrar de canal. Eu reitero: se a Black Friday se resumir a preço e não a experiência, a marca será vista como comoditizada. Afinal, no livro, explico que “relevância contínua” é aquilo que permanece depois da promoção. O mercado exige competição em modelo, experiência e recorrência, e não apenas em preço.
Neste cenário, as empresas precisam agir imediatamente. A recomendação inicial é testar e iterar com rapidez, adotando o Ritmo (R) do RADAR: é preciso lançar ofertas-piloto, monitorar o comportamento em tempo real e corrigir dentro do próprio evento. Além disso, garantir uma jornada sem atritos é fundamental, simplificando o checkout, reduzindo cadastros e oferecendo logística rápida, para que cada clique não custe uma conversão. No quesito engajamento, é imperativo utilizar vídeos, lives e gamificação para capturar a Atenção (A do RADAR), antes das ofertas. Na execução, a capacidade de coletar dados e personalizar ofertas no evento é um diferencial, que permite segmentar em tempo real e ajustar preços, canais e mensagens com automação simples (D de Dados). Por fim, o olhar deve sempre pensar além da Black Friday, com retenção e relevância contínua. O evento abre a oportunidade de aquisição, mas a vantagem real é manter o cliente no longo prazo, garantindo a relevância contínua (segundo R do RADAR).
Não é preciso replicar exatamente o modelo chinês, mas é vital adaptar seus princípios ao contexto brasileiro. Como escrevo no livro: o futuro não está no velho tabuleiro. A pergunta crucial é: “Como meu modelo está calibrado para atender a lógica chinesa no Brasil?”.
Coluna escrita por Fábio Neto, Chief Strategy Officer (CSO) da StartSe
As opiniões transmitidas pelo colunista são de responsabilidade do autor e não refletem, necessariamente, a opinião da BM&C News.
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