Passado o susto inicial, muitos eleitores já se perguntam se o senador Flávio Bolsonaro será mesmo candidato à presidência ou se o anúncio de sua candidatura foi apenas um balão de ensaio engendrado por Jair Bolsonaro. O ex-presidente, no entanto, não é exatamente uma personalidade complexa, com várias camadas, e também não é conhecido por sua capacidade analítica. Com Bolsonaro, geralmente a explicação mais simples de suas atitudes é aquela que mais se aproxima da realidade. Neste caso, assim, a escolha pelo filho refletiria a vontade de ter alguém como seu sobrenome na cédula eleitoral, para manter sua militância engajada e motivada.
Mas Bolsonaro pode ter mirado no que viu e acertado naquilo que não enxergou em um primeiro momento. É inevitável que Flávio sofra uma onda de ataques brutais e que esteja desgastado inexoravelmente nos primeiros meses do ano. Com isso, abriria caminho para o nome favorito do empresariado, o governador Tarcísio de Freitas.
Mas há outro efeito colateral que pode surgir da decisão do ex-presidente. O próprio Flávio deu ontem uma pista sobre o que seria este impacto indireto. “Tem uma possibilidade de eu não ir até o fim. Eu tenho um preço para não ir até o fim. Eu vou negociar”, disse. O que seria isso? Uma anistia para seu pai?
Flávio, diga-se, não é um candidato bem-visto pelo eleitorado. Em pesquisa feita pelo Datafolha neste final de semana, perguntou-se a 2.002 pessoas espalhadas pelo Brasil qual seria o nome que Bolsonaro deveria apoiar em 2026. Em primeiro lugar, ficou a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro, com 22%; em segundo, Tarcísio, com 20%; em terceiro, Ratinho Jr., com 12%; em quarto, o deputado Eduardo Bolsonaro, que está autoexilado nos Estados Unidos, com 9%. Flávio surge apenas na quinta colocação, com 8%.
Por enquanto, Michelle não se mostra interessada em disputar o Planalto e Tarcísio, seguindo o script de fidelidade a Bolsonaro, vai se dedicar à reeleição em São Paulo. Mas o inevitável desgaste de Flávio pode fazer o ex-presidente mudar de ideia e indicar a esposa ou o governador.
E o que pensa o presidente do PL, Valdemar da Costa Neto? Ele esconde muito bem sua opinião pessoal e afirma que a bola está com Bolsonaro. Valdemar, há muito tempo, tem outra prioridade: manter o seu alto número de deputados federais, a régua que determina a fatia dos fundos estatais que sustentam os partidos políticos.
Tarcísio também está ligado a este processo. O governador é filiado ao PR, mas frequentemente se fala em sua transferência para o PL. Se ele ficar onde está, Valdemar não moverá uma palha para apoiar a candidatura do mandatário paulista, uma vez que Tarcísio, concorrendo pelos Republicanos, deve engordar o cofrinho de outra agremiação que não o PL.
Ratinho Jr. vai continuar sua campanha, novamente de olho em Tarcísio. Os dois disputam em tese o mesmo terreno eleitoral e podem ainda ensaiar uma aproximação. Mas tudo isso vai depender de uma coisa: a capacidade de a candidatura bolsonarista se manter de pé.
O tamanho real do bolsonarismo ainda é difícil de medir com precisão, mas os números sugerem a existência de um núcleo duro de eleitores que permanece fiel ao ex-presidente, independentemente das circunstâncias. Essa base, estimada em torno de um quarto do eleitorado, garante a este movimento uma presença constante no debate público e uma capacidade de mobilização que não depende exclusivamente de resultados eleitorais. O problema é que essa força não se transfere automaticamente para qualquer herdeiro político. Flávio Bolsonaro, em especial, não parece reunir o carisma nem a confiança necessários para manter esse contingente unido em torno de sua candidatura.
Se houver um trabalho consistente de desconstrução sobre Flávio, é provável que o bolsonarismo resista como movimento, mas não necessariamente em torno de seu nome. A militância pode se manter engajada, defendendo o sobrenome e a narrativa de perseguição política, mas o eleitorado de forma geral buscaria outras alternativas, como a própria Michelle Bolsonaro, Tarcísio de Freitas ou uma nova liderança. Nesse cenário, o desgaste de Flávio não significaria o enfraquecimento imediato do bolsonarismo, mas sim a abertura de espaço para que outras lideranças assumam o papel de porta-vozes do movimento.
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