O encontro entre os presidentes Donald Trump e Luiz Inácio Lula da Silva, ocorrido no domingo, pode ter sido um fracasso ou um sucesso. Tudo vai depender de quem fizer a análise da reunião. Entre os veículos digitais alinhados com a direita, o clima é de ceticismo; já a grande imprensa viu com otimismo contido o diálogo (contrastando com a euforia manifestada pelos governistas). Mas poucos definiram a conversa entre os dois líderes de acordo com a realidade: um pontapé inicial para as negociações de verdade.
Há um ponto bastante positivo: o fato de Trump ter colocado negociadores alinhados com a área econômica para tocar a conversa técnica, reservando ao secretário de Estado Marco Rubio um papel mais institucional. Se Rubio fosse destacado para tocar todo o processo, o sinal seria o de que a ideologia iria ditar pelo menos parte das conversas. Mas a presença de Scott Bessent (secretário do Tesouro) e Jamieson Greer (enviado comercial dos Estados Unidos) indica que existe espaço para conversas ligadas apenas à questão tarifária.
Ninguém prometeu nada – e Trump fez questão de deixar isso claro. Mas o clima de cordialidade e de entendimento ficou óbvio para todos. Houve inclusive um momento descontraído ao final da entrevista protagonizada pelos dois líderes. Lula sinalizou que gostaria de encerrar a coletiva. Foi nesse contexto que Trump fez o comentário bem-humorado: “He wants to end the press conference. I like this guy!” (“Ele quer encerrar a entrevista coletiva. Eu gosto desse cara!”).
O que vem agora é o que realmente importa, pois a conversa entre os presidentes foi apenas um prólogo. O enredo principal será escrito nas mesas de negociação entre os técnicos e aí o Brasil precisa estar preparado para discutir com pragmatismo. A pauta econômica é vasta e cheia de oportunidades (mas também de armadilhas). O foco do governo, assim, deve estar em ativos estratégicos e cadeias produtivas nas quais o Brasil tem vantagem competitiva ou potencial de expansão.
Um dos temas que deve ganhar tração é o das terras raras. O Brasil possui reservas significativas desses minerais, essenciais para a indústria de tecnologia e defesa. Os Estados Unidos, por sua vez, buscam alternativas à dependência chinesa nesse setor. Há espaço para cooperação, mas também para pressão. O Brasil deve entrar nessa conversa com clareza sobre o valor de seus recursos naturais e tentar sair das negociações sem se transformar em um mero exportador de minérios. Portanto, as autoridades brasileiras vão buscar algum tipo de contrapartida em troca de terras raras ou mineirais críticos.
Outro ponto de interesse é o agronegócio, especialmente o café e a carne bovina. O café brasileiro, já consolidado como líder global, pode se beneficiar de acordos bilaterais que reduzam barreiras tarifárias e ampliem o acesso ao mercado americano. Os exportadores de carne, por outro lado, precisam colocar suas fichas na mesa. Entre elas, a comprovação de sua capacidade de produzir com rastreabilidade e sustentabilidade.
E há ainda o universo das big techs. A regulação digital, a tributação de serviços e a proteção de dados são temas que interessam aos dois países, mas com abordagens distintas. O Brasil tem buscado uma posição mais ativa na regulação das plataformas, enquanto os EUA tendem a proteger seus gigantes tecnológicos. Este deverá ser um campo de disputa.
Por fim, temas ideológicos como sanções da Lei Magnitsky, direitos humanos ou alinhamentos políticos na América Latina devem ficar para depois. Não por serem irrelevantes, mas porque não são urgentes. A prioridade agora é a economia. O Brasil precisa aproveitar o momento para destravar acordos, atrair investimentos e reposicionar sua imagem como parceiro confiável e estratégico. Ideologia se discute depois — de preferência, com a balança comercial em alta e exportadores satisfeitos.