A profissionalização da gestão financeira ainda é um ponto cego na maior parte das empresas brasileiras de médio porte, e foi justamente essa dor que protagonizou o episódio mais recente do programa Smart Money, apresentado por João Kepler na BM&C News.
O convidado foi Cassiano Tonon, fundador da Otto Finance, empresa que nasceu como consultoria e evoluiu para o modelo que ele define como “fintech boutique”.
O debate contou também com os mentores Erick Nunes e Mário Nogueira, especialistas do setor financeiro, que provocaram Cassiano sobre escalabilidade, nicho de atuação, tecnologia e percepção de valor por parte dos clientes.
Gestão financeira em debate: a visão da Otto Finance
Tonon explicou que a Otto surgiu com um modelo clássico de consultoria financeira, mas rapidamente percebeu o limite desse formato. O objetivo passou a ser outro: escalar impacto em empresas que precisam elevar o nível da gestão financeira.
“Hoje a gente gosta de se descrever como uma fintech boutique. O mercado é muito grande e eu entendi que não dá para chegar onde queremos apenas com consultoria tradicional”, afirmou Cassiano.
A empresa atende, principalmente, o segmento middle market, composto por companhias que faturam entre R$ 10 milhões e R$ 150 milhões ao ano, empresas em fase de expansão e que ainda operam com controles financeiros básicos ou informais.
Segundo o fundador, muitas organizações mantêm práticas de finanças controladas por pessoas de confiança, mas sem formação técnica adequada:
“É o primo, o tio, ou alguém que está no financeiro desde o começo, mas que carece de sofisticação.”
Hoje, a Otto faz cerca de 25 projetos simultâneos, sendo entre 15 e 16 no modelo CFO as a Service, com uma equipe de 12 pessoas.
Capacidade de escala: quanto a tecnologia muda o jogo
Questionado pelos mentores sobre se IA e tecnologia realmente permitem ampliar o atendimento mantendo qualidade, Cassiano foi direto:
“Com a equipe atual, chegamos a 40 ou 50 clientes com tranquilidade. Aí a tecnologia faz diferença: dá respostas do nível do Cassiano, ou melhores, sem depender de uma única pessoa.”
O ticket médio atual é de R$ 12 mil, mas há planos de ampliar a oferta:
- planos mais robustos, de R$ 18 a R$ 25 mil;
- versões de entrada, a partir de R$ 4,5 mil, para pequenas empresas.
Para Tonon, o desafio foi empacotar toda a sofisticação técnica em um produto acessível e replicável.
O desafio do ICP e a provocação: é preciso nichar?
O ICP da Otto é amplo: empresas que precisam de gestão financeira profissional. Kepler e os mentores provocaram: seria necessário nichar?
“Você não acha amplo demais atender ‘todo mundo que precisa de gestão financeira profissional’?”, questionou o apresentador.
Tonon reconheceu que o posicionamento pode criar atrito, mas argumentou que a dor é universal:
“Nosso foco não é setor. Atendemos quem precisa evoluir financeiramente e isso é transversal no mercado brasileiro.”
Mesmo assim, os mentores sugeriram oportunidades claras ao nichar segmentos como médicos, arquitetos ou pequenas empresas que vivem gargalos de crédito.
Finanças comportamentais: o diferencial inesperado
Um ponto que chamou atenção no debate foi a abordagem da Otto para lidar com viés comportamental dos empresários.
“O que o cara comeu no café da manhã determina mais a decisão financeira do que todos os relatórios. Se não tratarmos o comportamento, não conseguimos mudar a decisão”, explicou Tonon.
A empresa desenvolveu uma combinação entre finanças corporativas, psicologia econômica e metodologias próprias, resultando em:
- avaliação de maturidade financeira;
- análise de performance;
- diagnósticos automáticos;
- plataforma com insights e portal do cliente;
- registro completo de contexto via IA para orientar decisões.
Escalabilidade: treinar o mercado ou transformar concorrentes em parceiros?
Mário e Erick levantaram um ponto estratégico: transformar a metodologia da Otto em produto.
“Por que não treinar consultores, contadores e planejadores financeiros para usar seu método?”, questionou Mário.
A proposta incluía:
- criar diagnósticos públicos como porta de entrada;
- oferecer treinamentos para gestores financeiros;
- licenciar ferramentas para contabilidades e consultorias que desejam elevar seu ticket médio.
Tonon revelou que essa ideia já está em teste:
“Chamamos de CFOs associados. Eles acessam nosso capital intelectual, nossa metodologia e até ferramentas, como o CFO por WhatsApp, integrado à IA.”
O que o episódio revela sobre o mercado brasileiro
O debate expôs um problema estrutural: a gestão financeira ainda não é prioridade para o empresário brasileiro, que frequentemente busca solução só quando o crédito trava.
Kepler encerrou com uma provocação ao público: “Muita empresa não quebra por falta de vendas. Quebra por desorganização financeira.”
A Otto, segundo ele, traz um modelo híbrido, consultoria técnica + tecnologia, desenhado para mudar esse cenário.












