O crime organizado deixou de ser um tema restrito à segurança pública e passou a interferir diretamente na competitividade, na produtividade e no investimento no Brasil. No BM&C Talks, Rodrigo Marinho, diretor executivo do Instituto Livre Mercado e secretário executivo da Frente Parlamentar pelo Livre Mercado, detalhou como facções infiltraram cadeias inteiras da economia, distorcendo preços, lavando recursos e corroendo a concorrência. “Criminosos devem ser presos. O mercado segue”, resumiu, ao defender punição individual sem criminalizar setores inteiros.
Segundo Marinho, a narrativa política que opõe “mercado” e “sociedade” desvia o debate do essencial. Além disso, ele afirma que o foco deve ser “seguir o dinheiro”, fechar brechas regulatórias e integrar órgãos de Estado para desarticular redes que usam empresas de fachada, liminares oportunistas e lacunas de fiscalização para operar com margens artificiais, expulsando concorrentes corretos.
Onde o Estado falhou e como o crime organizado ganhou espaço?
Na avaliação do entrevistado, a falha é difusa e cumulativa. O caso da cadeia de combustíveis ilustra o mecanismo: postos que não cumprem obrigações de mistura e tributárias operam com preços que não fecham pelas margens típicas do setor, cerca de 2%. “Esses postos não misturavam biodiesel, não pagavam tributo. Eles tinham uma margem absurda e foram destruindo o mercado”, disse. A escalada, então, migra para as distribuidoras, onde há mais dinheiro e deveres técnicos e fiscais adicionais, ampliando o ganho ilícito.
Marinho também descreveu o uso do chamado “desembaraço seco” em estados com decisões judiciais permissivas para reduzir ICMS na entrada de combustíveis. Nesse sentido, ele alertou para a captura de partes do Judiciário por corrupção, sem generalizações. “Não estamos dizendo que todo Judiciário ou todo mercado é ruim. Há bandidos no mercado que precisam ser punidos”.
Além dos combustíveis: vape, bebidas, apostas e sistema financeiro
O entrevistado citou frentes paralelas. “Hoje 100% do cigarro eletrônico no Brasil está nas mãos do crime”, declarou, lembrando que a proibição da Anvisa impede produção, importação e venda legal, empurrando a demanda para redes ilícitas. Por outro lado, mencionou a presença de facções em bebidas, no mercado de bets, “50% é ilegal” e o uso oportunista de partes do sistema financeiro para lavar dinheiro com operações não triviais, o que exige compliance robusto de bancos e fintechs. “É tentador, mas perigoso quando alguém chega do nada com bilhões. É preciso separar o joio do trigo”, disse.
Quanto custa essa economia paralela do crime organizado?
O Instituto Livre Mercado estimou que o custo anual do crime organizado equivale ao PIB de um estado relevante, com números que o próprio Marinho considera conservadores. Ele citou montantes bilionários movimentados por facções em poucos anos e lembrou que empresas gastam somas expressivas em segurança, algo em torno de 1,7% do PIB, segundo a discussão no programa. Além disso, o “custo do medo” reduz circulação de pessoas, encarece logística e desestimula investimentos, com efeitos diretos sobre a produtividade e o comércio local.
Para Marinho, o maior gargalo é de inteligência e integração. “A principal brecha é que eu não falo com você”, disse, ao criticar a falta de comunicação entre guardas municipais, polícias militares e civis, Receita, Banco Central, COAF, Polícia Federal e outros órgãos de controle. Enquanto isso, facções se aproveitam de assimetrias e de decisões monocráticas que afetam a previsibilidade do ambiente econômico. Ele também apontou o “prende e solta” como fator de estímulo ao cálculo econômico do crime.
Pacote Brasil Mais Seguro e outras propostas em debate
Na Câmara, Marinho destacou o PL 2646/2025 (autoria do deputado Júlio Lopes; relatoria do deputado Paulo Bilynskyj). No Senado, citou o PL 125 (relator senador Efraim Filho). Os eixos propostos incluem:
- Perdimento de bens com rito mais ágil e transparente.
- Rastreamento e bloqueio de fluxos financeiros das facções, com integração entre Receita, Banco Central, COAF, PF e polícias estaduais.
- Restrições ao pagamento de honorários com dinheiro de origem criminosa.
- Ajuste de penas e endurecimento contra o “prende e solta”, desincentivando o cálculo econômico do crime.
- Estatuto da Vítima para recentrar a proteção no cidadão afetado e nos agentes que atuam na segurança.
O entrevistado citou ainda medidas já adotadas por alguns estados, como fim das “saidinhas” e endurecimento contra lideranças de facções dentro do sistema prisional, como exemplos de políticas que alteram incentivos e reduzem a capacidade de comando fora das cadeias.
PCC e Comando Vermelho: modelos distintos, ameaça comum
Marinho diferenciou as duas principais organizações. O PCC, com base em São Paulo, opera como “empresa”, tratando drogas como mais um produto em um portfólio amplo, com presença na logística, varejo e lavagem. O Comando Vermelho, com base no Rio, seria menos estruturado e ainda centrado no tráfico. “O PCC entendeu que dá mais dinheiro trabalhar com o crime organizado em cadeias legais do que vender droga diretamente”, disse, ressaltando que o efeito colateral continua sendo violência na ponta.
O entrevistado relacionou segurança pública, estabilidade regulatória e retomada do mercado de capitais. “Faz dois anos que o Brasil não tem um IPO”, afirmou, atribuindo parte da paralisia à combinação de incerteza jurídica, decisões monocráticas e elevação de custos operacionais trazidos pela criminalidade. Nesse sentido, reforçou que o Congresso tem condições de criar instrumentos para reduzir arbitragens e ampliar a segurança jurídica necessária a investimento e planejamento de longo prazo.
O diagnóstico traçado no programa é claro. O Estado acumulou falhas que permitiram a infiltração das facções em cadeias críticas, distorcendo preços e corroendo a concorrência. A resposta proposta combina sufocamento financeiro, integração entre órgãos, atualização legal e centralidade na vítima, com execução contínua e sem concessões. “Para termos um mercado pujante, precisamos de um país mais seguro”, concluiu Marinho. A meta é simples e ambiciosa: punir os culpados, proteger quem produz e reconstruir um ambiente previsível para investir, inovar e crescer.
Manifesto BM&C News: combater o crime, proteger o mercado
A gravidade do problema levou a BM&C News, emissora referência na cobertura de economia, política e mercado financeiro, a lançar um manifesto institucional com posicionamento claro sobre o tema. Sob o slogan “Combater o crime, proteger o mercado”, o documento defende que é possível enfrentar o crime organizado sem criminalizar o mercado financeiro. O objetivo é jogar luz sobre os impactos econômicos do crime no Brasil e reforçar a importância de preservar um ambiente de negócios sólido, com segurança jurídica, previsibilidade e liberdade para investir e empreender.
O manifesto também enfatiza que a criminalidade mina a confiança, encarece custos e reduz a capacidade do setor produtivo de gerar empregos e riqueza. Nesse sentido, a BM&C News se compromete a ampliar o debate público, dar voz a especialistas e empresários, e apoiar iniciativas que reforcem a segurança como pilar para o desenvolvimento econômico sustentável.
Além dos impactos financeiros, a persistência da economia paralela ameaça a própria liberdade econômica no país. “Sem segurança, não há liberdade para empreender e investir”, reforça o manifesto da BM&C News.
O enfrentamento desse cenário, segundo especialistas, passa pela aprovação de medidas como o Pacote Brasil Mais Seguro, que inclui projetos de lei voltados ao endurecimento de penas, repressão financeira e combate ao mercado ilegal de jogos e apostas. A lógica é simples: reduzir o poder econômico do crime organizado é condição para recuperar competitividade, atrair capital e preservar empregos.
Ao comentar o manifesto editorial lançado pela BM&C, Marinho foi direto: “Criminosos devem ser presos, o mercado segue”. Para ele, mensagens que separam maus atores do tecido produtivo ajudam a qualificar o debate e a mobilizar apoio a reformas que atacam o financiamento das facções. Por outro lado, o uso político de operações pode comprometer investigações, como já ocorreu em episódios recentes, o que exige prudência na comunicação e foco técnico nas medidas.
Assista a entrevista na íntegra: