Em entrevista à BM&C News, Helena Veronese da B. Side Investimentos avaliou que o principal vetor de volatilidade para o câmbio nos próximos meses está no cenário doméstico. A economista destacou que, apesar de um quadro externo que favorece um dólar mais fraco de forma geral, o Brasil pode se descolar dessa tendência caso o debate eleitoral reascenda preocupações com a disciplina fiscal. Além disso, fatores sazonais de fim de ano costumam influenciar os fluxos, mas não alteram a direção de médio prazo.
Helena ressaltou que o balanço de pagamentos tem contado com investimento direto e diferencial de juros que ainda sustenta operações de carry trade. Por outro lado, a economia segue puxada pela demanda interna e o déficit em conta corrente cresceu, o que aumenta a sensibilidade do real a mudanças de percepção. Enquanto isso, o mercado monitora sinais sobre trajetória fiscal e comunicação de política monetária para calibrar o prêmio de risco embutido no dólar.
Quando a política pode pesar no câmbio
Segundo Helena, o gatilho mais relevante para uma mudança de tendência duradoura deve vir da precificação do ciclo eleitoral. A leitura é que essa precificação tende a ganhar intensidade no final do segundo trimestre do próximo ano, quando pesquisas e cenários começam a consolidar expectativas dos agentes. Até lá, choques externos de humor podem provocar oscilações, porém a direção estrutural continuará dependente da avaliação sobre o compromisso fiscal do próximo governo e da previsibilidade regulatória.
Além disso, Helena pondera que o mercado buscará diferenciar candidaturas que sinalizem reformas e âncora fiscal crível daquelas que ampliem dúvidas sobre gasto público. Caso prevaleça a percepção de maior risco fiscal, o real pode se afastar do movimento global de dólar enfraquecido. Sse a leitura for de agenda mais reformista e controlada, o Brasil pode capturar prêmio adicional e ver o câmbio apreciar além dos pares emergentes.
O que pode descolar o real do padrão internacional
Enquanto o cenário externo aponta para cortes de juros em grandes economias e um dólar mais fraco em termos amplos, Helena alerta que o Brasil não está blindado. A combinação de déficit em conta corrente maior, crescimento sustentado por demanda interna e necessidade de rolagem de fluxos exige disciplina fiscal para reduzir prêmios. Uma piora no humor global tende a afetar países com fundamentos mais frágeis, e o real entraria no radar se o fiscal doméstico voltar a preocupar.
A especialista observa que o investimento direto continua sendo um amortecedor importante. A manutenção de projetos de longo prazo, somada a um diferencial de juros ainda positivo, ajuda a mitigar choques de curto prazo. A direção firme do câmbio dependerá do grau de confiança do investidor na política econômica que será adotada a partir do próximo ciclo de governo.
O que muda até a virada do ano
Helena lembra que o fim de ano costuma trazer movimentos pontuais de remessas corporativas ao exterior. Esses fluxos podem gerar ruído adicional e pequenas pressões temporárias sobre a taxa, sem necessariamente redefinir tendência. A mensagem ao investidor é separar a sazonalidade dos sinais mais persistentes vindos da política e do fiscal. Nesse período, o foco recai sobre a comunicação das autoridades e a leitura dos agentes sobre a capacidade do país de entregar previsibilidade.
Para o investidor com exposição cambial, a recomendação é evitar decisões baseadas apenas em movimentos táticos de curto prazo. A orientação de Helena é construir proteções graduais e diversificar fontes de risco, privilegiando janelas de menor volatilidade para ajustar posições. Além disso, acompanhar pesquisas eleitorais, indicadores fiscais e métricas de balanço de pagamentos ajuda a calibrar cenários e faixas de referência para o dólar. A disciplina em rebalancear carteiras reduz o impacto de oscilações bruscas sobre o patrimônio.
Quais sinais devem orientar a leitura do câmbio:
- Progresso ou retrocesso na percepção fiscal com ênfase em trajetória de dívida e resultado primário
- Andamento das pesquisas eleitorais e sinalização de compromisso com reformas e regras estáveis
- Fluxos de investimento direto e sensibilidade do carry trade a mudanças no diferencial de juros
- Ambiente global com apetite por risco e força do dólar frente a moedas de emergentes
- Sazonalidade de fim de ano e eventuais remessas de empresas sem impacto estrutural
Câmbio no radar: o real pode ganhar força de forma sustentável
Nesse sentido, Helena aponta que um cenário benigno para o Brasil pressupõe uma combinação de sinais domésticos e externos. Do lado de fora, a continuidade de um dólar mais fraco favorece moedas emergentes. Do lado de dentro, a ancoragem fiscal e a previsibilidade regulatória formam o pilar para reduzir prêmios e, com isso, permitir que o real acompanhe ou até supere a valorização média dos pares. Enquanto isso, a recomendação é pragmatismo. Planos de proteção cambial bem definidos e revisados periodicamente blindam a carteira e evitam reações precipitadas a ruídos de curtíssimo prazo.
O debate sobre o timing da eleição e seus reflexos tornou o câmbio um termômetro sensível de confiança. A avaliação de Helena Veronese indica que a direção do real dependerá menos de choques isolados e mais da capacidade do Brasil de entregar um roteiro claro para a política econômica. Até lá, disciplina e gestão de risco seguem como as melhores aliadas do investidor.