O economista e pesquisador do Insper, Marcos Mendes afirma que as políticas fiscais adotadas pelo governo têm o potencial de desencadear uma nova crise fiscal, semelhante à enfrentada pelo Brasil durante o governo Dilma Rousseff. Ele alertou que a combinação de um arcabouço fiscal inconsistente, o aumento da dívida pública e o uso de receitas temporárias cria uma situação insustentável a médio prazo. “O Brasil depende fortemente de suas receitas de commodities, especialmente petróleo, e qualquer queda persistente no preço dessas commodities pode ser o gatilho de uma nova crise fiscal. Além disso, a falta de reformas estruturais, como a previdenciária e a administrativa, continua a travar o crescimento econômico”, pontuou Mendes no programa Strike, da BM&C News.
Mendes destaca que o governo tem recorrido a receitas não recorrentes, como a repatriação de capitais e programas de refinanciamento de dívidas (Refis), e está retirando despesas do cálculo do resultado primário. Ele alerta que, embora essas estratégias ajudem no curto prazo, elas não são sustentáveis e podem comprometer seriamente a credibilidade das contas públicas a longo prazo: “O governo está tentando entregar resultados no papel, mas sem efetivamente controlar os gastos”. Ele comparou essa abordagem com as “pedaladas fiscais” que marcaram o governo de Dilma Rousseff, em que despesas eram maquiadas para evitar o rompimento de regras fiscais. Na sua visão, o governo atual pode estar repetindo os mesmos erros do passado.
Outro ponto de destaque na fala de Mendes foi o crescente aumento da dívida pública, que ele estima chegar a 84% do PIB até o final deste governo, um salto de 12 pontos percentuais. A composição dessa dívida também está mudando, com os investidores buscando papéis indexados a juros ou à inflação, o que aumenta o risco de descontrole em cenários de alta de juros.
Mendes também abordou a recente decisão da agência de classificação de risco Moody’s, que elevou a nota de crédito do Brasil. Segundo ele, essa melhoria pode ter ocorrido mais pela deterioração de outros países do que por avanços reais no Brasil. Além disso, criticou a constante renegociação das dívidas dos estados, que segundo ele, incentiva a má gestão fiscal.
Uso do BNDES e Fundos Públicos para Mascarar a Dívida
Mendes também criticou o retorno do uso de grandes instituições como o BNDES para fomentar políticas parafiscais, uma prática recorrente em governos passados que gerou grandes prejuízos. Ele alertou que, atualmente, o governo está utilizando recursos de fundos públicos, como o Fundo Social, que deveria ser destinado a áreas como saúde e educação, para aumentar a capacidade de crédito do BNDES.
“Esses fundos são desviados para o BNDES, que oferece crédito a taxas subsidiadas. Embora isso ajude o governo a fechar as contas no curto prazo, representa um risco fiscal elevado, já que esses empréstimos não aparecem como despesa primária e podem gerar ainda mais subsídios ocultos, como vimos no passado”, afirmou o economista.
Ele destacou ainda que, em vez de usar esses fundos para abater a dívida pública, o governo está redirecionando os recursos para ampliar as operações do BNDES, o que ele vê como um retorno a práticas que já se mostraram ineficazes. “Estamos repetindo os erros do passado, quando o Tesouro utilizava esses mecanismos para mascarar os números fiscais, o que contribuiu para a crise entre 2014 e 2016.”