Antes de entrar nos números, convém estabelecer o pano de fundo: os Correios vêm de três anos
consecutivos de prejuízos — o prejuízo no 1º trimestre de 2024 já foi de R$ 802 milhões, superando o
prejuízo anual de 2023. Em 2022, a ECT reportou resultado líquido negativo de R$ 767 milhões. Em 2023,
mais R$ 596 milhões no vermelho. A empresa está operando em falência de modelo — não mais apenas
em ‘momentos desafiadores’.
Nos últimos 5 anos, os gastos operacionais e administrativos dos Correios dispararam. Provisões
trabalhistas e fiscais, terceirizações e despesas de manutenção são as principais causas. A linha de
benefícios pós-emprego tornou-se uma bomba contábil após a introdução do CPC 33, exigindo
provisionamento integral. Esse fator sozinho representa bilhões de reais em provisões, pressionando os
resultados.
A operação logística exige frota, centros de distribuição, combustível e peças — itens altamente sensíveis à
inflação e câmbio. A depreciação supera os investimentos realizados. Em outras palavras: a empresa está
se corroendo, e não se modernizando. Ao mesmo tempo, os gastos com terceirizações, serviços de TI,
segurança e limpeza seguem crescendo sem produtividade correspondente.
Como agravante, o controle de passivos contingentes e provisões fiscais é falho — como apontado pelo
TCU. O resultado é um acúmulo de despesas extraordinárias e imprevisíveis, que afetam diretamente a
margem operacional e a previsibilidade financeira da empresa.
Do lado da receita, a situação é tão ou mais grave. O segmento de correspondência tradicional segue em
queda estrutural. A concorrência no setor de encomendas é feroz — e os Correios não têm conseguido
manter participação relevante. Em 2023, o segmento postal teve queda de 9,65% sobre 2022.
Não há alavancagem operacional. Quando a receita cai, os custos não acompanham. A estrutura é pesada
e ineficiente. Não houve plano estratégico de modernização, nem digitalização de processos logísticos. Os
Correios operam com tecnologias ultrapassadas e sistemas de rastreamento ineficientes.
O resultado é uma empresa que gasta mais do que fatura, que perde mercado, e que agora pede um
empréstimo de R$ 20 bilhões — valor que, mesmo no cenário mais otimista, equivale ao seu próprio
valuation de mercado.
Sim: os métodos clássicos de valuation (DCF, múltiplos, NAV) colocam o valor de mercado dos Correios
entre R$ 6 e R$ 25 bilhões. Emprestar R$ 20 bilhões à ECT é, na prática, comprar 100% da empresa de
volta. Uma insanidade econômica, contábil e institucional.
A operação parece menos um plano de recuperação e mais um plano de salvamento eleitoral: cria um
colchão de recursos que pode facilmente ser convertido em capital político e gasto eleitoral, como vimos
com a Petrobras nos governos anteriores do PT.
Qual seria a alternativa racional? Implantar metas rigorosas de performance, condicionar o uso dos
recursos à reestruturação administrativa, reformar o modelo de provisões e gastos, abrir o capital ou
conceder operações logísticas deficitárias.
Sem isso, o empréstimo se torna esmola estatal — um cheque em branco pago por cada contribuinte, que
nunca verá retorno financeiro, nem logístico, nem institucional. O Estado está se tornando sócio
compulsório do fracasso — e o cidadão, refém da ineficiência.