Durante cinco séculos, o Ocidente exerceu um papel fundamental na governança global.Foi responsável por grandes descobertas, novas tecnologias e a formatação de uma ordem mundial baseada no império da lei. Criaram-se organizações internacionais, construiram-se fronteiras e se estabeleceu um cenário de maior tolerância, com a edificação de um arcabouço importante na questão dos direitos humanos. A humanidade evoluiu substancialmente, com o mundo atingindo um nível de prosperidade sem precedentes, embora ainda haja muito a melhorar.
A influência cultural do Ocidente se estendeu mundialmente. O padrão de vestuário, comportamento, educação e até religioso se imiscuiu nas mais variadas partes do globo. Por mais que alguns grupos tenham lutado para manter a sua identidade, não há como negar o enorme impacto que o estilo ocidental de vida tem tido. E, graças à língua inglesa, como um idioma quase franco global, a aproximação pelo conhecimento incrementou substancialmente.
No entanto, em que pesem estas importantes contribuições do Ocidente, há precisamente um século, o alemão, Oswald Spengler, publicava, em 1923, “O Declínio do Ocidente”. Spengler antevia uma perda de vitalidade cultural do Ocidente e a fatídica decadência, comparando este declínio à queda de civilizações como Egito, Grécia e Roma. Civilizações ascendem e declinam. Tudo é uma questão de tempo.
O Ocidente tem tentado manter-se relevante neste processo. Criou instituições que, de alguma forma, congelaram o processo de evolução da sociedade global. Criou-se, por exemplo, o Conselho de Segurança das Nações Unidas que reflete uma ordem mundial de sete décadas atrás. No entanto, esta tentativa não tem logrado impedir o ritmo de avanço do Oriente. A Ásia, particularmente a China, tem liderado o processo de transferência do eixo global do Atlântico para o Pacífico. Paulatinamente, observamos o Leste Asiático e o Sul da Ásia assumirem um papel cada vez mais significativo e de liderança na economia, política e cultura global.
O crescimento econômico levou a uma industrialização substancial da Ásia, incrementando a inovação, por meio de avanços significativos em tecnologia, particularmente na indústria eletrônica, robótica e de inteligência artificial. Com isto, a Ásia se tornou essencial nas cadeias de abastecimento global. Este novo papel aumentou, substancialmente, a relevância diplomática e geopolítica dos países asiáticos, impactando, inclusive, a vida cultural global. E logrou, ainda, melhorar substancialmente a qualidade de vida daquela região do mundo.
O fato é que, nas últimas décadas, o Ocidente parece ter-se dedicado a questões de menor relevância para a manutenção da sua posição. Enquanto a Ásia discute como incrementar a renda per capita, o Ocidente discute a liberação de drogas, cujo impacto negativo se fará sentir por gerações. Enquanto a Ásia discute Inteligência Artificial e Inovação Energética, o Ocidente discute a questão de banheiro para transgêneros. O Ocidente se perdeu nas últimas décadas. Não se sabe ainda se foi por preguiça, arrogância ou desídia. Só o tempo dirá.
Se o Brasil pretende ter alguma relevância no futuro e se afastar deste declínio irreversível, que tal enterrarmos esta agenda ideológica depauperada para discutir o que, realmente, importa?
*Marcus Vinícius De Freitas é professor visitante da China Foreign Affairs University e senior fellow da Policy Center for the New South
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