No livro “E o cérebro criou o homem”, escrito por António Damásio, as trilhas dos circuitos neurais são percorridas pelo autor para explorar a complexa noção de consciência, a qual ele define como “self”. Essa jornada intelectual empreendida por Damásio proporciona uma visão estimulante, investigando a criação de uma entidade que, mesmo não sendo separada do corpo, emerge dele: o eu.
A busca pela compreensão da própria existência e suas limitações é uma inclinação inerente ao ser humano. Embora o cérebro possa gradualmente nos brindar com algumas respostas ao longo dessa busca, o que temos até o momento, grosso modo, é unicamente o produto da nossa capacidade neural: as habilidades, tais como de raciocinar, produzir, inovar, desafiar etc. Um objeto proeminente dessa habilidade é o discurso, uma faculdade que é distintivamente humana.
Ao longo da história, a sociedade sempre se organizou por meio do discurso, desde os tempos em que monarcas, papas, ditadores e imperadores moldavam a estrutura social por meio de palavras escritas e orais. Em alguns países, essa realidade perdura até os dias atuais. O cerne dessa observação é que o discurso atua como uma força concretizadora da vontade humana. Nietzsche, por exemplo, nomeou essa manifestação como “vontade de potência”, o anseio inerente ao ser humano de se manter no poder ou de alcançá-lo.
Nos tempos contemporâneos, principalmente nas democracias, o discurso desempenha um papel crucial ao dar forma à figura do político. Os tempos em que os descendentes dos colonizadores portugueses no Brasil eram automaticamente herdeiros do trono já passaram. Agora, é imperativo que um indivíduo, a fim de ascender ao poder, estabeleça estratégias eficazes em campanhas políticas através de diversos meios de comunicação. Essa habilidade é essencial para projetar uma imagem de liderança capaz de guiar o destino da nação e de seus concidadãos.
António Damásio, ao explorar as complexas conexões entre o cérebro e a consciência, lança luz sobre o intrincado processo pelo qual os circuitos neurais não apenas criaram o homem, mas também desempenharam um papel crucial na construção da figura do político moderno. É um lembrete vívido de como nossa capacidade de articulação e persuasão, enraizada na atividade cerebral, moldou e continua a moldar o curso da história e da política.