
O presidente do Banco Mundial, David Malpass, anunciou no dia 15 de fevereiro que planeja renunciar um ano antes de seu mandato terminar. Ele deixará o cargo em 30 de junho, fim do ano fiscal do Banco Mundial, após mais de quatro anos no cargo. Em seu comunicado declarou que “foi uma enorme honra e privilégio servir como presidente da principal instituição de desenvolvimento do mundo”, destacando ainda que “com os países em desenvolvimento enfrentando crises sem precedentes, estou orgulhoso de que o Grupo do Banco tenha respondido com velocidade, escala, inovação e impacto”.
Este anúncio inesperado do indicado pelo governo Trump ocorreu após quatro anos liderando a instituição em várias crises sobrepostas, como a pandemia de COVID-19, a guerra na Ucrânia, a crise alimentar global e, mais recentemente, o terremoto na Turquia e na Síria.
Na época, a indicação de Malpass foi recebida com ceticismo no setor de desenvolvimento global e ocorreram vários esforços para derrubá-lo, especialmente por ativistas climáticos, atingindo o ponto alto em setembro de 2022, quando enfrentou críticas após se recusar a confirmar durante um painel climático se aceitava o consenso científico de que a queima de combustíveis fósseis estava aquecendo perigosamente o planeta. Depois de diversas apreciações negativas muitos opositores pediram sua renúncia. Apesar das avaliações contrárias lançadas, claramente o Banco dobrou seu financiamento climático durante seu mandato, atingindo quase US$ 32 bilhões em 2022.
Após a repercussão, Malpass declarou que não era um “negacionista” e afirmou que as emissões de combustíveis fósseis estão “claramente” contribuindo para o aquecimento global.
A questão climática é claramente importante, porém, também deve-se considerar que o grande peso a ser colocado neste tema não pode afastar o foco de seu objetivo central de ajudar os países em desenvolvimento a fortalecer suas economias, criar resiliência contra futuras pandemias, reduzir a desigualdade e aliviar o peso das dívidas. E, caso ocorra este afastamento gerado por concentrar os esforços no clima, o resultado será uma maior fragmentação do sistema multilateral, com os países buscando cada vez mais alternativas em instituições como o Banco Asiático de Infraestrutura e Investimento.
Em comunicado oficial, a secretária do Tesouro dos EUA, Janet Yellen, elogiou Malpass por ter “melhorado consideravelmente a vida das pessoas em todo o mundo” e prometeu ter um “processo de nomeação rápido, transparente e baseado no mérito” para substituí-lo.
A sua gestão não foi o desastre que muitos de seus críticos imaginaram que seria quando foi nomeado por Trump, independentemente do fato de ele não ter feito nada diferente. Em realidade, desde James Wolfensohn (1995-2005), nenhum presidente deixou uma marca com gestão inovadora ou algo a ser sobrelevado.
Ao que tudo indica, os EUA já decidiram quem vai presidir o Banco Mundial. Rajiv Shah, que dirige a Fundação Rockefeller e foi chefe da Agência Americana para Desenvolvimento (USAID), é o grande favorito para ocupar o cargo.
Além de Shah, vários outros candidatos e candidatas dos Estados Unidos estão sob cogitação para a Presidência no Banco Mundial, que incluem: Samantha Power, atual chefe da USAID e ex-embaixadora dos EUA na ONU; Gayle Smith, que coordenou a resposta global norte-americana à Covid-19 e agora dirige a One Campaign, o grupo de lobby de desenvolvimento criado por Bono e Bob Geldof; e Wally Adeyemo, vice de Yellen no Tesouro dos Estados Unidos, responsável pela coordenação do esforço internacional para impor sanções ao Kremlin após a invasão da Ucrânia pela Rússia.
Paralelamente, existem muitas críticas pelo fato de os EUA sempre indicarem o Presidente do Banco Mundial, mas assim tem sido desde que o Banco e o Fundo Monetário Internacional foram criados, quando a Segunda Guerra Mundial estava chegando ao fim. Foi feito um acordo em que os europeus escolheriam o diretor-gerente do FMI, enquanto os americanos ficariam com o Banco.
No entanto, para Kevin Watkins, ex-chefe da instituição de caridade Save the Children, a indicação está inadequada, pois na sua avaliação esta “será uma nomeação do Tesouro dos EUA, o que é ultrajante. Deve haver uma busca global pelo melhor candidato”. Além dele, o chefe de política de desigualdade da Oxfam, Max Lawson, acredita que “Joe Biden deve apoiar um processo de recrutamento aberto totalmente transparente para mostrar ao mundo que seu governo é diferente”.
Complementar a esses comentários, Justine Greening, ex-secretária de desenvolvimento internacional do Reino Unido, também declarou que há um forte argumento para que uma tradição que remonta à fundação do Banco Mundial e do FMI em 1944 seja quebrada.
Nesse sentindo, começa a surgir um movimento para que Mia Mottley, a primeira-ministra de Barbados, possa ser a candidata do mundo em desenvolvimento. Ela foi responsável pela Iniciativa de Bridgetown – um plano para a reforma do financiamento do desenvolvimento que envolveria o alívio automático da dívida de países afetados por pandemias ou desastres naturais e um novo mecanismo para canalizar o investimento do setor privado para a mitigação climática.
Fala-se muito que há pouco futuro na tentativa de enfrentar problemas da década de 2020 com instituições criadas na década de 1940, tanto que apoiadores de Biden indicam que é hora de repensar a forma como o Banco opera e se as instituições multilaterais são adequadas ao seu propósito.
Caso os EUA concordem em romper com a tradição, também foram ventilados os nomes de Raghuram Rajan, ex-governador do Banco Central da Índia e ex-economista-chefe do FMI; e José Antonio Ocampo, ministro da Fazenda da Colômbia.
No entanto, acreditar que os EUA concordem em renunciar a indicação da Presidência do Banco Mundial parece ser uma perspectiva utópica e tende a estagnar como uma tentativa de pressão vestida com retórica da governança global, mais do que com propostas práticas de reformas visando fortalecer o trabalho institucional para dar-lhe maior eficácia.
Fica a dúvida: caso o cidadão de um país em desenvolvimento seja efetivamente indicado à Presidência, isso significará uma mudança significativa nos rumos institucionais? Não necessariamente, uma vez que esta pode ser uma escolha apenas pró-forma se ela não estiver aliada a um plano de reestruturação institucional transparente. A questão é que dificilmente os EUA abrirão mão de sua influência sobre o Banco Mundial.