
Os melhores dias do Ocidente já estão no passado. Os países europeus enfrentam um declínio contínuo e a Guerra da Ucrânia evidenciou as vulnerabilidades do Velho Continente. Os Estados Unidos, polarizado politicamente desde os tempos do Presidente Bill Clinton, já não têm a mesma relevância global, e a sustentabilidade de sua posição hegemônica está baseada somente na questão militar e no dólar como moeda global. A América Latina persiste em repetir as fórmulas e erros do passado, escrava de uma eterna subserviência às antigas colônias e incapaz de inovar sua economia. E a África, a última fronteira do desenvolvimento, precisa sobrepujar o aprisionamento intelectual de suas elites à dependência europeia.
O século XXI, paulatinamente, vai-se transformando no século asiático. Não poderia ser diferente: os países asiáticos têm a maior parte da população mundial, têm crescido substancialmente nas últimas décadas, e desde a Crise Financeira Asiática, reduziram muito da sua dependência do Ocidente. A ascensão da China, historicamente a maior potência econômica global por dezoito séculos, não deveria causar surpresa, particularmente observando as várias políticas implementadas pelo país para rejuvenescer o pensamento e as perspectivas da civilização milenária.
A resposta do Ocidente ao declínio – ao invés de fazer uma auto-reflexão e alterar seus rumos – tem sido a de combater e tentar dividir a Ásia, na já tradicional estratégia de “dividir para conquistar”. O Ocidente planta sementes de discórdia, constrói alianças militares e dissemina estereótipos e falsidades sobre os países da região, singularmente a China, tentando reproduzir a política de contenção adotada durante a Guerra Fria. Os asiáticos já compreenderam, no entanto, que o Ocidente não tem mais recursos para manter a retórica. Sem dinheiro, o Ocidente não tem poder de fogo ou convencimento. Por isso, o sopro do vento da história parece irreversível em alterar o centro do Atlântico para o Pacífico, favorecendo a Ásia como a força motriz do século XXI.
Nesta década e na próxima, os países asiáticos – especialmente a China – consolidarão, de fato, a posição de destaque e liderança no cenário global. Na Ásia se encontram 3 das 4 maiores economias globais em termos de paridade de poder de compra: China, Índia e Japão. Na Ásia se encontra a maior parte da população mundial. Atualmente, a Ásia responde por 39% do PIB global. Desde 2010, a Ásia é a maior economia continental, após ter ultrapassado a Europa. Segundo um relatório da McKinsey (Setembro/2019), a Ásia ascenderá de 23% do total do consumo global para 39% em 2040.
A forma desastrada como tratou da Covid-19 deveria ter acendido várias luzes vermelhas no Ocidente. Poucos países ocidentais trataram a Covid-19 como uma questão de política pública – e não ideológica ou de disputa global de poder. Como resultado, a pandemia vem derrubando governos, castigando políticos e empresários que não a trataram com a devida seriedade, e preocupando, ainda mais, pelo impacto econômico que tem em virtude da falta de planejamento do dia seguinte. A Guerra da Ucrânia não é a principal culpada pelo cenário econômico atual, mas sim a falta de planejamento e de lideranças capazes de retomar o crescimento.
Para manter o poder, o Ocidente tem-se revelado refratário em promover alterações nos organismos globais pós-Segunda Guerra Mundial, numa frustrante tentativa de perpetuar uma ordem política global que já não corresponde à realidade, diante da emergência significativa de vários países, inclusive do próprio Brasil. A ordem liberal global, como presentemente constituída, terá de ser reformulada para acomodar a nova realidade asiática. Se mantida a atual inflexibilidade e ausência de interesse efetivo de mudança não haverá outra opção senão criar novas instituições adaptadas às novas circunstâncias globais. O BRICS é uma dessas instituições a ser consolidada e é importante para o Brasil, pois oferece um lugar paritário à mesa, algo que o G7 jamais dará ao País.
O Brasil, se estratégia tiver, deveria aproveitar o século asiático e aproximar-se da região e da China cada vez mais. A título de exemplo, menciono três oportunidades importantes ao setor agropecuário: (i) a China pretende alcançar um PIB per capital de US$ 20 a 25 mil em 2049; (ii) a China mudou a política de “Um Só Filho” para, pelo menos, três; e (iii) as mudanças climáticas deverão reduzir a produção agrícola no país asiático. Estas três situações, extremamente disruptivas globalmente, oferecem ao Brasil um oceano de possibilidades de crescimento econômico. Obviamente que se o relacionamento sino-brasileiro for melhor, maiores oportunidades advirão. Mas o País poderá perder maiores oportunidades se persistir na cartilha ideológica atual ou na subserviência intelectual.
O futuro está na Ásia. Ignorar essa realidade será um enorme equívoco, com um impacto profundo sobre o futuro do Brasil como país e líder global. A acuidade da estratégia revelará uma visão clara quanto aos objetivos de longo prazo do Estado brasileiro. Menos Europa, menos Estados Unidos, e muito mais Ásia.
*Marcus Vinícius De Freitas, professor visitante, China Foreign Affairs University. Senior Fellow, Policy Center for the New South