No coração do interior da Bahia, o Povoado do Lagoão resiste como um guardião dos modos de vida rurais. A comunidade, inserida no município de Boa Nova, oferece um panorama rico sobre como a agricultura familiar, a medicina natural e as adaptações religiosas moldam a identidade do sertão baiano.
Onde fica o Povoado do Lagoão e o que move sua economia?
O povoado está situado a 28 km do centro de Boa Nova e a apenas 6 km do distrito de Valentim, em uma região distante cerca de 350 km de Salvador. A geografia local é marcada por um relevo acidentado no sopé de morros elevados, cercado pela vegetação nativa preservada sob o céu azulado do sudoeste baiano.
A base de sustentação da comunidade é a agricultura familiar. O solo fértil da região permite o cultivo diversificado de cacau, laranja e mandioca, que coexistem com pequenos rebanhos bovinos. Além da produção agrícola, o potencial ecoturístico é forte: o município possui mais de 40 quedas d’água. A Cachoeira do Lagoão, especificamente, destaca-se pela acessibilidade (próxima à estrada de terra) e pela beleza de seu paredão rochoso íngreme, que forma poços profundos ideais para o lazer dos moradores.@BoaSorteViajante

Quantos habitantes vivem no Lagoão?
Estima-se que o Povoado do Lagoão abrigue cerca de 300 moradores. É uma comunidade pequena e unida, característica típica da zona rural do município de Boa Nova, que possui uma população total de aproximadamente 13.690 habitantes (Censo IBGE 2022).
Essa escala reduzida reforça o clima de “todo mundo se conhece” descrito nos relatos, onde as tradições são mantidas coletivamente e a segurança é um ponto forte, permitindo que as crianças brinquem livremente e as portas permaneçam abertas.
Quais plantas nativas transformam o quintal em farmácia viva?
No Lagoão, a medicina popular não é apenas um costume, mas uma ciência empírica passada entre gerações, com fortes raízes na ancestralidade indígena. Os quintais das casas funcionam como laboratórios naturais, onde espécies comuns convivem com plantas de alto valor terapêutico local.
Entre as espécies utilizadas para a produção de xaropes caseiros e “lambedores”, destacam-se o café-beirão e o tio (ou tioó). As receitas tradicionais para tratar males respiratórios são complexas e utilizam uma sinergia de ingredientes que inclui o coração da banana, hortelã-grosso, alho, cebola roxa, casca de anjico, casca de manga espada e folhas de acerola, demonstrando um profundo conhecimento botânico da flora local.
No canal “Boa Sorte Viajante – Matheus Boa Sorte”, com 845 mil inscritos, é apresentado o povoado do Lagoão, a 28 km de Boa Nova (BA), no sopé de morros com cachoeiras, agricultura de cacau e mandioca, e vida simples em ruas de terra. Veja no vídeo a seguir:
O que torna a culinária sertaneja de Boa Nova tão especial?
A gastronomia do povoado reflete a disponibilidade dos ingredientes cultivados na própria terra e o uso predominante do fogão a lenha, que confere um sabor defumado característico aos pratos. A dieta local valoriza o aproveitamento integral dos alimentos e o tempo de preparo.
Três pratos se destacam como símbolos dessa cozinha regional:
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Rabada caramelizada: Diferente de versões ensopadas, a técnica local envolve cozinhar a carne e deixar o caldo secar lentamente até caramelizar, criando um sabor intenso sem excesso de líquido.
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Cortadinho de mamão verde: Um acompanhamento típico que aproveita a fruta antes da maturação.
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Feijão andu farofado: O uso do andu, leguminosa resistente à seca, é um pilar da alimentação local.
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Por que o tradicional caruru de Cosme e Damião virou uma festa de doces?
Uma das manifestações culturais mais curiosas do Lagoão é a adaptação das festividades de São Cosme e São Damião. Enquanto na maior parte da Bahia a tradição exige a oferta de caruru (prato salgado à base de quiabo e azeite de dendê), no povoado consolidou-se, há mais de 30 anos, o “Cariru de Doce”.
Nesta celebração singular, o vatapá e o caruru dão lugar a uma mesa farta de confeitaria sertaneja. O protagonista é o doce de leite com coco artesanal, produzido em escala comunitária (chegando a 50 litros de leite por festa). O banquete é complementado por bolos, biscoitos, arroz doce e mingau, atraindo visitantes de municípios vizinhos como Itagibá e Dário Meira, e ressignificando o sincretismo religioso através do açúcar em vez do dendê.

