O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), concedeu nesta quarta-feira (3) uma liminar que restringe quem pode apresentar pedidos de impeachment contra integrantes da Corte e altera o quórum necessário para abertura do processo no Senado.
A decisão suspende trechos da Lei 1.079/1950, que permitia que qualquer cidadão protocolasse denúncias por crime de responsabilidade.
Com a mudança, apenas a Procuradoria-Geral da República (PGR) poderá propor pedidos de impeachment contra ministros do STF. Gilmar também determinou que o Senado só poderá admitir o processo com o apoio de dois terços dos parlamentares, e não mais por maioria simples, como prevê a legislação em vigor.
O ministro afastou ainda a possibilidade de que o mérito de decisões judiciais seja utilizado como fundamento para denúncias de crime de responsabilidade. Segundo ele, permitir que julgamentos sejam usados como justificativa para abertura de processos disciplinares cria risco de intimidação indevida ao Poder Judiciário.
Em sua decisão, Gilmar afirmou que o impeachment “abusivo” pode se transformar em instrumento de pressão política sobre magistrados. “Os juízes, temendo represálias, podem se ver pressionados a adotar posturas mais alinhadas aos interesses políticos momentâneos, em vez de garantirem a preservação dos direitos fundamentais”, escreveu.
O decano também classificou como “esdrúxula” a possibilidade de que apenas 11 votos sejam suficientes para admitir uma denúncia no Senado caso a maioria dos parlamentares se abstenha. Para ele, o quórum de maioria simples não é compatível com a Constituição quando o objeto é o afastamento de ministros da Suprema Corte.
O tema será analisado pelo plenário do Supremo no julgamento virtual marcado entre os dias 12 e 19 de dezembro. Até lá, a liminar permanece em vigor.
Competência do STF e respaldo constitucional da decisão
Para o advogado e constitucionalista Guilherme Favetti, a decisão do ministro Gilmar Mendes produz efeitos que vão além da discussão jurídica e alcançam o equilíbrio institucional entre os Poderes. Favetti explica que, embora a liminar seja incomum por praticamente esgotar o mérito na fase inicial do processo, ela possui respaldo constitucional, já que a Constituição de 1988 atribui ao Supremo Tribunal Federal a função de revisar a compatibilidade de leis anteriores ao texto constitucional e garantir a independência da magistratura.
Segundo ele, a Corte tem competência para interpretar se dispositivos da Lei do Impeachment, editada sob a Constituição de 1946, foram ou não recepcionados pela ordem constitucional atual.
Impacto da liminar no equilíbrio entre STF e Senado
O especialista afirma que a decisão altera diretamente o peso institucional do Senado, ao substituir o quórum de maioria simples pelo de dois terços para a abertura de processo contra ministros do STF, o que cria um novo arranjo de forças entre Judiciário e Legislativo.
Para Favetti, esse movimento tende a ser interpretado pelos senadores como uma captura de prerrogativas, já que o Supremo redefine critérios de um processo cuja condução sempre coube ao Senado. Ele avalia que a reação política deve surgir em duas frentes: uma exposição pública do conflito, com discursos e debates em plenário, e uma possível resposta legislativa, que só poderia ocorrer por meio de uma proposta de emenda à Constituição.
Um conflito exclusivo entre Judiciário e Legislativo
Favetti ressalta que o Executivo não está inserido nesse confronto específico. Ele classifica o cenário atual como uma disputa direta entre STF e Senado Federal, lembrando que uma das ações foi proposta pela Associação dos Magistrados do Brasil (AMB), entidade que atua historicamente na defesa das prerrogativas da magistratura.
Esse alinhamento reforça a percepção de que o Judiciário se antecipa a um ambiente político mais incerto, especialmente considerando mudanças esperadas na composição do Senado a partir de 2027.
Exclusividade da PGR e o alcance da fiscalização
Sobre a exclusividade da PGR para apresentar pedidos de impeachment, o advogado entende que a medida não elimina a fiscalização social, pois qualquer cidadão poderá provocar o procurador-geral. Favetti aponta que, nos últimos anos, houve abusos e instrumentalização política de pedidos de impeachment em diversos países, com tentativas de pressão sobre cortes constitucionais. Nesse sentido, a decisão funciona como uma blindagem institucional, tanto para ministros atuais quanto para futuros integrantes da Corte.
Ele lembra ainda que o Congresso já debateu iniciativas para limitar o alcance das decisões do STF, o que indica que a tensão entre os Poderes deve continuar nos próximos meses. Para Favetti, a liminar intensifica a disputa institucional, mas está inserida dentro das competências que a própria Constituição atribui ao Supremo Tribunal Federal.
A avaliação do especialista o movimento deve ampliar a disputa entre Senado e Judiciário. Para ele, o tema tende a voltar ao debate legislativo e reacender discussões sobre limites e prerrogativas dos Poderes.












