Os Estados Unidos anunciaram nesta quinta-feira (20) a retirada da sobretaxa adicional de 40% aplicada a uma lista relevante de produtos brasileiros, incluindo carne bovina, café, frutas, cacau, açaí e madeira. A medida tem efeito imediato e retroativo, valendo para todas as mercadorias retiradas de armazéns a partir de 13 de novembro. Exportadores que pagaram a tarifa nesse intervalo poderão solicitar reembolso ao U.S. Customs and Border Protection.
Com o fim da sobretaxa, produtos que chegaram a enfrentar tarifa total de até 50% voltam a entrar no mercado americano sem cobrança adicional. A decisão encerra um ciclo de sucessivas mudanças tarifárias implementadas ao longo de 2025 pela Casa Branca, que havia elevado as barreiras em julho e retirado apenas parte delas na semana passada.
Linha do tempo das tarifas impostas aos produtos brasileiros
- Em abril, o governo Trump instituiu uma tarifa global de 10% para diversos países, incluindo o Brasil;
- Em julho, a Casa Branca aumentou a pressão e criou uma sobretaxa adicional de 40% especificamente sobre itens brasileiros, atingindo cerca de 80% do agronegócio;
- Na semana passada, em 14 de novembro, o governo americano revogou a tarifa de 10%, mas manteve os 40%;
- Agora, em 20 de novembro, a administração norte-americana zerou a sobretaxa, removendo quase todas as barreiras extras aplicadas ao Brasil.
Motivações econômicas e políticas do fim das tarifas
Para Gustavo Sung, economista-chefe da Suno Research, a retirada da tarifa está diretamente ligada ao comportamento dos preços nos EUA. Ele aponta que o mercado americano enfrenta pressão sobre alimentos importados, um grupo de produtos para o qual o país possui baixa produção interna. “Ao retirar as tarifas, o governo busca estabilizar preços domésticos e evitar repasses inflacionários”, afirma.
A avaliação é compartilhada por Roberto Dumas, mestre em economia. Segundo ele, a medida está relacionada ao receio de aceleração inflacionária. “Essa retirada de tarifa é medo do tarifaço gerar pressões inflacionárias nos Estados Unidos”, afirma. Para Dumas, a decisão não tem relação com estratégia de aproximação bilateral com o Brasil. “É puramente interesse dos Estados Unidos de arrumar a inflação dentro de casa.”
O componente político também pesa. Para Igor Lucena, economista e doutor em relações internacionais, a baixa popularidade de Trump e o impacto das eleições recentes impulsionam medidas de alívio ao custo de vida. “Ele não quer ver esse efeito negativo se repetir nas eleições de midterm. Reduzir o preço de groceries é uma forma direta de aliviar pressão sobre o consumo”, avalia.
Segundo Lucena, a decisão não deve ser vista como movimento permanente. “O Trump é volátil. Não acredito que isso seja fixo. Tarifas podem voltar”, afirma.
Impactos para o Brasil
Com a retirada da sobretaxa, exportadores retomam a competitividade perdida desde agosto. Produtos como café, carne, frutas e madeira voltam a concorrer em condições mais equilibradas com países que também tiveram tarifas reduzidas em rotações recentes.
Sung observa que setores que sofreram queda nos embarques após o tarifaço devem registrar retomada gradual. Empresas do agronegócio, que já haviam diversificado mercados e ajustado logística nos últimos meses, passam agora a operar com custos menores e previsibilidade maior.
Lucena destaca que o momento deve ser aproveitado para recuperar espaço, mas recomenda cautela. Para ele, exportadores e governo precisam investir em lobby internacional e em maior atuação empresarial nas câmaras de comércio. “Essa vitória vem muito mais do trabalho do empresariado brasileiro nos EUA do que do governo. O Brasil precisa regulamentar o lobby e fortalecer sua paradiplomacia econômica”, afirma.
Visão estratégica e caminho adiante
Na leitura de Dumas, a medida faz parte de uma tentativa da Casa Branca de administrar a inflação e evitar dilemas adicionais para o Federal Reserve, que já sinalizou incerteza sobre futuros cortes de juros. Segundo ele, o risco de o IPCA americano subir de 3% para 3,5% aumenta a sensibilidade política de decisões tarifárias.
Associações do agronegócio aguardam orientações sobre compensações e ajustes aduaneiros decorrentes da mudança, o que deve definir a velocidade de retomada dos embarques. Com tarifa zero, a expectativa é de que os fluxos comerciais avancem ao longo das próximas semanas, especialmente no complexo de proteínas, nos cafés especiais e em frutas.
A retirada da tarifa devolve margem e competitividade ao produtor brasileiro, ao mesmo tempo em que alivia a pressão inflacionária nos Estados Unidos, fator central apontado pelos especialistas entrevistados pela reportagem.
















