Por Carlos Castro*
A digitalização do sistema financeiro brasileiro é, sem exagero, uma referência global. O Pix consolidou-se como um dos casos mais bem-sucedidos de pagamento instantâneo no mundo. O que antes levava dias e envolvia tarifas, hoje ocorre em segundos, com custo praticamente nulo. A inclusão bancária avançou. A eficiência do sistema melhorou. Mas a expansão digital também trouxe uma nova superfície de ataque: a engenharia social.
Frequentemente, o noticiário tem sido tomado por casos de fraudes via Pix, vazamento de dados bancários, e roubos milionários cometidos sem invasão de sistemas, apenas com manipulação psicológica. O Brasil já figura entre os países com maior incidência de crimes cibernéticos direcionados a indivíduos e instituições financeiras.
É importante reconhecer: as estruturas tecnológicas estão evoluindo. Bancos e fintechs investem em criptografia de ponta, autenticação biométrica, algoritmos antifraude, monitoramento em tempo real. O Banco Central mantém uma agenda regulatória ativa sobre segurança cibernética. Mas mesmo com toda essa infraestrutura técnica, os golpes persistem — e se multiplicam. Por quê?
Porque o vetor de ataque mais explorado hoje não é o sistema. É o usuário.
O elo fraco da segurança digital é o comportamento humano
A analogia com a segurança predial ajuda a entender o fenômeno. Imagine um condomínio com portões eletrônicos, câmeras, fechaduras inteligentes, controle de acesso. O criminoso não pula o muro. Ele aperta o interfone, diz que é prestador de serviço, menciona o nome de um morador — e o porteiro, com boa-fé, abre a porta.
É assim que a engenharia social opera. Ela não exige brecha técnica. Ela explora comportamentos previsíveis, emoções humanas e falhas de julgamento sob pressão.
Exemplos recorrentes de golpes por engenharia social:
- Falso funcionário do banco: golpistas se passam por agentes de segurança da instituição financeira. Alegam movimentações suspeitas e pedem “validação” via transferência ou código.
- Golpe do Pix por engano: o fraudador faz uma transferência e solicita devolução. No entanto, a transação inicial já envolvia fraude, e a devolução agrava o prejuízo da vítima.
- QR Codes adulterados: em boletos falsificados, o código leva o pagamento para um destinatário fraudulento.
- Clonagem de WhatsApp: o criminoso assume o perfil da vítima e solicita transferências emergenciais a contatos próximos.
- Phishing com e-mails idênticos aos de instituições oficiais: o usuário é induzido a clicar em links maliciosos e inserir suas credenciais em páginas falsas.
Esses golpes têm uma característica em comum: não há quebra de segurança tecnológica. O que se rompe é a confiança da vítima.
Dez práticas para mitigar riscos no dia a dia
Para lidar com esse cenário, é fundamental estabelecer comportamentos de defesa claros. A seguir, um conjunto de medidas práticas que reduzem substancialmente a exposição:
- Desconfie de solicitações urgentes ou alarmistas — golpistas usam o senso de urgência como arma. Nenhuma decisão financeira legítima exige ação imediata por telefone ou mensagem.
- Evite clicar em links enviados por terceiros — priorize sempre o acesso direto ao site ou aplicativo da instituição.
- Verifique os dados antes de concluir um Pix — confirme o nome e a instituição financeira do destinatário.
- Não atenda chamadas de números desconhecidos que se identificam como banco — encerre a chamada e ligue diretamente para o canal oficial. Assim você elimina o risco.
- Habilite autenticação em duas etapas (2FA) — especialmente em apps bancários, carteiras digitais, e-mails.
- Jamais compartilhe códigos enviados por SMS ou aplicativo — nem mesmo com atendentes supostamente “oficiais”. Bancos não solicitam esse tipo de dado.
- Mantenha sistemas operacionais e aplicativos atualizados — atualizações corrigem vulnerabilidades conhecidas.
- Instale soluções antivírus e anti-malware em dispositivos pessoais — especialmente em smartphones, hoje o principal ponto de acesso ao sistema financeiro.
- Use senhas robustas para cada serviço — o reaproveitamento de credenciais, ou seja, usar senhas únicas, é um erro comum e crítico.
- Monitore suas movimentações financeiras com frequência — detecção rápida é essencial para reversão de fraudes.
A engenharia social não é um risco tecnológico. É um risco comportamental. Ela se adapta, evolui e se alimenta da desatenção, da pressa, da confiança. O sistema financeiro pode — e deve — investir em segurança digital de ponta. Mas nenhuma tecnologia será suficiente se o usuário final não tiver consciência do seu papel na cadeia de segurança.
A proteção mais eficaz ainda é a informação. E a disposição de adotar uma postura ativa de defesa. A transformação digital só será, de fato, um avanço quando vier acompanhada de maturidade no seu uso.
*Coluna escrita por Carlos Castro, planejador financeiro pessoal, CEO e sócio fundador da plataforma de saúde financeira SuperRico
As opiniões transmitidas pelo colunista são de responsabilidade do autor e não refletem, necessariamente, a opinião da BM&C News. Leia mais colunas de opinião aqui.