Na semana passada, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva ainda estava sob os efeitos da pesquisa que revelou a recuperação de sua aprovação junto à população brasileira. Outro acontecimento que elevou sua autoestima foi a aprovação por unanimidade do projeto que isentou de imposto de renda quem ganha até R$ 5.000,00 mensais. Com o amor-próprio nas alturas, durante uma cerimônia em comemoração ao Dia dos Professores, o presidente se entusiasmou além da conta e disse que o Congresso atual era o mais medíocre dos últimos tempos (Hugo Motta, presidente da Câmara, estava logo atrás dele no palco).
Por conta disso, não se pode dizer que Lula esteja em lua de mel com o Parlamento.
É neste contexto que o presidente indicou o deputado Guilherme Boulos para a Secretaria-Geral da Presidência. O ministro-chefe dessa pasta tem papel central na articulação política e institucional entre o Executivo e os demais Poderes, especialmente o Congresso Nacional, gerindo a agenda de encontros do presidente com partidos, bancadas e líderes parlamentares.
Confiar essa missão ao parlamentar do PSOL deve agravar a crise de diálogo com o Legislativo. Que foi agravada nos últimos meses pelo próprio Lula. Afinal, foi ele quem afirmou que “quem é deputado sabe que o Congresso nunca esteve tão ruim quanto hoje, com gente que não está qualificada para ser deputado, a não ser para fazer provocação e pergunta com o desgraçado do celular na mão”.
Como o Planalto pode se aproximar dos congressistas se o chefe do Executivo faz questão de insultar seus interlocutores?
Colocar Boulos nesse papel pode piorar ainda mais a equação. A nomeação insere no coração do governo um personagem cuja história profissional é marcada por confrontos violentos de narrativa entre ricos e pobres — algo que Boulos e o presidente têm em comum. Em vez de buscar um mediador capaz de restaurar minimamente a confiança mútua, Lula sinaliza que pretende aprofundar o antagonismo social, agora com o poder formal de articular diretamente com o Legislativo e setores da sociedade civil. Estamos falando de um parlamentar que escreveu o seguinte em julho deste ano: “O país não pode continuar parado porque centrão e extrema-direita escolheram proteger privilégios dos bilionários enquanto milhões sofrem para sobreviver.”
Num momento em que o governo precisa aprovar reformas, recompor alianças e conter o desgaste político, entregar a articulação a um militante do confronto parece ser um gesto de autossabotagem. Lula, embalado pela alta recente na aprovação, parece ter subido no salto alto e confundido popularidade (que nem é tão alta assim) com força institucional. Ao delegar a interlocução com o Congresso a um crítico feroz da elite política, o presidente não apenas ignora a realidade do jogo legislativo — ele aposta na radicalização como método de governo. É o retrato de um Executivo que escolheu o conflito como bússola.