Em meio ao retorno do fluxo estrangeiro e a um ambiente global ainda volátil, o Ibovespa volta ao centro do debate com projeções que falam em 150 mil pontos até o fim do ano. Para Marco Saravalle, CIO da MSX Invest, a discussão precisa separar drivers de curto prazo daqueles que realmente sustentam valor no horizonte mais longo. Além disso, o investidor deve distinguir expansão de lucros das empresas de uma eventual reprecificação de múltiplos, movimentos que nem sempre caminham juntos.
“Há dois motores clássicos para as altas de índices acionários, o crescimento de resultados corporativos e valorização das métricas de preço, como P/L e EV/Ebitda. Por outro lado, ele avalia que, no Brasil, o impulso mais tangível hoje vem da expansão de lucro e rentabilidade, enquanto uma reprecificação ampla de múltiplos dependeria de queda consistente da percepção de risco e da taxa de juros real.
Quais são os motores para o Ibovespa avançar?
Segundo Saravalle, “os motivos que fazem o Ibovespa subir são dois: expansão de lucro, que puxa dividendos e melhora a rentabilidade, e a reprecificação de múltiplos”. A fotografia atual, segundo ele, mostra as companhias brasileiras entregando ganhos operacionais relevantes, com avanços de margens e geração de caixa. “Aqui no Brasil a gente tem a potencial expansão de lucros das companhias e um retorno para médias históricas de negociação; já a reprecificação mais forte exigiria uma queda estrutural do risco-país e da Selic real”, afirma.
Enquanto isso, o fluxo estrangeiro ajuda o curto prazo, foram “mais de R$ 2 bilhões” em alguns pregões recentes e um acumulado acima de R$ 25 bilhões no ano, segundo o debate. Porém, o CIO pondera que o apetite por risco no Brasil ainda não parece suficiente para pagar um “prêmio” expressivo pelo mercado doméstico neste momento. “O gatilho de múltiplos tende a ser um movimento de prazo mais longo, condicionado a disciplina fiscal, credibilidade de política econômica e descompressão de juros, pondera Saravalle.
150 mil pontos: possível, provável ou precipitado?
Para responder à provocação sobre o Ibovespa “a 150 ou 160 mil pontos”, Saravalle reconhece que há um componente tático ligado ao retorno de estrangeiros e à própria dinâmica de curto prazo. Além disso, resultados trimestrais que confirmem a trajetória de lucros podem somar. Contudo, ele classifica como “improvável” uma reprecificação generalizada de múltiplos no curtíssimo prazo.
- Driver 1 — Lucros: empresas entregando expansão de rentabilidade e dividendos.
- Driver 2 — Múltiplos: dependeria de queda do risco-país e “descompressão” da Selic real.
- Fluxo: ingresso estrangeiro recente reforça o técnico de curto prazo, mas é volátil.
- Médio/Longo prazo: cenário mais favorável com melhoria estrutural de risco e juros.
O que pode destravar uma reprecificação de múltiplos?
De acordo com Saravalle, estudos de casas independentes sugerem que, entre 2026 e 2028, um ciclo de redução consistente da percepção de risco poderia abrir espaço para múltiplos mais altos. “É um cenário possível”, diz ele, desde que o país avance em ancoragem fiscal, previsibilidade regulatória e estabilidade institucional. Nesse sentido, uma eventual trajetória de queda da Selic real seria peça-chave para reduzir o custo de capital e atrair um investidor disposto a “pagar mais” por cada real de lucro.
Por outro lado, ele enfatiza que o “pior erro” do investidor é confundir um rali técnico, guiado por fluxo e notícias pontuais, com um bull market sustentado por fundamentos. Enquanto isso, carteiras equilibradas tendem a performar bem quando combinam setores sensíveis a juros (como varejo e construção) com exportadoras e nomes de commodities que protegem contra choques externos.
Como o investidor deve agir agora?
Para quem opera taticamente, Saravalle sugere monitorar a sequência de entradas de capital estrangeiro e a temporada de resultados, pois ambos podem manter o ímpeto de curto prazo. Além disso, a atenção recai sobre sinais de queda da inflação subjacente e sobre a comunicação de política monetária, elementos que, em conjunto, calibram o prêmio de risco exigido pelo mercado.
Enquanto isso, para o investidor de médio e longo prazo, a recomendação é manter o foco no crescimento de lucros por ação (LPA) e na qualidade do balanço. Em suas palavras, “a expansão de lucratividade é o vetor mais concreto hoje; a reprecificação de múltiplos pode vir depois, mas depende de variáveis macro e institucionais”.
O Ibovespa chega a 150 mil pontos?
A resposta, na visão do CIO da MSX Invest, é que o patamar é “possível” sob um conjunto de condições: continuidade do fluxo estrangeiro, temporada de resultados positiva e ausência de choques externos. Por outro lado, sem um gatilho claro de compressão de juros reais e risco-país, a alta tenderia a ser mais “em escada”, puxada por lucros, do que um salto de valuation no curtíssimo prazo.
O Ibovespa tem vetores para avançar, mas a perna “fundamentalista” mais confiável ainda é a de lucros. A perna de múltiplos, por sua vez, permanece como opcionalidade a ser exercida quando, e se, a macroeconomia brasileira entregar, de forma consistente, menor risco e custo de capital. Até lá, disciplina de alocação, diversificação e leitura fina de resultados seguem como as melhores bússolas para navegar o rali.