Os recentes movimentos no Congresso Nacional, com a PEC da Blindagem e a aprovação de urgência de uma anistia política, tornaram as relações entre os Poderes Judiciário e Legislativo ainda mais frágeis. Para piorar, o ministro Gilmar Mendes afirmou que os casos em que congressistas já estão sob escrutínio do Supremo Tribunal Federal (STF) continuam valendo — e o colega Flávio Dino congelou R$ 671 milhões em emendas parlamentares. Mas a verdadeira batalha promete ser disputada a partir de 2027, caso o plano da Direita de eleger a maioria do Senado se concretize (com isso, havia quórum para eleger o presidente da Casa e promover processos de impeachment contra juízes que desagradam o conservadorismo).
Mas o Supremo não deve aguardar inerte uma mudança na composição da câmara alta. Segundo a coluna da jornalista Mônica Bergamo, o STF vai analisar duas ações apresentadas pela AMB (Associação dos Magistrados Brasileiros) e pelo partido Solidariedade neste sentido. Diz a jornalista: “Ambas sustentam que as regras para a tramitação de processos contra ministros do STF no Senado, previstas na Lei 1.079/50 (Lei do Impeachment), não deveriam ter sido recepcionadas pela Constituição de 1988. Elas não poderiam, portanto, ser adotadas hoje em caso de pedidos de impedimento de integrantes do STF. As ações sugerem ainda a adoção de normas que restringiriam a drástica medida contra os ministros — uma ameaça que tem sido recorrente por parte de bolsonaristas descontentes com a condenação de réus do 8/1 e de Jair Bolsonaro (PL).”
Quem vai vencer essa queda de braço?
Um dos problemas que temos no Brasil recente é o de ver um Legislativo querendo julgar e um Judiciário querendo legislar. Nos últimos anos, o Brasil tem vivenciado episódios em que esses dois Poderes parecem ultrapassar suas atribuições constitucionais, gerando tensões institucionais e debates sobre a separação de funções. O Supremo tem sido acusado de praticar ativismo judicial ao tomar decisões que, na visão de críticos, deveriam ser prerrogativas do Legislativo. Um exemplo marcante foi a decisão que equiparou injúria racial ao crime de racismo, tornando-a imprescritível — uma interpretação que ampliou o alcance da lei penal sem alteração legislativa formal.
Outro caso foi o reconhecimento das uniões homoafetivas como entidade familiar, feito pelo STF em 2011. Embora tenha garantido direitos civis significativos, a decisão interferiu em uma matéria que o Congresso vinha evitando enfrentar. Mais recentemente, o debate sobre a execução da pena após condenação em segunda instância também expôs esse conflito: o STF mudou seu entendimento sobre o tema, influenciando diretamente o sistema penal sem que houvesse nova legislação aprovada pelo Parlamento.
Por outro lado, o Legislativo também tentou atuar na seara do julgamento, especialmente por meio das Comissões Parlamentares de Inquérito. A CPI da COVID-19, por exemplo, extrapolou sua função investigativa ao emitir relatórios com pedidos de indiciamento e juízos de valor sobre autoridades públicas, o que é competência do Ministério Público e do Judiciário. Esse tipo de atuação levanta questionamentos sobre o papel do Parlamento e os limites de sua influência sobre a responsabilização penal.
Além disso, o Congresso tem buscado formas de blindar suas decisões contra o controle judicial, como nas emendas impositivas que obrigam o Executivo a executar determinadas despesas. Em alguns casos, parlamentares tentam limitar a atuação do STF sobre temas orçamentários, o que configura uma tentativa de julgar a constitucionalidade de suas próprias ações.
No fim das contas, o sistema de freios e contrapesos virou uma sequência de improvisações entre Legislativo e Judiciário. Cada Poder atua conforme a urgência do momento. A sociedade, atônita, espera que alguém ponha ordem na casa (respeitando a democracia), antes que o conflito escale, trazendo o caos. Enquanto isso, decisões são tomadas no calor do improviso, e os limites entre legislar, julgar e governar se tornam cada vez mais borrados.