A Vale teve seu rating elevado pela S&P Global Ratings, em um movimento que reacendeu o debate sobre o desempenho da mineradora em meio a um cenário desafiador para as commodities. Apesar das incertezas ligadas ao preço do minério de ferro, especialistas apontam que a empresa conseguiu reforçar sua previsibilidade financeira e administrativa, fator decisivo para conquistar o upgrade.
O estrategista-chefe da RB Investimentos, Gustavo Cruz, destacou em entrevista à BM&C News que a melhora no rating mostra uma dissociação entre a percepção de investidores em renda variável e o desempenho no mercado de crédito. “Mesmo sem figurar como a ação mais recomendada no ano, a companhia conseguiu apresentar estabilidade que garantiu confiança às agências classificadoras”, avaliou.
Por que a Vale conquistou o upgrade no rating?
De acordo com Cruz, o principal diferencial foi a capacidade da Vale em lidar com seus custos e com as obrigações decorrentes de desastres ambientais do passado. “A Vale realmente continua com uma receita previsível. Os custos são mais controlados e, ao longo dos últimos anos, ela foi fechando acordos relacionados a desastres ambientais. Isso tornou a previsão de despesas mais clara e interessante para as agências de rating”, explicou.
O estrategista ressaltou que, embora o desempenho das ações da mineradora não tenha sido destaque nos últimos dois anos, a previsibilidade dos fluxos de caixa foi determinante. “A empresa conseguiu se mostrar mais adequada para merecer esse rating ser elevado. Fez todo sentido”, completou.
O especialista lembrou também que o mercado de dívida e de crédito pode avaliar as empresas de maneira distinta do mercado acionário. Enquanto muitos investidores não viam na Vale uma aposta de curto prazo, as agências de rating identificaram fundamentos sólidos que justificaram a revisão positiva. “Às vezes a visão de um investidor pode ser negativa para a ação, mas a empresa pode estar vivendo um bom momento em termos de previsibilidade, o que se reflete no mercado de crédito”, disse Cruz.
Os estímulos chineses podem impulsionar a Vale?
Além da melhora no rating, as perspectivas da Vale também estão ligadas ao cenário internacional, em especial às medidas da China, maior compradora de minério de ferro. Cruz destacou que os estímulos recentes não vieram na forma tradicional de crédito e injeção de liquidez, mas sim em uma abordagem cultural e estrutural. “Dessa vez, a China fez uma mudança mais ampla, incentivando consumo local e atração de talentos, algo parecido com o ‘compre nacional’ que já vimos em outras economias”, afirmou.
Segundo ele, essa transformação reflete a necessidade chinesa de diversificar sua economia. “Se no passado houve um boom imobiliário, hoje a China precisa encontrar novos motores de crescimento. Há iniciativas para fortalecer a academia, a pesquisa e até o turismo, facilitando pagamentos e reduzindo barreiras culturais”, explicou. Apesar disso, Cruz pondera que o setor industrial chinês ainda enfrenta dificuldades, com destaque para o mercado automobilístico, onde empresas operam no prejuízo para atender metas de produção.
A Vale pode se beneficiar desse cenário?
O estrategista avalia que os estímulos chineses podem indiretamente contribuir para a demanda de minério, mas o efeito não é imediato. “Claro que existe um reconhecimento de que a economia puxada pela indústria não está no seu melhor momento, mas essa transformação pode abrir espaço para novos ciclos de consumo. A Vale, como fornecedora estratégica, acompanha de perto essas movimentações”, afirmou.
Ele destacou ainda que a previsibilidade conquistada pela mineradora em sua gestão interna ajuda a companhia a atravessar momentos de maior incerteza no cenário externo. “Mesmo sem ser a queridinha do mercado acionário neste ano, a Vale se mostrou uma empresa estável e preparada para responder às pressões internacionais”, disse.