O ministro Luiz Fux surpreendeu ao afirmar que a 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) não tem competência para julgar presidentes e ex-presidentes da República. Durante a sessão que analisa o processo contra Jair Bolsonaro e aliados por tentativa de golpe de Estado, Fux declarou que, nesses casos, o julgamento deveria ocorrer no plenário da Corte ou ser remetido à primeira instância da Justiça.
Na avaliação do ministro, é dever do juiz verificar a competência antes mesmo de receber a denúncia. Assim, ao declarar nulos todos os atos processuais conduzidos até agora pela 1ª Turma, Fux pode abrir espaço para uma discussão mais ampla sobre os limites do foro privilegiado e sobre a forma como o STF tem conduzido processos relacionados a figuras políticas de alta relevância.
Por que Fux considera o STF incompetente?
Segundo o ministro, a Constituição estabelece que apenas autoridades com prerrogativa de foro podem ser julgadas no STF. Como ex-presidentes não possuem mais essa condição, o julgamento deveria ser conduzido em outras instâncias. Fux ressaltou que a interpretação da competência deve ser feita de forma restritiva, sob risco de comprometer garantias fundamentais do processo.
Além disso, ele observou que o próprio plenário do Supremo, e não as turmas, seria o local adequado para a análise de casos envolvendo ex-mandatários, justamente pela gravidade e pelo impacto institucional de decisões desse porte. Essa posição pode reconfigurar não apenas o caso em julgamento, mas também outros processos que correm na Corte envolvendo autoridades que já não detêm foro especial.
Impacto da decisão de Fux
Ao declarar a nulidade dos atos processuais da 1ª Turma, Fux colocou em xeque parte do andamento do processo contra Bolsonaro e outros sete réus. Ele ainda reconheceu a tese de document dumping, apresentada pelas defesas, segundo a qual houve excesso de provas disponibilizadas em prazo exíguo, comprometendo o direito de defesa. Para o ministro, essa situação caracteriza cerceamento e reforça a necessidade de anular etapas anteriores do julgamento.
Por outro lado, Fux acompanhou a posição da Procuradoria-Geral da República em relação à delação premiada de Mauro Cid, mantendo os benefícios concedidos. Esse ponto chamou atenção porque, ao longo do processo, o ministro havia se mostrado crítico ao instituto da colaboração premiada em determinadas condições.
O que vem pela frente no julgamento?
Após o voto de Luiz Fux, a expectativa recai sobre as manifestações da ministra Cármen Lúcia e do ministro Cristiano Zanin. Ambos devem apresentar suas posições nos próximos dias, em sessões que se estendem até sexta-feira. A decisão final será tomada por maioria simples na 1ª Turma do STF, mas a fala de Fux pode gerar novos questionamentos sobre a legitimidade do colegiado para conduzir o caso.
No julgamento anterior, o relator Alexandre de Moraes e o ministro Flávio Dino votaram pela condenação dos réus, rejeitando preliminares das defesas e validando a colaboração de Mauro Cid. Moraes destacou uma série de episódios que, em sua visão, comprovariam a tentativa de golpe, como o uso indevido de órgãos de Estado, a reunião com embaixadores e a chamada “minuta do golpe”.
Para o economista Alex André, o voto de Fux trouxe um elemento de racionalidade ao julgamento. Segundo ele, a decisão de reconhecer a incompetência da 1ª Turma do STF e o cerceamento de defesa recoloca o processo no eixo do devido processo legal. “Nenhum dos réus tem foro privilegiado, portanto o julgamento deveria ter começado na primeira instância, como ocorreu no caso do ex-presidente Lula“, alerta. Além disso, a imensa quantidade de provas com prazo exíguo para análise reforça a tese de nulidade. A posição de Fux mostra que não se trata de ideologia, mas de respeito às garantias constitucionais, afirmou o economista.