Por João Marcio Souza*
Diante de um cenário internacional mais protecionista, o Brasil tem sido chamado a olhar com mais atenção para seus negócios locais. É hora de reconhecer mais a capacidade competitiva de muitas organizações nacionais e valorizar, com mais consistência, a riqueza que geramos aqui. Temos diversas empresas familiares brasileiras que comprovam essa afirmação com excelência, e que, não raro, passam despercebidas pelo mercado e pela opinião pública.
O Brasil também abriga um seleto grupo de companhias multinacionais com DNA brasileiro, que se tornaram referências mundiais em seus setores e já operam com padrão de classe mundial. Marcas como Embraer, Natura, Weg, Ambev e Gerdau, entre outras, são casos emblemáticos do nosso potencial para produzir empresas globalmente relevantes, líderes em setores indispensáveis à humanidade.
Mas para além desses gigantes já consolidados, há um universo de empresas familiares que cresce, inova e se profissionaliza silenciosamente. Basta uma pesquisa mais refinada para identificar marcas criadas por famílias brasileiras que se tornaram globais ou altamente competitivas nos seus nichos. Indústrias, telecomunicações, finanças, farmacêuticas, papel e celulose, energia, agronegócio, autopeças. São muitos os setores com histórias que derrubam o mito ultrapassado da “falta de profissionalismo” nesse modelo de gestão.
Por isso, defendo que o olhar sobre empresas de dono precisa de uma urgente atualização. Ainda há quem enxergue essas companhias como palco constante de conflitos entre família, time e negócio. Outros, ao menor sinal de sucessão, já enxergam uma crise. E muitos ainda propagam que inovação é barreira para esse tipo de organização. São visões rasas, desconectadas da realidade.
É claro que desafios de governança e operação existem, mas isso não é exclusividade das empresas familiares. E o que tenho observado, especialmente nas interações com a Family Business Network (FBN), da qual o Talenses Group tem orgulho de ser associado, é justamente o oposto: vejo companhias com pensamento de longo prazo, gestão sólida, forte identidade organizacional e notável capacidade de superar adversidades.
Essas empresas chamam a atenção de investidores por sua resiliência, seu compromisso com a sustentabilidade e a visão estratégica que permeia cada decisão. Valores familiares sólidos costumam fortalecer a cultura interna e guiar as decisões com propósito e coerência. Muitas dessas companhias inovam silenciosamente, com foco total na longevidade, e constroem planos sucessórios com anos de antecedência.
Ao contrário do que se pensa, a tomada de decisão tende a ser ágil, exatamente por estar concentrada em lideranças com alto senso de legado e responsabilidade. A ausência de instâncias externas de aprovação torna o processo mais direto e conectado à realidade do negócio. A preocupação com o que será deixado para a próxima geração transforma-se em combustível para decisões mais conscientes e sustentáveis.
Conquistar uma posição executiva em uma empresa familiar, no entanto, exige muito mais do que competência técnica. É preciso compreender profundamente a cultura da organização, o papel da família, os protocolos formais e informais. Discrição, lealdade, inteligência emocional e respeito ao legado são atributos indispensáveis. A excelência esperada não é apenas estratégica ou operacional, é, acima de tudo, relacional.
Como bem disse Abilio Diniz, um dos maiores empresários do Brasil: “Quem pensa em curto prazo não constrói uma história. As grandes empresas são feitas com visão de longo prazo e baseadas em valores inegociáveis.” Essa filosofia ajuda a entender por que tantas empresas familiares se tornam exemplos de continuidade, consistência e inspiração, mesmo em ambientes desafiadores.
Ou, como já afirmou Jorge Paulo Lemann: “Empreender é sobre sonhar grande e cercar-se de gente melhor do que você.” Muitas empresas familiares que prosperam seguem exatamente esse princípio: sonham com legado, constroem com disciplina e contratam com sabedoria.
Embora nem sempre recebam o reconhecimento que merecem, as empresas familiares ocupam um lugar de destaque na economia e no tecido social brasileiro. Precisamos parar de classificá-las como “menos profissionais” e começar a reconhecê-las como o que realmente são: personagens centrais na pauta do desenvolvimento nacional e fontes legítimas de inspiração global.
*Coluna escrita por João Marcio Souza, CEO da Talenses Executive e Sócio Fundador do Talenses Group
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