O setor de serviços brasileiro registrou alta de 0,3% em junho, alcançando um novo recorde histórico, segundo dados divulgados pelo IBGE. O desempenho positivo ocorre em meio a um cenário de desaceleração no varejo e mantém acesa a discussão sobre os próximos passos da política monetária do Banco Central. Apesar do avanço, a inflação de serviços segue pressionada, representando um desafio para a redução mais acelerada da taxa Selic.
Para José Faria Júnior, da Wagner Investimentos, a inflação de serviços é notoriamente mais resistente, não apenas no Brasil, mas também em economias como os Estados Unidos. Essa resiliência está relacionada à menor flexibilidade dos consumidores para reduzir gastos com serviços, ao contrário do que acontece com bens, cujo consumo tende a reagir mais rapidamente às condições econômicas e à elevação dos juros.
Inflação de serviços atrasa cortes mais expressivos de juros?
O especialista explica que o juro neutro estimado pelo Banco Central é de 5% ao ano, nível que permitiria à economia operar com estabilidade, pleno emprego e inflação na meta. No entanto, a Selic está atualmente em 15%, ou seja, 10 pontos percentuais acima do neutro, um patamar bastante restritivo. “Isso faz com que setores mais dinâmicos, como a indústria, sintam mais o peso da política monetária, enquanto os serviços resistem mais à desaceleração”, observa Faria Júnior.
De acordo com o analista, a previsão de inflação para os próximos meses está entre 4% e 5%, o que abre espaço para uma possível redução da Selic ainda este ano. Contudo, os cortes devem ser graduais, podendo levar a taxa a algo em torno de 12,3% no final de 2026, patamar que ainda seria considerado restritivo.
Influência do câmbio e das commodities no cenário inflacionário
Além da dinâmica própria do setor de serviços, fatores externos também têm contribuído para conter a inflação de forma mais ampla. O dólar, por exemplo, mantém trajetória de queda, influenciado pela expectativa de cortes nos juros nos Estados Unidos, possivelmente em duas ocasiões ainda em 2025. Segundo Faria Júnior, embora a moeda americana pudesse estar mais valorizada diante do quadro fiscal brasileiro, a percepção do mercado tem se voltado majoritariamente para o cenário externo.
As commodities agrícolas também exercem papel importante nesse contexto. Produtos como café, soja, milho e farelo de soja apresentaram queda nos preços internacionais, impactando positivamente a inflação de alimentos. “Apesar de ainda estarem em patamares elevados, alguns itens já mostram recuo nos supermercados, como azeite, ovos e café, reduzindo a pressão sobre o IPCA”, pontua.
Serviços: por que a resistência é maior?
A explicação para a persistência inflacionária no setor de serviços está na menor substituibilidade desses gastos. Enquanto é relativamente fácil adiar a compra de um bem ou trocar por um mais barato, serviços como educação, saúde, transporte ou alimentação fora de casa tendem a ser mantidos, mesmo com preços mais altos. Essa característica torna a inflação do setor menos sensível à política monetária no curto prazo.
Ao mesmo tempo, a queda nos preços de bens e alimentos e a redução do consumo em outras áreas ajudam a aliviar o índice geral de preços, abrindo espaço para cortes graduais na taxa básica. “O cenário ainda não permite pensar em juros de um dígito, mas já indica que o BC pode iniciar o ciclo de cortes este ano”, afirma Faria Júnior.
Perspectivas para o restante do ano
Com a economia apresentando sinais mistos, desaceleração no varejo e avanço nos serviços, o Banco Central deve manter postura cautelosa nas próximas reuniões. O desafio será equilibrar o combate à inflação de serviços com a necessidade de reativar a atividade econômica, sem comprometer a trajetória de queda dos preços.
Para o investidor e para o setor produtivo, o momento exige atenção redobrada aos indicadores de inflação, câmbio e atividade, já que decisões de investimento e consumo podem ser diretamente impactadas pela velocidade e intensidade dos cortes na taxa Selic.